Muitas vezes vejo o uso de expressões como lamer e hacker serem usadas indevidamente. Quem as usa não o faz corretamente, e o uso pode fazer o sentido delas mudar. Mas o que ocorre com freqüência é muita confusão. Do que estou falando? Das vezes em que um novato fez algo tolo e alguém diz "você é um lamer!". A palavra lamer parece denominar alguém inexperiente, o que não é bem verdade. Deveria ser usada aí a expressão leigo, que quer dizer novato. Também vejo muitos caras dizendo "sou hacker, e vou te ferrar!". É claro que este não é um hacker. Se for realmente capaz de "ferrar" alguém, não falaria isso para muitas pessoas ouvirem. Mas para mim são mesmo uns tolos, porque um hacker não se apresenta como tal. Ele é inteligente o suficiente pra não marcar essa bobeira. Por que é bobeira? Porque tem muita gente de olho em hackers, e se apresentar como tal é se expor. E ser exposto é o primeiro passo para se ferrar de verdade, até com a polícia. Um hacker sabe disso, mas os tolos que aprendem a fazer uma ou outra coisa no computador, e assistem muitos filmes sobre "hackers", acham que viraram mais um "hacker", e se apresentam (expõem) como tal. Esses são lamers de verdade. Os lamers são os que dizem que são o que não são. Dizem que são mais do que são. Esses tolos ajudam a fazer a moda dos hackers. E, como vestindo uma fantasia (na verdade vestem uma fantasia psicológica), se dizem hackers e normalmente acreditam tanto nesta fantasia que chegam a ameaçar outros usuários (em comunicação on-line) ou a provocar danos, incômodo ou prejuízo. Quando se apresentam como "hackers", estão na verdade sendo lamers. E quando causam incômodo , são projetos de hacker burro. Nos dois casos são imbecis nos perturbando. Quem sabe não fala... A falta de informação, e o marketing feito pela imprensa e pelos lamers (os verdadeiros lamers) tem mantido a confusão. Poucos, quase ninguém, liga o nome à pessoa (tipo: cracker causa danos) e uma das conseqüências é que os hackers (os verdadeiros) é quem geralmente ficam com a culpa de tudo de ruim. Por isso mesmo os hackers não se expõem. Suponha que, em algum lugar, alguém seja conhecido como sendo um hacker. Cedo ou tarde um novato tentará fazer uma besteira no computador (como tentar apagar um arquivo em um disquete protegido) e não vai dar certo. O que ele vai dizer? Vai acusar o "hacker" de ter causado problemas. Dificilmente vai pensar na hipótese de que está fazendo algo errado. Quem presta assistência a novatos sabe disso. Um hacker é um fuçador, um curioso. Sua curiosidade o levou a mexer muito com computadores, a aprender mais que os outros usuários, muitas vezes conseguindo do computador mais do que acreditava-se que era possível. Por exemplo, você já viu o Windows 3.1 funcionando em um computador sem disco rígido, apenas com um disquete de 3 1/2"? E já recuperou os dados em um disquete defeituoso, com as informações do diretório e do mapa do disco (FAT) destruído? Ou já burlou o computador, para que rodasse um programa que só funciona com mais memória RAM do que ele tem? Essas coisas salvam o dia de muita gente, mas o usuário comum nem imagina que sejam possíveis. Aliás, o usuário comum de computador nem faz idéia das limitações do computador, muito menos que é possível contorná-las. Mas além de coisas obviamente úteis, como as descritas acima, um hacker pode ser capaz de outras coisas, que são moralmente erradas (as vezes ilegais). Mas a moral e a justiça são coisas relativas. Ainda mais que a coisa justa e a coisa legal nem sempre são compatíveis. É possível para um hacker, por exemplo, usar um computador sem autorização. Ou de forma não autorizada. Um hacker de verdade pode fazer isso, porque pode saber sobre o computador até mais do que aqueles que o projetaram. Mas se deixar alguma pista de ter penetrado indevidamente no sistema, geralmente será um aviso ao responsável pelo sistema, descrevendo as falhas em sua segurança, e às vezes dando dicas de como resolver o problema. O ímpeto de aprender como fazer, e o fato de saber que é capaz de fazer, são suficientes para o hacker. Ninguém além do próprio hacker precisa saber do que ele é capaz. ... E quem fala não sabe Mas há também os caras que só querem encher o próprio ego. Querem receber aplausos até por coisas que não fez, ou que não é capaz de fazer. Algumas vezes até sabem mesmo fazer alguma coisa. Mas só se preocupam mesmo é em estar em evidência, e não têm a quantidade de conhecimento que dizem ter. São os caras que chegam dizendo "sou hacker", em vez de "bom dia" ou "boa noite". E são aqueles que dizem "odeio lamers" e "morte aos lamers". Já viu alguma coisa assim? Não é tão raro. E esses é que são os verdadeiros lamers. Um lamer tem raiva de "lamer". Quer dizer, os lamers de verdade chamam os novatos, os inexperientes, de lamer. Na verdade deveriam chamar de leigo (ou de novato, mesmo). Ninguém nasce já sabendo de tudo. Por isso é normal não sabermos alguma coisa. Mas os lamers não admitem ignorância. Sempre dão a entender (ou até dizem) que sabem tudo. É por isso os lamers tem raiva de leigos. Quando vêm um novato é como se estivessem vendo a si mesmos num espelho. E passam a agredir os novatos, porque os novatos lembram a eles mesmos. É uma fuga. Agridem os novatos, mas na verdade estão agredindo a eles mesmos, projetados em outros. É como se os novatos, que não sabem quase nada, lembrassem que eles também não sabem tudo. Pelo menos isso nos dá uma forma de identificar um lamer de verdade. É alguém que agride ou ofende (geralmente chamando de "lamer") quem faz uma pergunta tola. Os lamers de verdade gostam de chamar os outros de lamer. Afinal, quem é quem? Não existem apenas hackers, lamers e leigos, no mundo da computação. E para distinguir melhor, criamos o esquema abaixo (Tabela 1): Leigo Usuário Usuário Avançado Hacker Tabela 1 De cima para baixo, de leigo para hacker, estão os "degraus" por que passam os usuários de computador. Normalmente as pessoas não passam por todas estas etapas. Na verdade, a cada etapa há menos pessoas. Existem pouquíssimos hackers. E há mais usuários avançados que hackers. E os "avançados" são menos numerosos que os usuários comuns. Isso é uma espectativa, lógico, porque não existem pesquisas a respeito. Mas é razoável pensar assim. Então, ao tomar contato com o computador, tornamo-nos novatos. Cada uma dessas pessoas pode ser chamada de leigo, sem que isso seja ruim. Afinal, ninguém nasce sabendo. Nessa fase erramos muito, perguntamos muito, e não conseguimos grande produtividade com o computador. Tudo normal, pois é a forma normal de aprendizagem. Com o passar do tempo, deixamos de ser novatos. Aí somos "usuários de computador". Alguns usuários pouco conseguem fazer com o computador, alguns só sabem fazer uma única coisa. Outros tornam-se capazes de fazer coisas muito variadas. Tudo normal. E aí temos a grande massa de usuários. Alguns usuários ganham mais experiência. Algumas vezes passam a resolver sozinhos alguns problemas que aparecem. Também ajudam outros usuários. Quando isso torna-se freqüente, esse usuário é o que eu chamo de usuário avançado. Não inventei esse nome, mas ele também não é amplamente usado. Vou usar aqui para denominar uma fase mais avançada do que o usuário comum. Como não são todos os usuários que chegam aí, podemos concluir que é uma quantidade menor que de pessoas. A fase de leigo é a única temporária. Cedo ou tarde o novato deixa de sê-lo, e passa a ser um usuário, um usuário comum. Aliás, estas são as duas fases pelas quais todo mundo passa. Uma quantidade menor ainda de usuários avançam mais. Aprendem muito mais. Esses são os hackers. Mas um hacker não sabe tudo. Ninguém sabe tudo. Um hacker está sempre aprendendo. Um hacker tem uma curiosidade insaciável. Os hackers, então, são os usuários que se envolveram tanto com os computadores que conseguem superar até os limites das máquinas e dos programas. Mas não devemos confundir um hacker, que consegue descobrir como fazer, e entende como funciona, com os caras que apenas repetem uma receita que alguém contou. Repetir uma receita, qualquer um pode fazer. Mas entender por que funciona é o que faz alguém superar a mera repetição e ir além. Não basta fazer, tem que entender o por quê... .