Contos, Causos e Crônicas |
Textos de Elza Souza Teixeira Silveira - Academia Caetiteense de Letras - Caetité - Bahia - 2003 - Todos os direitos pertencem à Autora |
NOSSA RUA |
Moramos outrora em rua tranqüila desta cidade, curiosamente chamada de rua do Progresso. Não havia ainda televisão. Nas tardes de sábado, quando o tempo permitia, sentávamos na calçada na porta da rua, alguns vizinhos faziam o mesmo e nos divertíamos juntos. Os adultos conversavam e as crianças, sob o olhar atento dos pais, brincavam, jogavam bola, já que o trânsito não era problema. Ali tínhamos nossa happy hour, sem barzinho, nem banda. Nós éramos a música, composta nos corações e soando nos sorrisos. De vez em quando o som dos carros de boi, voltando da feira, completava a orquestra. Uma tarde apareceu um guarda sanitarista, (na época conhecidos como guardas da peste) e nesse dia houve espetáculo novo. O homem estava bêbado e começou a dizer palavrões. Logo foi advertido a maneirar a linguagem, pois havia senhoras e crianças presentes. Qual nada! Revoltado por não receber aplausos, intensificou e dose. Morava em nossa rua um senhor querido e admirado por todos em virtude de sua generosidade e caráter íntegro, mas de gênio esquentado. A princípio tentou acalmar o rapaz, mas quando não conseguiu, apelou: _Ô moço, vá curtir sua cachaça no inferno e nos deixe em paz. Então o bate-boca ferveu. O bêbado retrucou: _Quem é você para me mandar pro inferno? Se você é homem, vem, desça da calçada, repita isso aqui, perto de mim. O morador foi mesmo e partiu para cima; levantou o braço e certamente o soco ia descer. Não houve tempo. O guardinha viu aquele homem forte, irado, à sua frente, deu no pé. Desandou na carreira ladeira abaixo e "pernas pra que te quero". Olhou pra trás por cima dos ombros e lá vinha o homenzarrão correndo atrás dele e pega não pega, quando o guarda avistou a esquina de uma transversal, enfiou-se nela. _Valei-me Nossa Senhora Santana, se esse gordão me pega... Nunca pensei que ele aceitasse o desafio, pareceu-me um pouco velho. O morador grande e pesado desceu no embalo da carreira, enquanto o outro, mais magro e mais ligeiro, parecia ter criado asas nos pés. O morador da rua percebeu logo o malogro e voltou.Agora mais cansado e subindo a rua, desanimou de alcançar o rapaz. Resolveu gritar: _Volta aqui, seu safado, você não me perguntou se eu era homem? Vem ver. E lá bem longe, o guarda respondeu: _Volto nada, quem espera tempo duro é jegue ou lajedo. E tudo acabou em gargalhadas, felizmente. |