APELAÇÃO CRIMINAL 32519

BLUMENBAU



Inconformado com a respeitável decisão do doutor Juiz de Direito em exercício na Segunda Vara Criminal da Comarca de Blumenau, que a condenou a dois meses e dez dias de detenção, por incurso nas sanções do artigo 129, § 6º, com a causa especial de aumento de pena no artigo 70, ambos do Código Penal, A. L. S., tempestivamente, interpõe o presente recurso.

Insurge-se a apelante contra o decreto condenatório, entendendo inexistir prova suficiente para a solução condenatória.

A respeitável sentença deve ser anulada.



Padecendo a respeitável sentença impugnada de falta de fundamentação da negativa de aplicação da multa substitutiva e falta de abordagem e conseqüente fundamentação da substituição por pena restritiva de direitos, não pode o feito ser examinado na sede recursal, sob pena de se estar suprimindo uma instância.

A questão foi devidamente enfrentada por Rogério Lauria Tucci em sua obra Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro (Saraiva, São Paulo, 1993, pág. 270 e seguintes).

No mesmo sentido esclarece Samuel Monteiro:





"44. Consistência de motivação. Conceito de motivar.

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 93, IX, inovou quanto às decisões do Judiciário (administrativas ou jurisdicionais). Devem ser motivadas, não no sentido aleatório, genérico, en passant, mas dizendo as razões, os motivos, os porquês se decide assim, em relação à causa que lhes é posta.

As partes têm o direito, não de ter um julgado lacônico, um arrazoado como se se tratasse de uma crônica ou narrativa, desprovida de razão, de lógica, de bom senso, alheia aos fatos, às provas, à lei incidente sobre os fatos e à jurisprudência. Motivar, fundamentar, é dar as razões, os motivos que serviram de esteio e suporte ao julgamento, que diante de fatos certos e provados nos autos, aplicou corretamente o direito positivo que deveria incidir, dentre dos termos e limites em que as partes os colocaram nos autos....................................................................................................................................................................................................... 44.5. Art. 93, IX, da CF/88. Interpretação do STF. O ministro Celso de Mello, ao relatar o HC nº 68.422-DF, 1A Turma, DJU-I, de 15.3.91, p. 2.650, interpretando teleologicamente o art. 93, IX, da Constituição Federal de 1988, em voto brilhante, assim sintetizou o porquê da exigência da motivação nos atos jurisdicionais (decisões recorríveis): 'Á exigência de motivação dos atos jurisdicionais constitui, hoje, postulado constitucional inafastável, que traduz, em sua concepção básica, poderoso fator de limitação do próprio poder estatal, além de constituir instrumento essencial de respeito e proteção às liberdades públicas. Atos jurisdicionais, que descumprem a obrigação constitucional de adequada motivação decisória, são atos estatais nulos'. " . ( in RECURSO ESPECIAL E EXTRAORDINÁRIO, Samuel Monteiro, Hemus, São Paulo, 1992, págs. 125/126)







O exame da respeitável sentença impugnada revela que houve violação ao disposto nos artigos 77, III, e 59, IV do Código Penal Brasileiro.

Na verdade, dispõe o referido item III do artigo 77, que o sursis somente pode ser concedido quando não indicada ou cabível a substituição prevista no artigo 44 do Código Penal. E o item IV do artigo 59 do mesmo estatuto exige que o juiz, na sentença, fundamente a concessão, ou não, da substituição da pena privativa de liberdade por outra espécie de reprimenda, desde que cabível.

E na espécie, em face do montante da pena imposta, seria teoricamente cabível tanto a substituição por multa como por pena restritiva de direitos.



É óbvio que a sentença que deixa de atender aos requisitos contidos nos artigos 77, III e 59, IV, do Código Penal Brasileiro é incompleta, não exaurindo a prestação jurisdicional, sendo, portanto, citra petita, devendo ser anulada, para que outra seja prolatada no juízo a quo.









Este entendimento, segundo refere Celso Delmanto, integra o princípio constitucional da individualização da pena:

PENA-SUBSTITUIÇÃO-MULTA

A substituição da pena privativa de liberdade, quando cabível, é uma das fases obrigatórias que compõem a fixação da pena (CP, art. 59, IV). Está integrada, pois, no princípio constitucional da individualização da pena, que o art. 5º, XLVI, da CF/88 assegura a todos (in Código Penal Comentado, Celso Delmanto, 3ª ed, 1991, Edição Renovar, pág. 94).



Todavia, a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos ou multa, não pode, no caso concreto, ser efetuada em segundo grau, pois estar-se-ia suprimindo uma instância.



O juiz deve, obrigatoriamente se manifestar fundamentadamente sobre a alternativa de pena, levando em consideração as circunstâncias judiciais, para que, no caso de concessão, possa o doutor Promotor de Justiça conferir os argumentos na prova dos autos, interpondo o competente recurso, querendo.



E não se diga que isto na espécie seria desnecessário, por ter o órgão do Ministério Público de primeiro grau concordado com a concessão do sursis. Pode ele concordar com o sursis, de gravidade maior para o réu, e discordar da substituição por pena restritiva, ou multa, de gravidade menor. Mas é somente o Ministério Público de primeiro grau a quem cabe este exame. Fazê-lo nesta oportunidade, seria suprimir uma instância.



Diante de todo o exposto, entendemos, em primeira preliminar deva a sentença ser anulada, para que outra seja prolatada, manifestando-se expressamente e fundamentadamente sobre a concessão, ou não, da substituição da pena corporal por pena de multa ou restritiva de direitos, com base na análise das circunstâncias judiciais.

Florianópolis, 20 de dezembro de 1994.



NÉLSON FERRAZ

PROCURADOR DE JUSTIÇA