Vira-latas, sim senhor!


Artur Araujo


Artigo publicado em 24 de janeiro de 2000 no jornal Diário do Povo (Campinas / São Paulo / Brasil)



O grande historiador Sérgio Buarque de Holanda, em seu clássico Raízes do Brasil, comenta que o povo português não é visto na Europa como uma etnia, mas sim como um agrupamento de mestiços. O autor diz inclusive que os africanos os consideravam seus iguais quando da época dos descobrimentos.

Negros e árabes muçulmanos, judeus, alemães (visigodos) e romanos se misturaram ali e fizeram daquele pedacinho de terra, no decorrer da Idade Média, um país; mais que isso, o primeiro estado europeu moderno.

Esse povo vira-lata lançou-se ao mar e impressionou o mundo com suas habilidades de navegação. Lá pelo meio do século XVI, sua elite resolveu renegar sua história e expulsou os árabes e judeus de lá... Portugal empobreceu-se culturalmente e declinou como civilização. Hoje em dia, esse povo outrora vencedor tenta ser o agregado pobre dos primos ricos europeus ao se esforçar para integrar-se à União Européia, abjurando novamente o "pé na cozinha" que sempre tiveram.

Bobagem.

A mais poderosa nação do mundo, os EUA, é um povo de vira-latas. Por baixo daquela elite branca de olhos azuis há uma multidão de negros, mulatos, indígenas, europeus e asiáticos que movem a poderosa máquina economia norte-americana. Não acho que a miscigenação necessariamente torne um povo próspero, mas que ajuda, ajuda, pois riqueza e diversidade na herança cultural permitem vislumbrar mais alternativas para os desafios da vida.

O Brasil também quis renegar sua origem mestiça ao tentar branquear sua população no início do século, com a imigração em massa de europeus para cá, relegando os escravos negros e a incipiente elite mulata que surgia no século XIX à exclusão social, ao desemprego e à fome. O tiro saiu pela culatra. Tornamo-nos ainda mais mestiços, o que foi ótimo. Nosso caldeirão étnico ficou ainda mais bagunçado e ganhamos todos com isso.

Sou uma mistura de noruegueses, índios, portugueses, espanhóis e, provavelmente, negros (meu cabelo quando cresce fica meio pixaim). Acho maravilhosa a mistura que criamos. Se nos voltarmos a essa rica e misturada salada, teremos muito a ganhar e pouco a perder.





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