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 DISCIPLINA S/ 2007

  APRESENTAÇÃO

Abaixo algumas das atividades desenvolvidas durante o primeiro semestre de 2007.

 

1. ANTROPOLOGIA E TEXTO ETNOGRÁFICO- PROF. DRª. SYLVIA SCHIAVO

1. ANTROPOLOGIA E TEXTO ETNOGRÁFICO- PROF. DRª. SYLVIA SCHIAVO

 

ORALIDADE E CULTURA ESCRITA

A TECNOLOGIZAÇÃO DA PALAVRA

WALTER ONG

O autor foi um dos primeiros a atentar para o fato que a escrita é uma tecnologia, assim como a imprensa, a televisão e o computador. Para ele a invenção da escrita provocou um salto na consciência e nas habilidades cognitivas, indo além das técnicas mnemônicas naturais do pensamento oral. Ong estabelece uma distinção entre o que denomina "oralidade primária" e "oralidade secundária".

O autor enumera, então, diversas características que expressariam modos de pensamento tipicamente orais: 1. O pensamento oral seria mais aditivo do que subordinativo, a utilização de aditivos constitui a forma principal de expressão do pensamento; 2. O modo de pensar oral seria também mais agregativo do que analítico. Essa característica é expressa, por exemplo, na grande carga de epítetos ("Odisseu, o astuto", por exemplo) e outras fórmulas (como provérbios e frases feitas) que caracterizam a expressão oral e que são rejeitadas pela "alta" literatura, por provocarem, em sua avaliação, redundância e monotonia na linguagem. A repetição do "já-dito" pelo falante atende a certas expectativas do ouvinte em relação aos mesmos temas e às mesmas formas; 3. Para o autor, a eliminação da redundância demanda uma tecnologia que implique a utilização de um espaço de tempo maior: a escrita. Com ela, a mente é forçada a tornar o pensamento mais lento, oportunizando a reorganização da linguagem, eliminando as repetições desnecessárias; 4. como quarta característica do pensamento oral, Ong aponta o seu caráter conservativo e tradicionalista.

Nas sociedades orais, há um grande investimento de energia na transmissão da cultura de geração a geração. O conhecimento tem que ser continuamente repetido para que as novas gerações possam "arduosamente", aprender. Em conseqüência dessa necessidade, as sociedades orais geram um padrão de pensamento altamente tradicionalista e conservativo, inibindo, assim, a experimentação intelectual. O pensamento oral é, ainda, mais empático e participativo do que objetivamente distanciado. O equilíbrio caracterizaria também, na perspectiva de Ong, o pensamento oral. Nas culturas orais, então, os ditados não são um fenômeno ocasional, mas, de maneira incessante, constituem a substância mesma do pensamento. Para Ong, o pensamento oral é impossível sem eles porque consiste neles. O pensamento contínuo em uma cultura oral está atado, assim, à comunicação. Sobre o processo de memorização nas culturas orais, diante da impossibilidade de registrar o conhecimento adquirido por escrito, Ong afirma que Numa cultura oral primária, para resolver efetivamente o problema da retenção e da recuperação do pensamento cuidadosamente articulado, é preciso exercê-lo segundo padrões mnemônicos, moldados para uma pronta repetição oral.

Nessas culturas, pois, a repetição e o recurso à memória constituem a base dos processos de transmissão do conhecimento.

Ong afirma que a conseqüência principal e mais geral da introdução da escrita foi o que denominou "separação". Inicialmente, a escrita separa o conhecido do conhecedor, promovendo a "objetividade" da linguagem: entre esses dois pólos, a escrita interpõe um objeto tangível, o texto. Segundo Ong, a escrita distancia, ainda, a palavra do som: a evanescência da oralidade dá lugar ao espaço visual da escrita. A escrita distancia também a palavra do contexto existencial.

A escrita separa também, para o autor, o passado do presente. A escrita, ao contrário da linguagem oral, é linear e completamente artificial.

Segundo Ong, o comportamento "estudar" só surge depois da introdução dos sistemas de escrita: Todo pensamento, inclusive nas culturas orais primárias, é de certo modo analítico: ele divide seu material em vários componentes.

O autor lembra que enquanto a história do homem moderno (H. Sapiens) abrange dezenas de milhares de anos, a invenção da escrita alfabética não chega há três mil anos. Dessa forma a oralidade foi por quase a totalidade da história humana a principal tecnologia intelectual utilizada para o processo de construção do pensamento. Sem a escrita, a educação das pessoas se faz pela via prática e os conhecimentos são transmitidos através das gerações pela fala. A distância entre aquele que ensina algo e aquele que aprende é à distância do alcance do som da voz. Além disso, ao contrário da escrita, a fala já está profundamente incorporada ao homem. Muitas pessoas acham inacreditável que obras elaboradas como as epopéias de Homero e a Bíblia foram criadas e preservados na cultura oral.

A invenção da escrita provocou um salto na consciência e nas habilidades cognitivas, indo além das técnicas mnemônicas naturais do pensamento oral. A técnica da escrita permitiu a construção de raciocínios muito mais abrangentes e complexos. Ao contrário da fala, um texto escrito pode ser visto e corrigido inúmeras vezes.

A incorporação da escrita como forma de produção e conservação do conhecimento trouxe uma dupla diferença: era preciso ensinar o conhecimento que se tornava cada vez mais amplo e mais complexo, mas para isso era preciso primeiro ensinar a própria técnica da escrita.

Outra mudança trazida pela escrita está relacionada com a temporalidade e a distância. A escrita se conserva no suporte físico, enquanto a fala desaparece em um instante. O que não é memorizado em uma cultura oral é perdido. Na cultura escrita há um deslocamento da importância da memória para a habilidade de interpretar o que está registrado. Um processo semelhante está acontecendo hoje com o uso das máquinas de calcular e dos computadores. Habilidades importantes nas culturas oral e escrita são substituídas por novas tecnologias.

Outra grande transformação veio com a invenção da imprensa. A impressa marca de forma mais brusca a ruptura entre um pensamento ainda com resquícios de oralidade para o pensamento analítico nascido da escrita.

A fala geralmente só faz sentido quando se está na presença de outras pessoas. É uma atividade iminentemente social. Mas com a leitura é diferente. Foi o livro impresso que firmou definitivamente a característica introspectiva da escrita. Isso tanto é verdade que enquanto a escrita não era totalmente incorporada ao pensamento, a prática da leitura foi realizada em voz alta para um grupo. Graças a imprensa, a industrialização do livro fez com que milhões de pessoas pudessem ter acesso a um mesmo texto. Até sua invenção, poucas pessoas chegavam a possuir as raras cópias de manuscritos.

Progressivamente alterou-se a abordagem dos estudos sobre a cultura da escrita. Passou-se, portanto, a buscar compreender não a cultura escrita em sua oposição à cultura oral, mas culturas escritas. Como da entrada de sociedades no mundo da escrita, procurando responder como e em que condições a população dessas sociedades se alfabetizou, bem como o tipo de cultura escrita que se construiu nesse processo. Dessa forma a oralidade foi por quase a totalidade da história humana a principal tecnologia intelectual utilizada para o processo de construção do pensamento. A distância entre aquele que ensina algo e aquele que aprende é a distância do alcance do som da voz. Além disso, ao contrário da escrita, a fala já está profundamente incorporada ao homem. A invenção da escrita provocou um salto na consciência e nas habilidades cognitivas, indo além das técnicas mnemônicas naturais do pensamento oral.

Na avaliação de Ong, pode-se considerar a emergência desses estudos com preocupações semelhantes em um mesmo período histórico como um movimento de redescoberta da oralidade, decorrente do estabelecimento, por Saussure, do primado oral da linguagem.

Em uma segunda fase, a escrita passou a ser vista, predominantemente, como um registro da oralidade. Nesse momento, as narrativas orais passaram a ser divulgadas maciçamente pela escrita. Esse movimento caracterizaria uma proximidade entre a oralidade e a escrita.

Em um terceiro momento teria havido um novo afastamento entre oralidade e escrita, na medida em que esta última passou a assumir um outro aspecto, tornando-se burocratizada. Nessa fase, a escola desempenhará um papel fundamental. A nova configuração societária trazida pelo desenvolvimento tecnológico, pelas burocracias e pelas regulamentações governamentais exigiu novas formas de comunicação, fundamentalmente dependentes da palavra escrita. As funções do letramento se transformaram, a partir dos requisitos impostos pela especialização técnica nos diversos domínios da vida humana.

Segundo Ong, nas culturas de oralidade primária, as palavras, que são sons - na medida em que não possuem suporte visual - estão associadas diretamente a ocorrências, eventos e acontecimentos. Para o autor, o som tem uma relação com o tempo diferente das outras sensações humanas por ser evanescente. Ong retoma Malinowski que, em suas pesquisas nas sociedades tribais, constatou que a linguagem, entre os "primitivos", é muito mais um modo de ação do que uma maneira de referendar o pensamento. Nesse sentido, nas culturas orais, as palavras têm um grande poder sobre as coisas, um poder relacionado à magia: muitas palavras são consideradas tabu, associadas, muitas vezes, ao azar ou à sorte.

Ong é um dos autores que busca levantar hipóteses na direção de generalizar aspectos da "psicodinâmica das culturas de oralidade primária", reconhecendo a quase impossibilidade de realizar essa tarefa, na medida em que, nesse caso, não é possível trabalhar com dados empíricos e é difícil, para uma pessoa que vive em uma sociedade letrada, imaginar em que se constitui uma sociedade sem escrita. O autor enumera, então, diversas características que expressariam modos de pensamento tipicamente orais.

Desse modo, para o autor, as culturas orais não gastam energias com novas especulações: a mente é utilizada predominantemente para conservar. Para ele, esse aspecto não denota falta de originalidade. A originalidade não consiste, no interior dessas culturas, na criação de novas histórias, mas na maneira pela qual as velhas narrativas são manejadas em interação com as audiências: "... a cada narração, deve-se dar à história, de uma maneira única, uma situação singular, pois nas culturas orais o público deve ser levado a reagir, muitas vezes intensamente" (Ong, 1998, p.53). Os narradores sempre introduzem novos elementos nas histórias tradicionais: "Na tradição oral, haverá tantas variantes menores de um mito quantas forem as repetições dele, e a quantidade de repetições pode aumentar indefinidamente" (Ong, 1998, p.53).

O pensamento oral caracteriza-se também, segundo Ong, por sua proximidade com o "mundo vital". Nas culturas orais, o conhecimento é conceitualizado e verbalizado sempre em referência, maior ou menor, à experiência humana. Mesmo o que seria estranho à vivência imediata é assimila do, transformado, adaptado às interações e às necessidades concretas das pessoas. Nesse sentido, a própria aprendizagem ocorre por meio da observação e da prática e, minimamente, pela explanação verbal e pela recorrência a conceitos abstratos. O tom predominantemente emocional também caracterizaria o pensamento oral, na avaliação de Ong. A heroicização dos personagens não se baseia, para o autor, em razões românticas ou mesmo didáticas, mas corresponde à necessidade de organização da experiência daquela sociedade de uma forma permanentemente memorável. O herói e o anti-herói, nesse sentido, servem a uma função específica na organização do conhecimento no mundo oral. A narrativa é marcada freqüentemente, desse modo, pela descrição entusiasmada da violência física. A própria especificidade da expressão oral contribui para que essa característica seja marcante: a comunicação verbal está sempre envolvida em relações interpessoais caracterizadas tanto pela atração quanto pelos antagonismos. Em conseqüência dessa característica, há uma tendência à polarização das narrativas: de um lado, encontram-se o bem, a virtude e os heróis; de outro, o mal, o vício e os vilões.

O pensamento oral é, ainda, mais empático e participativo do que objetivamente distanciado. Para Ong, assim como para diversos outros pesquisadores, a escrita separa o conhecedor do conhecido e estabelece condições de objetividade, como se discutirá adiante.

O pensamento oral não está interessado em definições abstratas: as palavras adquirem seu significado no contexto em que são expressas, incluindo os gestos, as inflexões vocais, a expressão facial etc.

Finalmente, Ong identifica uma última característica do pensamento oral, de certo modo já referida: o fato de ser mais situacional e concreto do que abstrato. As especificidades das sociedades de oralidade primária e dos modos de pensamento orais determinam, também, como já foi referido, maneiras particulares de transmissão do conhecimento e da cultura.

Para Ong, o pensamento oral é impossível sem eles porque consiste neles. O pensamento contínuo em uma cultura oral está atado, assim, à comunicação. Sobre o processo de memorização nas culturas orais, diante da impossibilidade de registrar o conhecimento adquirido por escrito, Ong afirma que: Numa cultura oral primária, para resolver efetivamente o problema da retenção e da recuperação do pensamento cuidadosamente articulado, é preciso exercê-lo segundo padrões mnemônicos, moldados para uma pronta repetição oral.

A narrativa e o acompanhamento musical são memorizados por aprendizes, que começam ainda muito novos, trabalhando com um mestre oral. Os mestres (não há nenhum vivo) encarregam-se de treinar seus aprendizes na recitação literal do cântico por meio de uma disciplina rigorosa durante vários anos e conseguem resultados notáveis, embora eles próprios façam nas suas próprias recitações, mudanças das quais não se dão conta. Em tais culturas, o aprendizado se dá, em grande medida, somaticamente: todo o corpo, mediante movimentos rítmicos, é utilizado nos processos de memorização. Os cantadores/narradores populares, muitas vezes, se utilizam de um instrumento simples, como o tambor, para reforçar o ritmo da narrativa, contribuindo para introduzir nos ouvintes o "encantamento" do som, deixando-os em um estado de semi-hipnose, marcado pelo prazer e pelo relaxamento. O processo de cativar a platéia, de deixar registrado nela a realidade da estória, é uma das principais características da educação nas culturas orais. As "palavras proferidas são sempre modificações de uma circunstância total, existencial, que sempre envolve o corpo" (Ong, 1998, p.81).

As tecnologias, além de constituírem ajudas exteriores ao homem, contribuem também para uma transformação interior da consciência. Ainda segundo Ong, as tecnologias são artificiais, mas, paradoxalmente, a artificialidade é natural para os seres humanos. Ong afirma que a conseqüência principal e mais geral da introdução da escrita foi o que denominou "separação". Inicialmente, a escrita separa o conhecido do conhecedor, promovendo a "objetividade" da linguagem: entre esses dois pólos, a escrita interpõe um objeto tangível, o texto.

Segundo Ong, a escrita distancia, ainda, a palavra do som: a evanescência da oralidade dá lugar ao espaço visual da escrita. A quarta "separação" relacionada pelo autor diz respeito ao distanciamento, no tempo e no espaço, que ocorre, na escrita, entre a fonte da comunicação (o escritor) e o recipiente (o leitor).

A escrita distancia também a palavra do contexto existencial. Para Ong (1986), o contexto da escrita inclui apenas outras palavras, enquanto na expressão oral, como se viu, as relações pessoais fazem parte da comunicação. Na enunciação oral, o contexto sempre inclui mais do que palavras: a maior precisão das enunciações dá-se mediante elementos não verbais, o que torna os significados situacionais. A escrita se constituiria, então, em um discurso autônomo, fruto do pensamento analítico: a comunicação, por esse meio, está menos embebida das pressões sociais do momento imediato.

A escrita separa também, para o autor, o passado do presente e permite a separação da lógica, entendida como a estrutura do discurso, da retórica, e esta compreendida como o discurso socialmente efetivo.

Para Ong, a escrita separa igualmente a aprendizagem acadêmica da sabedoria, tornando possível a organização de estruturas abstratas de pensamento independentemente de seus atuais usos ou de sua integração no mundo vital. Inicialmente, quando as culturas se encontram em processo de assimilação da escrita, ainda tendem a colocar ditados de sabedoria em seus textos. No entanto, os tornam desnaturalizados, na medida em que foram, na verdade, transformados pela nova tecnologia, não funcionando do mesmo modo que nas culturas orais. A escrita divide também, segundo o autor, a sociedade entre a 'alta' linguagem, completamente controlada pela escrita, e a 'baixa' linguagem, controlada pela oralidade, com a exclusão da escrita. A escrita diferencia, do mesmo modo, o "grafoleto" (ou dialeto construído com base na escrita) de outros dialetos, tornando o primeiro um dialeto de importância e efetividade completamente diferentes daqueles que continuam orais. A escrita distancia de forma mais evidente e efetiva sua própria forma, tornando se mais abstrata, mais afastada da palavra sonora. Finalmente, segundo o autor, a escrita separa o ser do tempo. As pessoas que vivem em culturas de oralidade primária podem ser sábias e dar certas explicações para as coisas, mas a elaboração e o estabelecimento de seqüências exatas de causa e efeito requeridos pela filosofia e pelo pensamento científico são desconhecidos entre elas, incluindo os primeiros gregos antes do desenvolvimento do seu primeiro alfabeto.

Alguns outros contrastes são indicados pelos autores quando analisam as relações entre oralidade e escrita. Para Ong, por exemplo, a escrita está atada ao espaço, enquanto a oralidade está presa ao tempo, em conseqüência da presença ou ausência de suportes materiais para expressar a linguagem: "As palavras escritas são resíduos. A tradição oral não tem tais resíduos ou depósitos" (Ong, 1998, p.17). A escrita, ao contrário da linguagem oral, é linear e completamente artificial. Para o autor, enquanto a oralidade é natural, não existe nenhuma maneira de se escrever "naturalmente". Assim como as sociedades orais possuem formas específicas de transmissão do conhecimento, com a introdução de sistemas de escrita, novas formas de transmissão, aprendizagem e memorização da cultura foram também introduzidas.

A educação musical grega vai realizar essa tarefa: os poetas continuaram, por mais de dois séculos, a preservar e a transmitir as tradições da sociedade, até que a possibilidade de documentar a poesia, através da escrita, se tornasse real.

Mesmo depois da introdução do alfabeto entre os gregos, até que um público leitor começasse a efetivamente existir e pudesse compreender as novas formas de composição escrita, os poetas permaneceram ainda essencialmente orais.

Nesse momento, o alfabeto, embora com uma extensão limitada, foi-se tornando um instrumento de alguns governos, leis e atividades econômicas. As novas formas de documentação e registro foram, então, pouco a pouco, sendo utilizadas. Inicialmente, o alfabeto foi usado para registrar a linguagem oral como havia sido antes organizada para a memorização pelo drama, pela epopéia e pela lírica.

O conhecimento acumulado e a vida diária tornaram-se separados. Nesse processo, grupos específicos foram emergindo e se especializando em preservar, editar e interpretar a informação escrita, utilizando, para isso, uma linguagem criada que se diferenciava daquela utilizada na vida cotidiana. O conhecimento tornou-se, então, aos poucos, descontextualizado e formalizado, e instituições foram criadas especialmente para transmiti-lo, de geração em geração como as escolas. Segundo Ong, o comportamento "estudar" só surge depois da introdução dos sistemas de escrita. Todo pensamento, inclusive nas culturas orais primárias, é de certo modo analítico. Ele divide seu material em vários componentes. Mas o exame abstratamente seqüencial, classificatório e explicativo dos fenômenos e de verdades estabelecidas é impossível sem a escrita e a leitura. Os seres humanos, nas culturas orais primárias, não afetados por qualquer tipo de escrita, aprendem muito, possuem e praticam uma grande sabedoria, porém não "estudam". (Ong, 1998, p.17)

Além dos trabalhos que buscam investigar as relações entre oralidade e escrita em perspectivas mais próximas da História, da Antropologia, da Sociologia e da Filosofia, como os que foram aqui sucintamente referidos, muitas pesquisas focalizaram as diferenças lingüísticas entre essas duas formas de linguagem.

Ong apresenta também uma visão evolucionista quando afirma, por exemplo, que as culturas orais vão, pouco a pouco, cedendo espaço à pene tração da escrita, pois "devemos morrer para continuar a viver" (Ong, 1988, p.24), quando divide a "evolução" das culturas humanas em etapas: oral, quirográfica (ou manuscrita), tipográfica e eletrônica. Ao mesmo tempo em que valoriza a linguagem oral, reconhecendo-a como natural e de primordial importância, considera a escrita como uma tecnologia capaz de alargar a potencialidade da linguagem e reestruturar o pensamento. A cultura escrita, como veremos, é imprescindível ao desenvolvimento não apenas da ciência, mas também da história, da filosofia, ao entendimento analítico da literatura e de qualquer arte e, na verdade, à explicação da própria linguagem (incluindo a falada). (Ong, 1998, p.23) Além de supervalorizar a escrita, muitos trabalhos consideram que o único sistema de escrita válido e que demonstra a capacidade de abstração humana é o alfabético, como já foi mencionado. Na percepção de Ong, por exemplo, a escrita é definida como uma representação de sons e não de coisas.

 

BIBLIOGRAFIA

Walter Ong, "Oralidade e cultura escrita", Campinas: Papirus, 1998.

DISCIPLINAS

Nicterói/2007