Uma concepção otimista do ser humano
  Segundo Mêncio, "A natureza do homem é boa". No entanto - não que eu o queira -tenho acostumado a ter uma concepção maldosa do ser humano. Nos enraves do dia-a-dia arvoram-se desmedidamente uns sobre os outros. De regra, repele-se imediatamente a ofensa recebida no mesmo tom inconseqüente. São poucas as ocasiões em que se escuta tudo calado, passivo, não sei se inerte ou sereno. E como é difícil agir deste modo pois, ao atuar assim, há a grande possibilidade de se sentir socialmente derrotado, humilhado.
   Mas o ser humano realmente é mau, essencialmente mau. Talvez por isso aqueles tidos como "não maus" recebem uma denominação própria e diferente, constituem as exceções, são os chamados 'santos' ou 'santas'. E, de resto: a falsidade, a maldade e a arrogância de quem não assume uma fração sequer da sujeira remexida em sua narina.
   Então somos maus. Por conseguinte, sou também mau e pronto, pois sou um ser humano, com todos os caracteres próprios da matéria e espírito.
   Aquele que lê essas linhas, porque também mau, isto é, ser humano, poderá falar, não sendo 'santo' ou 'santa': "imbecil, o que escreveu essa idiotice!"; ou: "coitado, tão pessimista!"; ou ainda: "deve, o rapaz, ter algum tipo de desvio psicológico"...
   Isso mesmo, ao julgar sem antes ouvir (e isso, na atual sociedade, está tendo de ser encarado como meta) parte-se sempre de uma premissa discriminatória, desconfiada, pondo seu alvo (à espécie de um réu) prostrado num banco de dor e vergonha. Só estando frente a frente com sua vítima (o réu), é que lhe diz: "parabéns", "a-d-o-r-e-i!",, "moço?!"
   Hipócritas! Todos eles, e também eu, é claro.
   Eis, então, nossa malévola natureza, que segue eternamente lutando para ser pior ainda, sem saber, por exemplo, que uma ofensa verbal, via uma expressão mal dita e indecorosa, pode ser mais danosa que um ataque físico.
   Todavia, um conforto nos proporciona o Estado para aliviar uma possível (não provável) dor de consciência: "Nossas cadeias estão cheias de fétidos ladrões de galinha".

Dessa forma, irrelevante o fato das ruas, praças, jardins... estarem abarrotados de 'criminosos da língua', que, à prepotência, vão moendo a conduta alheia, maltratando-a, na moral e honra, com o seu mais vil e covarde veneno - o achincalhe obtuso.

Cté, 11.06.2003
Textos de Éder David - Academia Caetiteense de Letras - Caetité - Bahia - 2003 - Todos os direitos pertencem ao Autor
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