Artigo publicado pelo jornalista Hélio Fernades no jornal Tribunda da Imprensa, Rio de Janeiro, em 05/12/98

90 dias de rendição

E o FMI não liberou um dólar furado

(ou De quando o Brasil abraçou de bom grado o FIM)

Uma das maiores exigências do FMI ao governo brasileiro: aumento de impostos. Isso confirma o que já se sabia sem a menor dúvida. O objetivo do FMI é impedir de qualquer maneira o desenvolvimento do País, única forma de acabar com o desemprego crescente e a miséria selvagem que abalam o País. E o governo FHC, tendo apelado para o FMI, sabe que não pode voltar atrás, nem obter melhores condições.


Ninguém obtém nada do FMI. Ele é inviolável,
insensível, irreparável. A única maneira de derrotar o FMI é desconhecê-lo. A única maneira de vencê-lo é ignorá-lo. A única maneira de conseguir vitória é evitá-lo. Até o contágio com o FMI deve ser descartado, pois não há escapatória. Não se trata de posição preconcebida de alguma coisa planejada de oposição premeditada. É a análise fria, isenta e desapaixonada que determina a fuga do menor contato que seja com o FMI.
Os números implacáveis mostram sem nenhuma possibilidade de erro, equívoco ou engano. Os países que transaram com o FMI tiveram filhos espúrios, anormais, cheios de defeitos congênitos. E tudo isso recai sobre o povo, que acaba sendo a única vítima desses relacionamentos inteiramente disparatados. Por cima ou por baixo, o único a gozar com essa situação é o FMI.
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Esse mesmo governo FHC aumentou barbaramente os juros, para atender exigências de manipuladores estrangeiros ou multinacionais. Agora vem o FMI com outra exigência, só que redundante. Dizem eles para os nossos negociadores. (Deus me perdoe a blasfêmia, mas é assim que a própria equipe econômica se chama, não vamos decepcioná-los.)
Dizem os pró-homens do FMI, esses sim, grandes negociadores: "
Só o aumento de imposto pode proporcionar redução dos juros". Quer dizer: o aumento dos juros levou o Brasil a uma situação de calamidade. Para acabar com essa calamidade, só a catástrofe do aumento dos impostos.


Ainda existe a possibilidade mais do que natural de haver o aumento dos impostos e não ocorrer a redução dos juros.
Esta redução não interessa aos manipuladores, que ainda esperam ganhar muito dinheiro no Brasil. Mas para isso é preciso que os juros não sejam reduzidos, pelo menos se mantenham como estão, nesses vergonhosos, escandalosos e perigosos 49,75%. Quanto ao aumento de impostos, não existe a menor dúvida.


Haverá mesmo, o FMI não deixou outra saída.
Ou aumentam os impostos, cortam na saúde, na educação, no saneamento básico, em tudo o que atinge diretamente a coletividade, ou não haverá o tão providencial auxílio, ajuda, empréstimo do FMI (a mídia governista divulga isso? Não prefere ela chamar os estudantes de mal-educados por lutarem contra a privatização do grande patrimônio que são as universidades públicas enquanto FHC chama, ou pior, trata os aposentetados como Vagaundos, ao povo brasileiro chama de caipiras, os agricultores sem-terra de maconheiros e muitas outra delicadezas mais do grande príncipe, e, apesar de tudo, colocá-lo como um perfeito gentleman?). E como o governo FHC não tem alternativa nem base política que lhe permita resistência, cede tudo o que lhe pedirem (ou exigirem).
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O aumento de impostos atinge a jugular do desenvolvimento do País. Já temos reconhecidamente uma das maiores taxas de impostos. São 33% do PIB. Quer dizer: um terço de tudo o que é produzido no Brasil vai para o governo financiar os seus múltiplos e diversificados déficits. Agora, a própria equipe econômica divulga que vai recolher mais 23 bilhões de reais em impostos, ou seja, 3% do PIB. Assim, o governo ficará com mais de 36% de tudo o que a massa de brasileiros produzir durante o ano.


É muito. Não sobrará coisa alguma. Como é que a indústria, a agricultura, o setor energético, o mineral, o petroquímico, o siderúrgico e todos os outros poderão crescer sem investimento? Dos 900 bilhões (mais ou menos) do Produto Interno Bruto, 330 bilhões irão para o governo. Quem criará empregos, quem acabará com o subemprego, quem aplacará a fome, quem diminuirá a miséria, a fome implacável do povo brasileiro?
Isso é uma loucura completa, a entrega total do futuro brasileiro.
Essa sujeição, submissão e servidão ao FMI resultará num atraso colossal para o Brasil. Os industriais brasileiros, os empresários de todos os setores, não percebem que morrerão abraçados ao povão? Que as elites não se salvarão com a destruição do trabalhador? Não é uma luta de classes, é a luta pela sobrevivência. É preciso a compreensão de que fora da união capital-trabalho não haverá salvação para ninguém. Ou se unem na vida ou serão enterrados na mesma cova rasa.
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PS - Neste momento não há ideologia que dê jeito em coisa alguma. É preciso desenvolvimento, desenvolvimento e mais desenvolvimento. A estagnação levará ao retrocesso, e o retrocesso não tem explicação na História. Na verdade, os mortos não explicam coisa alguma. Pelo menos até agora não explicaram.



Joel Rennó - Está ameaçado de perder o rendoso cartório do petróleo. Rockfeller foi o primeiro a descobrir o perfume malcheiroso. Rennó veio na trilha.

Acabou tarde a sessão da Assembléia Legislativa que derrotou Marcello Alencar e companhia, e manteve a Cedae sem ser privatizada-doada. Quaisquer que sejam os erros cometidos, a Assembléia marcou presença altamente favorável. Mostrou-se competente, independente e honrou o interesse público. Ao contrário do governador e do filho, que, faltando pouco mais de 20 dias para deixarem os cargos, queriam a "privatização".
Os caminhos percorridos pelo governo terminal do Estado do Rio ficaram cheios de cadáveres. Todos mortos pela burrice e pela incompetência. (Vá lá essa palavra, já que falta outra melhor.) Burrice: estão aí as gravações, a época é mesmo de grampo. Tentaram aliciar 4 deputados, quando precisavam de 24. Obtiveram 7, ficaram faltando ainda 17.
Deixaram tudo à vista, afirmações, confissões e declarações que não podem ser desmentidas ou ignoradas.
Os deputados contatados procuraram até regatear, tentavam obter 100 mil dólares quando o intermediário oferecia 80, era o máximo. E agora, ainda irão querer indenização por danos morais? Que moral, que danos ao que não existe?

Vergonhosa a intimidação do Executivo contra o Legislativo. Por causa da derrota de um dos itens do chamado ajuste fiscal (que na verdade não ajusta coisa alguma), FHC pessoalmente ameaçou e aterrorizou: vai mandar cortar emendas constitucionais de deputados. Isso é inacreditável.


Subserviente a posição do Legislativo em relação à intimidação do Executivo: nenhum protesto, aceitaram tudo passivamente. Quer dizer que essas emendas que serão cortadas não serviam ao cidadão-contribuinte-eleitor? E até parlamentares concordaram: o Executivo está certo, quem não apóia o governo não pode receber nada. E a independência dos Poderes?


O presidente da Petrobras, Joel Rennó, quem diria, quer ver se mantém a presidência da Petrobras com apoio do próprio genro do presidente FHC. Motivo: surgiram 3 candidatos para substituir Rennó. E o atual presidente da Petrobras é tão dócil e manobrável que o genro já admite trabalhar pela sua manutenção. Lógico, manietado.
Quem são os três candidatos a presidir a Petrobras? Moreira Franco, Eduardo Azeredo e um terceiro, que de tão surpreendente nem pode ainda ser citado. O ex-governador do Estado do Rio tinha o compromisso de FHC de nomeá-lo ministro. Mas a Petrobras é melhor.
Quanto a Eduardo Azeredo, foi derrotado, mas tem um trunfo que pode livrá-lo do ostracismo: Itamar Franco. Mão não foi Itamar que derrotou Eduardo Azeredo? É que Itamar surge quase que naturalmente, sem esforço, como grande candidato de oposição ao sistema que está no poder. Então é preciso manter Azeredo vivo, para jogar com ele.

Briga-se de todas as formas, dentro do governo, não pelo Ministério da Produção, e sim pela presidência do BNDES. Motivo: esse banco foi revelado pelas gravações, poucos tinham a exata idéia da sua importância. E além de importância, o BNDES tem dinheiro vivo. E que pode aplicar onde achar melhor. Sem controle ou fiscalização.
Não quero dizer que não disputem o Ministério da Produção. Este é mais espetacular, tem perfil identificado para algum homem-trator, que tenha objetivo político. Ou se quiserem, o ministro da Produção tem que ser um homem com muito trânsito e conceito com a própria família, não se importe que digam que ele rouba mas faz. É da tradição.
Outro cargo que vai acumular mortos e feridos em quantidade é a presidência do Banco do Brasil. Paulo Ximenes só não saiu agora por causa do final do governo. Mas não tem cacife para continuar. Por mais surpreendente que pareça, Ximenes se agüenta com uma alegação: "Foi demitido do Banco Central por Itamar Franco". E como todo o governo está vidrado (contra) em Itamar Franco, tudo que possa desgostá-lo é bom.



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