Mãe e filha: da identificação à devastação
Denise Campos
Eu estava olhando um quadro (1) e pude observar três pessoas, e isto me chamou a atenção. Perguntei: pai, mãe e filho? E o pintor, poeta, psicanalista me explicara que eram sempre três e a terceira figura que é a figura da mulher (que nesse momento passa a ser mulher, ou seja, a mãe que torna mulher) tem sempre uma forma não definida, mas representaria ou seria a vida, a morte, a viagem, a esperança ... Talvez a minha inquietude, ou talvez algo dessa mulher dentro de mim, escuta e pergunta : Pai, Filho e Espírito Santo? O pintor reage : - Não ! Mas não é exatamente nesta tríade que encontramos o Sagrado, o Todo, sem a mulher ? Espírito Santo, algo inexplicável, seria a mulher? O que é a mulher ? A falta da mulher na tríade sagrada, a ausência, o não falado e não dito. Mas será que a ausência faz alguma coisa ser ? E a presença faria algo ser ou deixar de ser ? Parece que existe a necessidade de uma referência para poder existir aquilo que não se consegue dizer. Assim, o poeta dizia : « Na mulher, apenas o dom natural de recriar o homem não a faz mulher... » (2). Certamente a referência de uma ausência também não a faz mulher.
A definição do feminino como um « não-lugar », um vazio, leva, por exemplo, André (1986) a afirmar que « o significante da identidade feminina não existe ». Ora, a questão que considero importante, senão necessária, é se podemos ficar satisfeitos com esta formulação. Às vezes me parece, quando estou estudando sobre a feminilidade, o feminino, a mulher e o desejo feminino que: mulher é aquilo que não se conhece porque não se vê. Daí, me parecer insatisfatória uma leitura rígida do aforismo lacaniano : « a mulher não existe ». O mesmo é válido para a fórmula que diz que não existe um traço « identificatório » que « condense » a feminilidade. Fico pensando que, quando vemos uma « mulher » grávida podemos perceber « algo », ou seja, vemos ou é visto uma barriga e parece que aí a mulher passa a existir. Com base em Freud, tem-se tentado entender (ou ver) a mulher, o que me parece impossível pois partiu-se do princípio de uma falta, a falta do pênis. Esta « falta » do órgão se confunde com outra falta, que pode ser sentida como « vazio ». Assim sendo, a verdadeira « falta » é sentida, mas não é vista, não se vê a falta. Na gravidez, a falta é o que é mostrado, o vazio, este mesmo vazio (escondido) de onde se nasce, visto que o útero é um órgão oco. A gravidez dá visibilidade ao « órgão oco », ao vazio. É dali que se vê; do nada, do vazio, do desconhecido. Frente a esse vazio, a mulher se depara com a sua angústia, com o seu medo que é o próprio vazio que ela não pode entender, nem controlar.
« O ser feminino recebeu desde sempre sua definição canônica na maternidade. Ser mãe parece trazer uma solução para as incertezas da identidade, mesmo que tal resposta não deixe de ser acompanhada pela angústia, quando se realiza. » (Pommier, p. 31).
No trabalho com pacientes com dificuldades de engravidar, as mulheres expressam a vontade de ter uma criança de variadas formas. Elas falam de um desejo íntimo (que é o maior de todos), o qual elas não podem definir claramente. Elas dizem saber que a ausência de uma criança tem haver ou está relacionado com este desejo indefinível; que elas têm uma necessidade de ter uma criança para serem mais seguras e sobretudo serem mais mulheres; que elas se sentem excluídas e vazias.
Neste momento, quando ela me falava desse vazio, desse desejo indefinível, dessa vontade ou necessidade de ter uma criança, eu comecei a me perguntar: - Para ser mulher é preciso ser mãe? - Como uma mulher se torna mulher?
Com certeza, a gravidez não resolve o problema da identidade feminina. Isto quer dizer que, mesmo exibindo o sinal visível de uma identidade fundada no « órgão não visível », a mulher sabe que o que está exibindo não é « dela », não é ela, não é a feminilidade, posto que ela também se sente mulher quando não está grávida. A angústia é o resultado de uma operação, melhor dizer de uma representação imaginária que corresponde à equação simbólica Freudiana, onde a criança eqüivale ao pênis.
« Dessa atitude, dividida, abrem-se três linhas de desenvolvimento. A primeira leva a uma revulsão geral à sexualidade. A menina, assustada pela comparação com os meninos, cresce insatisfeita com seu clitóris, abandona sua atividade fálica e, com ela, sua sexualidade em geral, bem como boa parte de sua masculinidade em outros campos. A segunda linha a leva a se aferrar com desafiadora auto-afirmatividade à sua masculinidade ameaçada. Até uma idade inacreditavelmente tardia, aferra-se à esperança de conseguir um pênis em alguma ocasião. (...) Esse complexo de masculinidade nas mulheres pode também resultar numa escolha de objeto homossexual manifesta. Só se seu desenvolvimento seguir o terceiro caminho, muito indireto, ela atingirá a atitude feminina normal final, em que toma o pai como objeto, encontrando assim o caminho para a forma feminina do complexo de Édipo. » (Freud, 1931, p.264)
Mesmo na forma considerada por Freud, como a « forma feminina do complexo de Édipo », o filho vem « cauterizar » a ferida narcísica aberta pelo complexo de castração e selar a escolha de objeto para além do ser masculino concreto que é o pai. Se, na terceira via de desenvolvimento proposta por Freud, se faz possível a « realização da inveja do pênis », a gravidez está ainda situada no gozo fálico.
« A mulher com a criança não responde ainda à questão da identidade feminina, mesmo que ofereça uma solução momentânea para o problema do que quer uma mulher. A mãe fálica não traz resposta para a questão do que é uma mulher. Ela situa na maternidade um traço de identificação que, longe de ser próprio ao feminino, permanece preso à ordem masculina. Eis porque tal traço escava uma divisão cruel; ele vem cindir a mulher entre ela mesma enquanto causa do desejo e um Outro materno impessoal, persecutório, porque, na sua completude, ele significa o fim desse desejo. » (Pommier, p. 32)
A mulher diz, eu quero um filho. Isto é uma demanda, mesmo que ela não demande a ninguém, mesmo que ela não dirija esta demanda a nenhum « outro » em particular. Em casos de mulheres que passam pelo processo de bebê de proveta ela pede ao médico, mas no caso das mulheres que não tem problemas para engravidar, elas expressam sua vontade dizendo que querem um filho, sem se dirigir exatamente a uma pessoa, às vezes, nem mesmo para o seu « marido ». Esta é a expressão de um sentimento.
« Eu quero uma criança »: o que é isto?
História de um caso: « A mulher, a mãe »
A senhora M. começa a sessão explicando que depois da FIV, ela teve problemas para ter relações sexuais e que não foi a primeira vez porque, após uma outra tentativa ela passou pelo mesmo problema; que ela tinha medo que a relação sexual lhe causasse dor. Ela relatou que durante o processo de FIV os médicos tocam muito seu corpo e que a nível moral era muito difícil, então, durante as relações sexuais ela pensava nisto o tempo todo, ela imaginava que todo mundo estava lá, ela não conseguia esquecer.
Ela me disse que tinha um problema com a sala de operação, porque os médicos « limpam » as mulheres antes de serem anestesiadas; « Entre outras coisas, todo o tempo, eles utilizam instrumentos, dentro do corpo da gente, para fazer exames, para aplicarem injeções, ... ». No seu relato, ela esclarece que não era uma questão de « gentileza », porque ela achava que todas as pessoas tinham sido muito amáveis com ela, mas que era uma questão de moral, ou seja, que isto tinha atingido sua moral e que ela tinha vergonha.
Em seguida ela disse que durante as relações sexuais ela pensava em tudo isto, o que lhe bloqueava. Ela disse que tinha medo de ter dores, mesmo sabendo que antes ela não as tinha.
O casal não tinha, também, nenhum problema físico que justificasse a esterilidade. Ela falou que os médicos não falavam diretamente, mas que ela subentendia que o problema de infertilidade poderia ser ligado a um problema psíquico. A senhora M. me fala que a relação mãe/filha tinha sido sempre difícil, que para ela o exemplo de maternal, assim como sua própria educação, era sua avó. Ela fazia referências à sua mãe dizendo: « esta mulher lá » (cette femme là - cest femme là - cest femelle, poderíamos escutar em português: esta mulher - estar mulher - estar fêmea - ser fêmea). Ela repete muitas vezes esta expressão. Ela não utiliza, nenhuma vez, as palavras « minha mãe ». Para ela « esta mulher » não tinha tido uma « relação » de mãe e filha (o que era muito doloroso). No discurso da senhora M, a fala referente à mãe é plena de dor, ódio e ressentimento se misturam e se condensam na expressão curta e violenta « esta mulher ». Ela « quer » um filho, pois busca e se submete ao processo de FIV, no entanto, esse « querer » está , também ele, pleno de ressentimento e dúvida.
A relação mãe/filha é a relação mulher/mulher, ou seja, a fertilidade que a mulher/mãe dá à mulher/filha, como uma potencialidade de ser mulher. Para a paciente, é preciso passar por todo tipo de dificuldades para ter uma criança, dificuldades que ela sempre passou com sua mãe (femelle). Para ser mãe é preciso ter dor ? (O parto é doloroso, a separação é dolorosa). Quem é fêmea ? São pergunta que me faço, e a resposta me parecer ser: aquela mulher que me fez tão mal.
Como já afirmei em trabalhos anteriores (Campos, 1999), penso que o domínio da FIV (das técnicas de reprodução humana) é um terreno privilegiado para o estudo das articulações prováveis entre o desejo feminino e o desejo de ter uma criança, porque pode-se interrogar sobre a significação real desta demanda de criança e também se a apresentação de uma demanda assegura a existência de um desejo de ter uma criança. As mulheres com dificuldades de ter filhos se confrontam mais com o desejo, elas são obrigadas a parar para pensar. No cotidiano das mulheres sem problemas de fertilidade a dinâmica do diálogo acontece na vida familiar. A questão da escuta e do diálogo tem haver com a dinâmica familiar.
Quando a mulher pede uma criança os médicos acreditam que exista um desejo e eu acho que os médicos devem começar a suspeitar desse pedido. No contexto dos centros de reprodução humana e das técnicas envolvidas, quando a mulher expressa a sua necessidade pela demanda, ouve-se um desejo. É o equívoco entre a problemática psicanalítica do desejo e a questão biomedical do desejo. Na minha escuta clínica eu me perguntava qual era a real necessidade da mulher. Eu vi que muitas vezes a necessidade de uma criança provinha da pressão social dentro da qual a mulher é caracterizada pela sua capacidade de procriar. De toda forma o desejo de se ter uma criança é sustentado pelo pressuposto social que ele é inato na mulher, o que legitima socialmente a demanda (o pedido).
Entretanto, para falar do desejo feminino dentro da psicanálise, a questão da castração é primordial e para Freud tornar-se mulher é a conseqüência resultante de seus efeitos (os efeitos da castração), é o que distingue o menino da menina. Para Lacan a castração é igual para os dois, pois eles perdem o mais importante a mãe. A castração é o evento que separa (ou distingue) o falo e a imagem do corpo.
« Pois o falo é um significante, um significante cuja função na economia intra-subjetiva da análise, levanta talvez o véu daquela que ele mantinha nos mistérios. Pois é o significante destinado a designar no seu conjunto os efeitos de significado, no que o significante os condiciona por sua presença de significante » (Lacan, 1958, p.267)
« " Falo " designa inicialmente a falta, o ponto de impossibilidade onde o significante não pode definir-se a si mesmo e convoca um outro. » (Pommier, p.18)
Como diz Conrad Stein (1987), as idéias de « inveja do pênis » e de « complexo de castração » não devem nos confundir, no sentido que não devemos tomá-las como valor em si:
« Se o valor representado pelo pênis pode ter alguma relação com o poder da fala, isto retira a estranheza da formulação (...), segundo a qual o pênis e a fala pertencem, todos os dois, à uma cadeia de atributos, que vemos se substituírem uns aos outros, no andamento da análise ; o que permite compreender que o Complexo de Édipo se constitui dentro da situação analítica em referência à representação de pessoas respectivamente munidas e desmunidas do atributo da fala, mesmo antes de se referir à pais ou à substitutos de pais distintos em razão de suas características anatômicas. » (Stein, 1987, p.182)
Ainda « a mulher, a mãe »
Quem é fêmea? É a pergunta que me faço, e a resposta me parecer ser: aquela mulher que me fez tanto mal, (mal, em francês, que é também dor).
Ela continua falando , falando de dor que « esta mulher lá » se queixava sempre, de como foi difícil o seu parto, mas que ela (a paciente) não tinha culpa. Ela afirmava ainda achar nunca ter tido amor maternal daquela « mulher lá » e que ela nunca o teve.
O pai da senhora M. aparece e reaparece numa expressão compacta e ambígua: « il é nul », ele é nulo (como se não existisse; é um zero a esquerda). Diante da ambigüidade que ecoa na minha escuta, eu me pergunto o quê é « nulo »? Nulo era o pai. « " Esta mulher lá " , é muito dominadora, ela controla a vida de todo mundo e também a do meu pai e do meu irmão »; assim, seu pai fazia exatamente o que « esta mulher » queria.
Escuto e fico pensando: cette femme-là (la femelle) é também (processo de identificação à mãe) « esta fêmea-aqui » (senhora M): de onde a equação: ser fêmea me fez tanto mal, ser fêmea (mulher) me causa tanta dor, toca « na moral ».
De toda forma, o pai é reconhecido como « pai », ele é percebido e aceito como tal, mesmo que ele não tenha sido o pai que ela queria. Ele é presente e ele existe, pois ele permite a « dominação da mãe ». Mas a mãe não é percebida como « mãe », e sim como uma mulher rival. Esta rival é dominadora do homem/pai, e por isto, é ela que o possui e é poderosa.
Não posso deixar de pensar nas palavras de Pommier (1991):
« Uma mulher apreende uma feminilidade problemática pelo viés do olhar de um homem, mas isso não ocorre apenas assim. De fato, porque sua feminilidade lhe é estranha, ela venera, através do seu próprio corpo, o mistério da Outra mulher, que detém o segredo daquilo que ela é. » (Pommier, p.35).
O pai é nulo porque ele não foi capaz (assim como a mãe) de « lhe fazer um homem »?, ou de lhe dar um pênis?. Nota-se que ela se identificou a seu pai (ele existe como pai, enquanto a mãe não existe como mãe, pela sua própria rejeição); assim ela imagina que ele gostaria que ela fosse um homem como ele. Entretanto, ela nasceu menina e como ela não tem pênis ela não é capaz de ter uma criança: ela é impotente. Portanto, é a sua mãe que ela acusa de não ter lhe dado um pênis. Acusação, outra vez, plena de ódio, ressentimento. Ela disse, muitas vezes: « esta mulher me fez muito mal ». Esta expressão me faz pensar que ela não se sente completa e que ela acusa a sua mãe desta falta. Assim, ela não aceita sua mãe que possui o « phallus » e que tem um poder sobre os outros: seu pai e seu irmão.
De toda forma, como símbolo de mulher, a mãe é vista e invejada como tal. A mãe é capaz, enquanto mulher, de dar a vida a alguém e, portanto, dominar esta vida. Para ser mulher e para dominar o phallus, é preciso então lhe produzir e lhe « fabricar » de si.
Vejo aqui a identificação com a mãe, e a identificação com o pai como uma via de alcance dessa mãe « que está longe » (cette femme-là), que é aquela que tem o « dom » de passar a « esta mulher aqui » (cette femme-là), o que é ser mulher. Pois, segundo Stein:
« Não se poderia, então, se identificar ao phallus sem se fazer phallus de alguém ». (Stein, 1987, p.227)
A senhora M. perguntou o que eu pensava de tudo isto, se todas as dificuldades que ela tinha com sua mãe poderiam ser a causa de sua infertilidade e também a causa dos problemas que ela tinha nas relações sexuais. Ela disse que todo o processo de FIV tinha sido muito difícil para ela ao nível moral e que eu, como mulher, poderia compreender melhor, que ela tinha vergonha de ficar exposta a todo mundo. O quê eu tenho enquanto mulher que eu poderia compreender ou « entendê-la »; ou ainda, para que eu possa « compreender »? Ela divide algo comigo; algo que ela já tem enquanto mulher.
Ela disse também que ela não se sentia bem porque todo mundo tocava seu corpo, principalmente em partes muito íntimas: « é difícil isto ». Para a paciente é difícil ser tocada porque era, principalmente, em partes « muito íntimas » que a equipe médica lhe tocava. Muito íntima, como um segredo, o segredo de não ter um « phallus » capaz de lhe dar uma criança a ela mesma. Ela procura fazer uma criança fora dela mesma, sem relação sexual, o que significa ter um pênis sem tê-lo, sem saber tê-lo e sem que ele seja simbolizado.
A paciente espera da ciência o que está fora do objeto, como um « phallus ». Ter uma criança é tão importante porque a falta da mesma representa, para ela, a privação, ou a frustração de não ter um phallus. Então o phallus representa o único recurso do sujeito.
Escrevendo este caso, retorno à idéia de que exista « Talvez a minha inquietude, ou talvez algo dessa mulher dentro de mim ... »
Então, retornando a Freud, a resolução do complexo de Édipo abre diferentes vias ao desenvolvimento psíquico, para certas mulheres, somente a gestação pode esconder a ferida narcísica originária do complexo de castração (que é a perda do amor da mãe). Para pegar a teoria ao pé da letra, só se é mulher se se tem um filho. Mas que desejo é este? Não tem outro jeito? Se a criança (ou a demanda da criança) responde realmente a um desejo, pode-se perguntar se tornar-se mulher é tornar-se mãe, bem entendido dentro do sentido onde a criança ocupa o lugar do falo, ou seja, o desejo de criança será o substituto do desejo do pênis. Eu me pergunto se a gravidez é, para todas as mulheres, a única via de realização da feminilidade. Quem não tem filho não é mulher? Ora, somente a mulher pode engravidar e isto faz com que a maternidade seja um traço de distinção simbólico dos gêneros. Entretanto, não é somente isto que explica como uma moça, uma jovem, vira mulher.
Na verdade, me parece que Freud já pressentia uma função anterior ao Édipo, uma equação maior: a menina já vem deslizando no interior de uma longa equação:
« Vemos, portanto, que a fase de ligação exclusiva à mãe, que pode ser chamada de fase pré-edipiana, tem nas mulheres uma importância muito maior do que a que pode ter nos homens. Muitos fenômenos da vida sexual feminina, que não foram devidamente compreendidos antes, podem ser integralmente explicados por referência a essa fase » (Freud, 1931, p.265).
A mulher ressente uma falta originária do fato de não ser capaz de engravidar. O que aparece é a rivalidade, mas o que ela quer é estar nela, ser ela; ela quer ser todo poderosa como é a mãe ou a imagem da mãe. Como já existe uma falta do pênis, ela vai ter um vazio o qual ela não consegue expressar. Ela se sente desligada, sem nada que lhe pertença: sem pai, sem pênis, sem criança, sem nada de si. É a figura da mãe toda poderosa que é confrontada à sua própria imagem, ou seja, a imagem de um vazio.
O caso da senhora M. assinala uma feminilidade que não se constrói em referência à « inveja do pênis ». Pode-se pensar na condensação de dois movimentos: a identificação à mãe-phallus e o ódio à mãe-mulher, como conseqüência de uma demanda de amor não correspondido, cujo avatar é a identificação ao pai. Alcançando o phallus ela será capaz de fazer uma criança a ela mesma e poderá dar amor a ela mesma.
NOTAS
"Romeiro", Daniel Emídio de Souza
"Deuses que Habitam Nosso Corpo", poesias, Pedro
Humberto Faria Campos
BIBLIOGRAFIA
ANDRÉ, S., (1995) Que veut une femme?, Paris, Seuil.
BRUN, D., (1990) La maternité et le féminin, Paris, Danoël.
CAMPOS, D.T.F., (1999) O desejo de se ter um filho : do pedido à escuta. In. Campos, D.T.F. (Org.) Medicina e Psicanálise, Revista Pulsional, n°118, São Paulo, p.42-51.
FREUD, S., (1931) A sexualidade feminina, In. Obras Completas, Vol. XXI, Rio de Janeiro, Imago, p.264-265.
GORI, R., (1998) A prova pela fala, São Paulo, Escuta e UCG.
LACAN, J., (1958) La signification du phallus, In. Lacan, J., Écrits II, Paris, 1994, Seuil, p.103-115.
POMMIER, G., (1991) A exceção feminina. Os impasses do gozo, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor.
STEIN, C., (1971) Lenfant imaginaire, Paris, Danoël.
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