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Futebol e rádio FM: essa mistura só dá em “jabá”
Há três anos
atrás, um modismo seduziu a mídia brasileira e ganhou a defesa dos
politicamente corretos. As chamadas “jornadas esportivas” invadiram a Freqüência
Modulada de todo o país, maquiadas de “cidadania”, “vanguarda” e outros jargões
oportunistas. Muito se falou a favor disso, e os incautos imaginaram que FM que
se comportasse como uma emissora AM ficasse, da noite para o dia, “mais inteligente”,
“mais revolucionária” e “mais vanguardista”.
Imaginou-se até
que o jabaculê (a corrupção no rádio e TV) e as músicas ruins iriam sumir definitivamente
das FMs, com tanto blábláblá político, econômico e esportivo que iria povoar a programação
diária. Muita FM imbecil se transformou, num piscar de olhos, em “rádio-sabedoria”,
na imaginação dócil e esperançosa de muita gente boa, principalmente jornalista.
Isso só porque o incauto acorda às seis da manhã e, ao invés de ouvir uma boa música,
escuta um comentário sonolento sobre buracos nas ruas, sobre o fracasso de tal
time de futebol ou então informações sobre o trânsito da Av. Paulista.
Injetar
programação AM nas FMs virou uma grande armação. Vide a nossa conhecida Metrópole
FM, do “magnânimo”(sic) Mário Kértesz. Armação que, a exemplo de muita mulher
pelada e idiota que veio do nada mas que ganha o adjetivo de “bela” a toda
hora. Em ambos os casos, você não pode de maneira nenhuma questionar, porque
será chamado de “chato”, perderá amigos e não terá sua carta indignada publicada
numa coluna de rádio. Ou, se tiver, na semana seguinte uma pessoa vai
questionar e desqualificar tudo que você disse e você não terá direito à réplica,
pois se mandar um e-mail contestando o colunista não irá publicar.
Por trás dessa
dourada armação, no entanto, dá para perceber algumas coisas. 99% dos jornalísticos
dessas FMs não passa da média informacional já transmitida por jornais
impressos e TVs. 70% do radiojornalismo dessas FMs não ultrapassa o perfil
ideológico do programa “A Voz do Brasil” (isso com base na transmissão durante
os governos de Fernando Henrique Cardoso) e os noticiários políticos,
principalmente quando feitos em Brasília, dificilmente diferem do noticiário do
programa da Radiobrás. Neste caso a gente até ri quando essas FMs tentam
convencer a opinião pública de que são radicalmente contra “A Voz do Brasil”
(mas depois aceitam com um conformismo surpreendente a “flexibilização” de horário
do programa). É querem uma “A Voz do Brasil” produzida por cada uma dessas
emissoras.
Quanto ao
futebol, o ninho jabazeiro chega a ser enorme. Todo mundo conhece a corrupção
dos clubes esportivos e seus dirigentes (que envolveu até latifundiários e
banqueiros de bicho, entre outros urubus). Sem falar do excesso de anunciantes
que vários programas esportivos possuem, que enriquece demais seus apresentadores.
Da mesma forma que as gorjetas que os “cartolas” dão para as FMs. Todo mundo sabe o jogo do poder e
suas artimanhas em relação ao futebol. Em 2000, quando veio a “onda esportiva”
nas FMs, o Campeonato Brasileiro, conhecido popularmente como Brasileirão,
ganhou um pseudônimo de “Taça João Havelange” por razões meramente políticas. E
sua final deu num bafafá, incluindo queda de um alambrado do Estádio São Januário,
no Rio de Janeiro, com muitos feridos, e uma confusa partida entre São Caetano
e Vasco da Gama.
A corrupção no
futebol, aliada ao jabaculê das FMs, dá numa politicagem tremenda. Politicagem
que ocorre mas é comodamente desmentida, até com certa arrogância, pelos
chamados “cronistas esportivos”. Negar o jabaculê é fácil, negar politicagem
idem, as equipes esportivas de FM podem até estar com falta de assunto que vão
passando cinco ou dez minutos jurando que não recebem jabá e, como pretensos
heróis, crucificam no ar o indivíduo que vasou tal denúncia, podendo ser até
mesmo um humilde ouvinte, pai de família.
É muito
estranho que de uma hora para outra a imprensa foi vender a programação
esportiva em FM como “fenômeno de vanguarda”. O filão esportivo já estava bem
acomodado nas emissoras AM, mas de repente inventaram que “esporte em FM era
novidade”. Se for por esse raciocínio duvidoso, então revolucionário não é Che Guevara,
e sim o Darly Alves (“coronel” que matou o seringueiro Chico Mendes). Desde os
anos 70 ouvimos esse papo de futebol em FM “como vanguarda”. Primeiro, falavam
em “rádio do povo”, mas a idéia de “povo” ficou mais vaga e a mídia então usou
a idéia de “cidadania”, que por enquanto está pegando. Mas, quando desgastar, o
que vão dizer? Que são rádios para “minorias” ou “maiorias”, conforme o rumo
das circunstâncias?
Segundo
especialistas, a programação tipo rádio AM nas FMs não passa de uma espécie de
manipulação da opinião pública, uma forma de promover a boa imagem de políticos
poderosos feita até mesmo por FMs sem nenhum parlamentar ou “cacique político” como
dono (rádios que se proclamam “independentes”). O futebol seria um
narcotizante, uma sobremesa para o bom ouvinte que se acha convencido por um
radiojornalista de FM de que o neoliberalismo é o caminho seguro para a evolução
da humanidade e que a impunidade de assassinos poderosos é aceitável porque
eles não ameaçam a sociedade, embora ameacem a ética e deixem os familiares das
vítimas abandonados pela justiça dos homens.
A gente deixa
de ouvir uma boa música nas FMs por causa de uma ou duas horas ouvindo repórter
preocupado em alianças de partidos no Congresso Nacional. Deixamos de ouvir uma
programação mais diversificada por causa de uma transmissão esportiva de som péssimo
também em FM e cujo narrador parece estar com a batata assada na boca. Deixamos
de ouvir boas canções por causa do besteirol e quando algum idiota que defende
essas FMs nos ordena a mudar de rádio, ouvimos porcarias de Michael Bolton ou
aquelas coisas mofadas de trilhas de novelas globais dos anos 80 sendo
empurradas como se fossem “boa música”. Ou aquelas canções de ninar que mais
parecem açúcar nos olhos do diabético feitas pelo canastrão Kenny G. Isso
quando não somos surpreendidos nas FMs segmentadas por algum pagodeiro romântico
“arrependido” ou por breganejos que agora duetam com grandes nomes da MPB ou têm
seus shows dirigidos por renomados diretores teatrais.
Há vinte anos
atrás, quase não havia FM transmitindo futebol ou noticiário longo, maçante e às
vezes prolixo. E tínhamos rádios musicais bem melhores que as de hoje, com uma
segmentação razoável e às vezes surpreendente em tempos sem Internet. E quem
queria noticiário longo e futebol bastava ir para as emissoras AM. Que aliás
esperam a implantação de tecnologia digital que o Congresso Nacional demora a
regulamentar. Será por pressão da “bancada da bola” e da “bancada das FMs”? Faz
sentido.