Às portas do Iphan
Coordenador do programa Monumenta, Luiz Fernando de Almeida prepara a sucessão de Antonio Arantes, suspeito de irregularidades
Bianca
Tinoco
Publicado no Jornal do Brasil
Rio de Janeiro, 26 de janeiro de 2006.
Precavido, ele prefere não falar como presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) até o mês que vem. Por enquanto, é apenas Luiz Fernando de Almeida, arquiteto mineiro, professor de História da Arte e da Arquitetura e coordenador do programa Monumenta de restauração de sítios históricos. Mas, desde que foi anunciado por Gilberto Gil na sexta-feira, em Icó (CE), como sucessor de Antonio Augusto Arantes Neto à frente da autarquia, com posse prevista para fevereiro, Almeida recebe as honras do novo cargo e passa a participar das cerimônias em que o Iphan precisa ser representado. Ontem, ele e Arantes tiveram a primeira reunião de transição, início de um processo que deve ir até o fim deste mês. Totalmente pacífico, Almeida garante:
– As relações da coordenação do Monumenta com a direção do Iphan sempre foram as melhores possíveis e meu trabalho será de continuidade das ações já desenvolvidas na instituição, não de ruptura.
Como Almeida acumulará os cargos de coordenador do Monumenta e presidente do Iphan, a guinada da autarquia do Ministério da Cultura (MinC) será rumo a uma ênfase sobre a preservação de monumentos e do patrimônio imaterial. Os 41 museus sob responsabilidade do Iphan serão passados para o Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) assim que a nova autarquia for criada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, provavelmente este ano. O futuro presidente do Ibram também já foi definido: será José do Nascimento Junior, diretor do Departamento de Museus e Centros Culturais do Iphan.
Almeida intenciona repetir no Iphan os bons resultados que obteve no Monumenta desde sua posse no programa, em 2003. Segundo ele conta, o começo de sua gestão no programa teve como principal desafio o baixo índice de realização dos projetos.
– Em 2002, o índice de execução do Monumenta foi de 7% apenas. No ano passado, conseguimos chegar aos 98% de execução, em 26 cidades do país – orgulha-se.
O anúncio do nome de Almeida para o Iphan foi feito dois dias depois que o ministro Gilberto Gil recebeu do presidente demissionário a carta de renúncia. Arantes está há quase dois anos na presidência do Iphan – foi nomeado pelo ministro Gilberto Gil em 20 de março de 2004. Em 2005, administrou uma dotação de R$ 35,6 milhões e cuidou de 41 museus, além de mais de 20 mil edifícios tombados, 83 centros e conjuntos urbanos e 12.517 sítios arqueológicos. No documento, o principal motivo que Arantes aponta para sua saída é a capacidade reduzida de atuação do Iphan, devido as más condições financeiras em que se encontra.
Nos corredores do MinC, entretanto, os boatos são de que o presidente, que deverá sair do Iphan em 20 de fevereiro, corre o risco de ter que pagar do próprio bolso, por determinação da Controladoria Geral da União (CGU), um evento promovido pelo Iphan no Ano do Brasil na França, em julho de 2005, no qual a atração foi um espetáculo dirigido pela mulher do antropólogo, a coreógrafa Marília de Andrade. Procurado pela reportagem, o CGU não confirmou nem desmentiu a informação. O ministro interino da Cultura, Juca Ferreira, também não quis dar declaração sobre a sucessão no Iphan.
Arantes, no fim do ano passado, já havia sido obrigado pela Comissão de Ética da Presidência a retornar à União o cachê pago à coreógrafa pela apresentação em Paris.
– Foram três meses de trabalho árduo dela que deixaram de ser remunerados. Mas a comissão ordenou que o dinheiro fosse entregue e assim o fizemos – diz ele.
A 6ª Secretaria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (TCU) apurou pelo segundo ano seguido irregularidades nas contas do Iphan, fato confirmado pelo presidente demissionário. De acordo com os boatos no MinC, o constrangimento com a recorrência do problema teria sido outra razão para a renúncia do antropólogo. Ele nega:
– São pequenas irregularidades, que não dizem respeito especificamente a minha gestão, como a entrega dos canhotos de passagem e outros procedimentos para um controle mais rigoroso da rotina de gastos. É um levantamento no qual o TCU não levanta qualquer suspeita sobre minha administração, como se quer fazer pensar – defende-se.
No documento a Gil, Arantes diz sair do Iphan de cabeça erguida. “Com praticamente 63 anos de vida e 40 de trabalho como antropólogo, professor universitário, consultor, ex-presidente de sociedades científicas nacionais e internacionais, e ocupante de cargos públicos de imensa responsabilidade, JAMAIS (sic) fui acusado de cometer qualquer deslize ético ou falha administrativa”.
A troca na presidência do Iphan não prejudicará o concurso promovido no final do ano para a autarquia do MinC, em fase de convocação dos 250 classificados. O aumento no número de funcionários, depois de 20 anos sem concursos na instituição, anima Luiz Fernando de Almeida.
– É quase um quarto do tamanho atual do Iphan, teremos uma reoxigenação – celebra.