O que não podia ser dito na Marcha

Sim, o Governo tem um forte aliado na Mídia comercial, governista e conivente com a bendeira neoliberal, mas isto não foi suficiente para abafar o que está preso na garganta popular.... Não impediu, igualmente - por mais que tentassem elas - de mostrar o fato de que o povo foi às ruas.

Subversão, subserviência, submissão geraram a `dívida' que é impagável

Excepcional artigo do jornalisa Hélio Fernandes publicado na Tribuna da Imprensa em 28/08/99

Nas últimas duas ou três décadas tivemos uma sucessão de iniciativas e planos governamentais supostamente capazes de salvar o País e elevá-lo ao Primeiro Mundo. Primeiro foi a correção monetária e o desastroso plano nacional da habitação, que na verdade foi um plano nacional dos intermediários financeiros. Depois veio o buraco negro do endividamento externo, baseado na idéia de que "dívida externa não é para ser paga, mas sim administrada".
Transformou-se depois numa "dívida" que em 1964 era inferior a 4 bilhões de dólares numa de 235 bilhões, nos dias que correm. Com o perverso detalhe: somente de 1983 a 1992, foram pagos 136 bilhões de dólares entre juros e amortizações. Simultaneamente o "débito", que era de 93 bilhões de dólares, passou para 235 bilhões. No Brasil, no mesmo período, foram gastos apenas 54 bilhões de dólares, em educação, saúde pública e saneamento. Como é que chama essa forma de governar. Podemos chamar de "crime hediondo". Com o endividamento, veio o slogan "exportar é a solução", para justificar a concessão dos mais absurdos incentivos aos exportadores, a ponto de fazer com que não raro a exportação resultasse em transferência líquida de capitais para o exterior.

* * *

Hoje somos grandes exportadores de capitais. Em seguida vieram os planos cruzado, cruzadão e o confisco da Dona Zélia. Por último, aí estão a nova política industrial ("importar é a solução") e o programa das privatizações. Com as privatizações (acredite se quiser) o governo pretende operar a mágica de levantar recursos para os programas de educação, saúde, saneamento, etc. "vendendo ou doando por um punhado de moedas podres, para grupos detentores de cartas marcadas, um patrimônio público que custou centenas de bilhões de dólares. Só que até agora o programa é deficitário. Nos "leilões" de venda das estatais, arrecadou-se menos do que se gastou no pagamento dos "consultores" encarregados das avaliações patrimoniais das estatais, e nas campanhas publicitárias destinadas a desvalorizá-las (lembram-se do elefante estatal?). O resultado concreto desses planos e iniciativas governamentais é evidente: a renda naicional concentrou-se nas mãos de banqueiros e outros intermediários não-produtivos, e os índices de qualidade de vida, avaliados pelo Banco Mundial, colocam o Brasil atrás de países como a Albânia e o Sri Lanka.
Todos esses planos foram inventados pelos economistas que têm dominado o cenário da alta administração pública nessas duas a três décadas, particularmente os Chicago e Boston Boys. Muitos dos quais, sem nenhuma ética, vão "trabalhar" em bancos privados, logo depois de terem ocupado altas funções no governo. Nesses bancos, seu papel é de fornecer "inside informations" e fazer tráfico de influência a favor de seus patrões (em geral, de Wall Street), contra os interesses do Brasil.

* * *

Para "adoçar" e alimentar a vaidade de seus sócios latinos (como são chamados por seus espertíssimos "amigos" norte-americanos), os mais escandalosos lobistas (como o desmoralizado Henry Kissinger) convidam-nos para grotescos "brunchs", onde os elogiam irônica e sutilmente. (Só eles é que não percebem a ironia.) Com os elogios, os "grandes estadistas latinos" ficam convencidos de que tudo que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil. Inclusive a nova Lei de Patentes. Ou a "privatização-doação" de enormes fatias de nosso patrimônio público, como a Vale do Rio Doce, a Petrobras e as empresas de eletricidade. Que querem tomar-nos à força, e sob ameaça de chantagens comerciais.
Aliás, se FHC quer atrair investimentos estrangeiros para ampliar a infra-estrutura brasileira, cabe perguntar: "Para que `vender-doar' a Petrobras, a Vale do Rio Doce ou as empresas de eletricidade"? Será que FHC não percebe que, em vez de trazer capitais, essa loucura resultará em maiores saídas de capitais do Brasil, a título de remessas de lucros, sobre atividades de empresas que atualmente funcionam muito bem, sem nenhuma necessidade de "participação" privada, e sem remeter nenhum lucro para o exterior?
O que é pior é que agora a "genial equipe econômica" está falando em aceitar, como "moeda de privatização", os chamados IDU (Títulos sobre Dívidas a Vencer). Ou seja: querem doar o patrimônio público em troca de "dívidas" que, de fato, nem existem.

* * *

PS - Se o governo, em vez de estar amolando e pressionando os donos de televisão, de rádios e até de jornais, para que obscureçam ou obscurecessem a Marcha dos 100 Mil, tratasse de alargar o debate geral, talvez fosse ele o mais beneficiado. Sem dúvida poderiam surgir muitos ataques, mas as soluções, os caminhos e os rumos ficariam bem mais desbravados. Mas o governo tem medo de quem tenha idéia e coragem de apresentá-la.

PS 2 - Dessa maneira o "debate" se trava entre o próprio presidente da República e alguns "colunistas amestrados". A partir de agora, quando o governo quiser desmoralizar ainda mais qualquer jornalista, basta convidá-lo para entrevistá-lo na televisão. Isso ficou pior do que beber cicuta.

Lula- Cada vez que vejo o líder do PT na televisão, fico assombrado com seu progresso. Só não pode elogiar golpistas e carreiristas como Chavez.

Como disse aqui mesmo na quarta-feira (véspera), na quinta (dia) e na sexta (depois da realização), a Marcha dos 100 Mil foi um sucesso completo. Só "observadores" comprometidos e que nada observam podem contestar o fato. Qualquer que seja o ângulo da análise ela é totalmente positiva. Foi Democrática, foi exuberante, foi pacífica, foi numerosa, foi significativa, foi um protesto mesmo, foi uma vitória coletiva.

Mas como toda manifestação coletiva, precisa da indispensável análise individual. E esta tem que ser feita pelos líderes dos partidos que organizaram a manifestação, o protesto, a Marcha vitoriosa. Até mesmo para que os resultados de tudo sejam capitalizados democraticamente, não pode faltar a minuciosa análise dos fatos. Que pode ser chamada de autocrítica. E Luiz Inácio Lula da Silva e Brizola precisam disso.

Luiz Inacio Lula da Silva está cada vez mais preparado para essas lutas, esses embates, esses protestos. Sua capacidade de falar, de enfrentar a discussão dos grandes problemas nacionais é hoje notável. Estará igualmente preparado para disputar nova eleição, ganhá-la e Com a terrível crise brasileira e a impopularidade de FHC, surgem economistas desconsolados e amargurados, todos querendo mudar de profissão. Acham que hoje está mais confortável e rentável ser profeta do que insistir na categoria antiga. Ontem, o economista Heron do Carmo dizia: "Em agosto a inflação vai cair muito". É do governo
ou quer ir para o governo?

Os mais inquietos com a Marcha em Brasília eram Mario Covas e José Serra. Os dois estavam em São Paulo, não se falaram nem se encontraram, ficaram "grudados" na televisão. O governador logicamente não tinha nada o que fazer em Brasília. O ministro achou o mesmo, e na véspera voou apressadamente para a capital. Disse que foi gravar na televisão.

Avaliação da Marcha dos 100 Mil   Holística     Ecologia Profunda, Ecologia Social e Eco-Ética     "Além do Cérebro"    A Economia Mecanicista: Uma Crítica  Neoliberalismo X Humanismo, o quadro de uma Era    A ONU, João Paulo II e outros apontam a farsa de FHC     Dom Luciano Mendes de Almeida aponta a política excludente de FHC   FHC o Exterminador do Futuro  Frei Betto nos fala sobre O Velho e o Novo  Em defesa da Universidade Pública   Frei Betto: Paradigma Holístico e Busca de Sentido    Bancarrota