DROGAS
OTOTÓXICAS 1. CONCEITO As ototoxicoses são
afeções iatrogênicas provocadas por drogas medicamentosas que alteram o ouvido
interno (labirinto). Essas drogas podem afetar o sistema coclear ou o sistema
vestibular ou ambos, alterando duas funções importantes do organismo: a audição
e o equilíbrio. 2. FISIOPATOLOGIA : Dos grupos de drogas
ototóxicas, os antibióticos aminoglicosídeos são talvez os mais importantes, sem
dúvida os mais estudados. Alguns autores concluíram que estes antibióticos
combinam com receptores das membranas das células ciliadas do órgão de Corti, da
mácula sacular e da utricular e das cristas do sistema vestibular. Esses
receptores são os polifosfoinosítideos, são Iípides componentes da membrana
celular com papel importante nos eventos bioelétricos e na permeabilidade da
membrana por interação com íon cálcio. A formação de complexos entre os
antibióticos aminoglicosídeos e os polifosfoinosítideos produz modificações na
fisiologia da membrana e na sua permeabilidade, acabando por afetar a estrutura
e função dos cílios, em primeiro lugar, e depois da própria membrana e,
finalmente, por causar destruição das células receptoras (Schacht, 1977). 3. AGENTES ETIOLÓGICOS -
MEDICAMENTOS OTOTÓXlCOS É importante conhecer os diferentes tipos de
drogas que podem provocar ototoxicidade, para sua prevenção. Nos primeiros
tratamentos de Sífilis com mercúrio já se podia ser detectado lesões ototóxicas.
Há descrições de casos com desenvolvimento de surdez, tremores e "loucura",
sugerindo tanto oto como neurotoxidade. Entre elas está o grupo dos antibióticos
aminoglicosídeos, como a estreptomicina, a diidroestreptomicina, a neomicina, a
canamicina A e B, a paramomicina, a aminosidina, a gentamicina, a amicacina, a
tobramicina, a netilmicina. Desse grupo, estreptomicina, tobramicina,
gentamicina são mais vestibulotóxicos que cocleotóxicos; os outros são mais
cocleotóxicos. Alguns antibióticos não aminoglicosídeos têm sido citados na
literatura como ototóxicos. São eles: a eritromicina, com efeitos reversíveis; o
cloranfenicol, principalmente por ação tópica; a ampicilina; a minocilina,
derivado da tetraciclina com ação vestibulotóxica; a cefalosporina, com poucas
referências; a viomicina; a capreomicina, com maior toxicidade vestibular; a
polimixina B e E; a colistina. Existem alguns grupos de drogas ototóxicas que
não são antibióticos; é o caso de desinfetantes, como clorexidlne, benzetônio,
benzalcônio, iodo, iodine, iodoforo e álcoois, como etanol e propilenoglicol.
Essas drogas são usadas as vezes como desinfetantes em cirurgias do ouvido médio
para assepsia e podem provocar ototoxicidade por ação local. Existe o grupo dos
b-bloqueadores, como
practolol e propanolol, com referências de alterações cocleares com perda
auditiva. Diuréticos, como o ácido etacrínico, a furosemida, a bumetanida, a
piretamida e a indapamida, são cocleotóxicos mas as alterações auditivas são
reversíveis. Essas drogas não são vestibulotóxicas; entretanto potenciar a ação
dos aminoglicosídeos. Drogas antiinflamatórios, como salicilatos, aspirina,
quinino, podem provocar alterações auditivas, a cocleotoxicidade dos salicilatos
e da aspirina reversível. Antineoplásicos podem ser ototóxicos, como é o caso da
cisplatina, da mostarda nitrogenada e da vincristina. Essa cocleotoxicidade pode
ser reversível ou irreversível. Os contraceptivos orais podem provocar em alguns
casos perdas auditivas uni ou bilaterais progressivas e irreversíveis
(Oliveira,1989). 4. QUADRO
CLÍNICO 4.1- DIAGNÓSTICO: Devemos ressaltar que é
de suma importância a história médica do paciente. Na anamnese, quando há
antecedentes de tratamento com essas drogas, o diagnóstico torna-se muito fácil.
As vezes, a utilização da droga pode ser suspeitada de modo indireto, quando o
paciente ou os familiares informam que após infecção séria houve tratamento com
antibiótico, cujo nome não sabem referir, e que após esse tratamento ocorreram
perda auditiva, vertigens e desequilíbrio. O aparecimento da perda auditiva pode
ser rápido ou insidioso, podendo ocorrer durante a exposição a um agente
ototóxico ou meses depois da mesma ter sido interrompida. A perda pode ser
precedida ou acompanhada por um tinitus agudo. Se o sistema vestibular for
danificado, o paciente pode referir tontura e marcha oscilante. O grau inicial
da perda pode ser instável. Por exemplo, depois que a exposição tenha cessado, a
perda auditiva pode recuperar-se para os limiares normais e em outros casos pode
progredir para um grau mais severo. Devemos pesquisar o início, sintomas no
momento, história médica e cirúrgica, medicações, exposição anterior a
ototóxicos, etc. É importante relembrar que em pacientes acamados a ataxia
típica e a osciloscopia não ocorrem, diferentemente dos pacientes ambulatoriais.
O quadro clínico é o de uma labiríntopatia periférica e o paciente pode
apresentar sintomas e sinais relacionados com lesão coclear, como hipoacusia,
zumbidos de alta freqüência e plenitude auditiva ou sintomas e sinais
relacionados com a função vestibular, especialmente vertigens, desequilíbrios,
nistagmo e manifestações neurovegetativas. A alteração auditiva, bem como a
disfunção vestibular, pode ser unilateral ou bilateral (Oliveira,1990). 4.2- AVALIAÇÃO
DIAGNÓSTICA DA FUNÇÃO COCLEAR E VESTIBULAR Deve ser
feita para se conhecer o local, o grau de ototoxicídade e a possibilidade de uma
reabilitação do paciente, bem como para realização de diagnóstico diferencial
com outras labirintopatias periféricas. Vários autores recomendam realização dos
testes de Weber, Rinne, Schwabach, pesquisa de movimentos oculares anormais
(nístagmos), exames de pares cranianos teste de Romberg, além de verificação de
funções cerebelares para pesquisa de disfunções cerebelares e neuropatias
periféricas. Segundo Fee,
o teste calórico de Hallpike é suficiente para detectar a ototoxídade, porém
Jongkees e Hulk acreditam que há superioridade do estímulo rotacional do reflexo
vestíbulo ocular sobre os testes calóricos para detectar ototoxidade por
Streptomicina. Outros
testes audiométricos a serem realizados consistem numa audiometria de tons puros
por via aérea e óssea, logoaudiometria e impedanciometria (Barber, 1979). Na
audiometria de tons puros, o paciente apresentara hipoacusia neurossenrorial com
maior perda auditiva uni ou bilateral nas freqüências agudas. Essa hipoacusia
poderá ser irreversível e de graus variados, como no caso de aminoglicosídeos,
ou reversível, como, por exemplo, no caso dos salicilatos , aspirina ou
diuréticos, como ácido etacrínico, furosemida e outros. Com a logoaudiometria,
avalia-se a capacidade de discriminação do paciente, possibilitando estudar a
validade de indicação de um aparelho de amplificação sonora. Com a
impedanciometria, deve-se detectar a presença do reflexo estapediano, dando a
possibilidade de confirmar a presença de recrutamento de Metz, pois a lesão é
coclear. Para
detecção dos limiares eletrofisiológicos, dois exames atuais têm sido muitas
vezes utilizados para avaliação da audição, especialmente em crianças de pouca.
idade, e pacientes com diminuição da consciência, a eletrococleografia e a
audiometria do tronco cerebral (Jewett,1971 ). Com eles, pode se avaliar o grau
de perda auditiva. Na eletrococleografia é analisada a onda I (potencial de ação
composto do nervo acústico) e no BERA (respostas auditivas evocadas do tronco
cerebral) a onda V é a mais utilizada - potenciais gerados ao nível do colículo
inferior (Marseillan,1979 e 1977). Tanto a eletrococleografia como a audiometria
de respostas auditivas evocadas do tronco cerebral são métodos objetivos, por
isso importantes na avaliação das crianças de pouca idade (Bernard,1980).
Estudos realizados com ECOG. mostram imediata redução no potencial de ação e no
microfonismo coclear com minutos da infusão EV de aminoglicosídeo, porém devemos
lembrar os riscos da realização do ECOG. em pacientes debilitados. Se houver
dano ototóxico incompleto e há parada da exposição, existe a chance de
reversibilidade de 10 a 15%. 5.
MONlTORlZAÇÃO A
monitorização é importante de ser realizada durante a administração da droga
para determinar a progressão da ototoxicidade. À medida que o número de agentes
ototóxicos e o conhecimento de fatores sinérgicos para ototoxicidade vem a
aumentando, vários fatores de risco devem ser considerados:
1. Alteração
da função renal. 2. Altos
picos séricos da droga. 3.
Tratamento prolongado (principalmente mais de 14 dias) com altas doses.
4. Idade
(idosos com mais de 65 anos e neonatos). 5.
Combinação da droga com o ruído. 6.
Hipoacusia e zumbido prévios. 7.
Combinação de drogas especialmente com diuréticos. 8. Mau
estado geral. 9. Presença
de otites médias. 10.
Tendência familiar. O número de
métodos audiológicos para monitoramento da ototoxicidade vem crescendo, mas
estes testes devem ser selecionados para melhor avaliação a menor custo ao
paciente. Os teste consistem em: 1.
Audiometria convencional: inclui a audiometria de tons puros por via aérea e
óssea com freqüências de 250-5000 Hz, impedanciometria e discriminação vocal. O
ponto mais controverso é o critério para considerarmos uma alteração
significativa. Tradicionalmente considera-se alterações nos limites, maiores de
15 dB em uma ou mais freqüências ou 20 dB em uma. Outros autores consideram uma
perda auditiva de 25 dB nas freqüências de 500 1000 e 2000 Hz. A monitorização
deve ser feita pelo menos uma vez antes do tratamento e uma a duas vezes por
semana durante o tratamento observando-se principalmente nas altas freqüências.
Estes testes devem ser feitos até 3 meses após o tratamento. 2.
Audiometria de alta freqüência: pode determinar perdas maiores de 8000 Hz permitindo
diagnóstico precoce antes das perdas atingirem a faixa de audição social. 3. Emissões
otoacústicas: são sinais gerados espontaneamente pelo ouvido em resposta à
estimulação acústica gerada na cóclea, portanto apresentam vantagem de ser um
método bastante sensível para detectar precocemente a ototoxicidade, já que a
maioria das ototoxinas afetam inicialmente as células ciliadas
externas. 4. Registros
eletronistagmograficos: realiza a monitorização vestibular. O mais utilizado é o
teste calórico. Deve ser feito um primeiro teste antes ou até 72 horas depois de
iniciado o tratamento. Em seguida devem ser feitos testes semanais. Uma redução
de 50 % ou mais do sistema vestibular em pelo menos um dos ouvidos significa,
vestibulotoxicidade e para casos de ototoxidade por estreptomicina, podem ser
realizadas provas rotacionais. 5.
"Check-lists": método mais formal e prolongado de questionário para detectar o
primeiro sinal de perda auditiva, prevenindo que passe despercebido. É um método
de baixo custo e útil principalmente em pacientes de baixo risco para
ototoxicidade 6.
OTOXICIDADE E MONITORIZAÇÃO PEDIÁTRICA Entre as
crianças, são os recém-nascidos com infecções graves no berçário de terapia
intensiva que recebem antibióticos aminoglicosídeos. Isso porque essas drogas,
apesar de seus efeitos colaterais ototóxicos, são altamente eficazes contra
infecções graves causadas por microorganismos Gram-negativos, como Enterobacter,
Haemophilus, Klebsiella Escherichia coli Pseudomonas, Proteus, Bacterióides.
Esses microorganismos podem provocar nessas crianças infecções graves nos tratos
respiratório e urinário. Infecções de pele e tecidos moles, especialmente em
queimados, septicemias, infeções polimicrobianas, infeções pós-cirúrgica e
pós-traumática, peritonites, infecções em crianças com problemas oncológicos e
com granulocitopenias. Nesses casos, os antibióticos mais utilizados têm sido
gentamicina, amicacina, tobramicina, netilmicina, eficazes contra esses tipos de
infecções (Oliveira,1989 e 1990). A ototoxicidade na infância é um tema bastante
controvertido. Vários autores têm publicado porcentagens variáveis de casos de
ototoxicoses em crianças, decorrentes do uso de vários antibióticos
aminoglicosídeos. Outros autores relatam ausência de ototoxicose em crianças que
receberam essas drogas. Como vários estudos tem sido retrospectivos e poucos
prospectivos, com doses e seguimentos adequados, é difícil ter uma idéia precisa
da ototoxicidade infantil (Oliveira,1990). Muitos estudos deverão ser feitos,
especialmente com BERA, que permite monitorização adequada da função auditiva
(Bemard,1980). Ainda com relação a ototoxicidade na criança, alguns pontos devem
ser ressaltados para maior segurança na aplicação dessas drogas:
a)
predisposição familiar - as drogas devem ser evitadas quando há história
familiar; b)
ototoxícidade fetal - essas drogas podem atravessar a placenta quando
administradas as gestantes; c) função
renal - neste caso a taxa de filtração glomerular é baixa e a droga pode se
acumular no soro e perilínfa; d)
prematuridade; e) o papel
do ruído da incubadora na potenciação do efeito da droga (Oliveira,1989;
Proctor,1981; Winkel,1978). Os fatores
de risco nas crianças podem ser referidos como sendo apnéia, hipóxia,
hiperbilirrubinemia, desequilíbrio eletrolítico, hipotensão, meningites,
septicemia, manutenção em incubadora, terapia diurética, insuficiência renal
(Faden,1982), hipoacusia e zumbidos prévios, tratamento prolongado e com altas
doses, combinações de droga ototóxica e exposição ao ruído, mau estado geral,
desnutrição, otites médias. Em qualquer dessas situações, deve-se evitar ou
utilizar com muito cuidado esses antibióticos (Oliveira,1990). 7. PREVENÇÃO
DA OTOTOXICIDADE Quando
ocorre uma lesão vestibular por uma das drogas citadas, pode ocorrer o mecanismo
de compensação central e com o tempo os sintomas e sinais desaparecem
auxiliados, é claro, por tratamento antivertiginoso e cinesioterapia. Quando
ocorre lesão coclear, há destruição das células ciliadas do órgão de Corti e a
perda auditiva é irreversível, não havendo tratamento. Nesses casos, dependendo
do grau da hipoacusia, o paciente deverá ser submetido reabilitação auditiva e
da linguagem. Devemos lembrar que em crianças uma perda auditiva irreversível
iatrogênica desse tipo pode dificultar-Ihes a comunicação para o resto da vida.
Daí a importância de evitar o uso dessas drogas, a não ser em casos onde haja
risco de vida. Como não há tratamento para recuperar a audição, temos que
conhecer algumas regras básicas da ototoxicidade (Oliveira,1990). 7.1-
Recomendações Pará a prevenção das ototoxicoses 1. Evitar o
uso de drogas ototóxicas, principalmente os antibióticos aminoglicosídeos,
administrando essas drogas, sempre com orientação pelo antibiograma, apenas
quando não há outra possibilidade, ocorrendo risco de vida devido a infeção
grave, especialmente por microorganismos Gram-negativos.
2. Conhecer
os fatores de risco do paciente, especialmente a função renal. Evitar a
aplicação dessas drogas nesses casos (Oliveira,1990).
3. Quando há
necessidade de tratamento com essa drogas, ministrar doses seguras; por um tempo
não prolongado e escolher as drogas eficazes e menos tóxicas. Entre a amicacina,
gentamicina, tobramicina e a netilmicina, a tobramicina e netilmicina são as
menos tóxicas, especialmente a netilmicina (Herting,1980)
4. Durante o
tratamento, principalmente em pacientes com fatores de risco, devesse realizar a
monitorização auditiva e vestibular; no caso de criança, se possível com a
audiometria de tronco cerebral (Bernard, 1980). Caso não seja possível a
monitorização, pelo menos um seguimento minucioso do paciente, para detecção de
sintomas auditivos e vestibulares, deve ser realizado. 8. O
TRATAMENTO DA OTOTOXIDADE: Pacientes
com perda auditiva profunda deve-se fazer uso de prótese e se necessário,
implante coclear. O tinitus deve ,ser controlado (white noise machine ou rádio
para dormir ou tinitus masker). A náusea na fase aguda pode ser controlada com
anti-heméticos por exemplo. Segundo Black, sedativos e tranqüilizantes como
alprazolam e diazepam devem ser evitadas. 0 benzodiazepínico pode ter efeito
adverso nos movimentos oculares. 9. USO
TERAPÊUTICO NA DOENÇA DE MÉNIÈRE: Devido a
característica tóxica da streptomicína, pode-se fazer ablação seletiva por
labirintectomia química em pacientes que falham no tratamento com métodos mais
conservadores. Se pacientes apresentarem sintomas bilaterais e intratáveis,
deve-se fazer uso intramuscular em doses divididas, continuando tratamento até
que: -dose
cumulativa segura pré-determinada seja atingida -efeitos
ototóxicos estejam evidentes. Devemos
lembrar que o efeito vestibular é dado quando a função vestibular e destruída,
levando a sintoma como ataxia, perda de equilíbrio e aumento da osciloscopia.
Outra via pode ser a transtimpânica, que deve ser descontinuada se:
-sinais de
ototoxidade evidentes -dose limite
é atingida -monitorização indica ototoxidade Existe
também aplicação via canal semi-circular lateral, na tentativa de obter
labirintectomia. 10. PESQUISA
COM ANlMAIS DE EXPERIMENTAÇÃO Tem sido
realizados estudos em animais para avaliação das funções auditiva e vestibular
durante a administração de drogas supostamente ototóxicas. A avaliação
fisiológica da audição tem sido feita com métodos comportamentais, como o
reflexo de Preyer, o condicionamento por reforço negativo e o condicionamento
operante, e com métodos eletrofisiológicos, como o registro das respostas
elétricas cocleares e do tronco cerebral por estimulação acústica com a técnica
de eletrodos implantados. A avaliação da função vestibular em animais tem sido
feita com a prova térmica bilateral e a prova rotatória pendular. A avaliação
fisiológica tem sido complementada por estudos histológicos dos epitélios
ciliados do órgão de Corti e das máculas e cristas do sistema vestibular. Tem
sido utilizadas: a técnica das secções seriadas, a técnica de preparações de
superfície, a técnica de microscopia eletrônica de transmissão e de varredura.
Todas contribuem para analisar as lesões histológicas provocadas pelas drogas
ototóxicas (Oliveira,1989 e 1990). Tem sido observada perda maior das células
ciliadas externas, sendo as células ciliadas internas mais resistentes. As
perdas são maiores nas espiras basais e as duas primeiras fileiras de células
ciliadas externas são mais intensamente destruídas. As lesões dependem da dose
da droga e da evolução do tratamento. Técnicas recentes de cultura de células
ciliadas de órgão de Corti de camundongos têm permitido estudos com microscopia
óptica e eletrônica para avaliação de antibióticos aminoglicosídeos. Esses
estudos demonstram que as células ciliadas na espira apical da cultura são menos
sensíveis do que as das espirais basais. As células ciliadas externas parecem
ser mais extensamente alteradas do que as internas. Esses efeitos ototóxicos são
mais severos quando a droga é aplicada na cultura sem cálcio e magnésio na
solução, podendo haver bloqueio desses efeitos, elevando a concentração salina
de cálcio e magnésio (Richardson, 1991 ). Esses estudos em meio de cultura, de
células ciliadas, poderão ser no futuro um modelo potencial para a pesquisa da
ototoxicidade dos aminoglicosídeos in vitro. Outro método aplicado recentemente
para o estudo da ototoxicidade aguda de drogas in vitro utiliza células ciliadas
do órgão de Corti de cobaia isoladas e mantidas em meio de cultura. Foram
estudados os efeitos da gentamicina, por exemplo, na viabilidade celular e nas
respostas móveis das células. A despeito da inibição da entrada do cálcio pelo
aminoglicosídeo, a habilidade das células ciliadas externas apresentarem
respostas móveis com despolarização pelo potássio não alterou. Não há também
modificação da viabilidade das células ciliadas externas, nem alteração da
contractilidade das células ao estímulo elétrico (Dulon,1989). Uma droga
que tem sido estudada com estes métodos modernos de cultivo de células ciliadas
externas isoladas é o salicilato de sódio, a aspirina (Shebata, 1991). A grande
importância dessa droga é o fato de provocar alterações auditivas reversíveis,
perdas auditivas temporárias bilaterais, simétricas , horizontais ou
descendentes (maior nas altas freqüências). É conhecido que o salicilato afeta
as células ciliadas externas ou o suprimento sangüíneo da cóclea. Pesquisas
recentes tem mostrado que o salicilato afeta a liberação de neurotransmissores
na junção das células ciliadas internas e do nervo auditivo , afetando bastante
essas células. Esse fato é importante para a compreensão futura da ototoxicidade
dos salicilatos. Outro achado é a demonstração de que o salicilato reduz in
vitro a motilidade das células ciliadas externas artificialmente induzida pela
estimulação elétrica. Isso se deve a alterações observadas nas cisternas
laminares supostamente necessárias para a contração dessas células. 11.
IMPORTÂNCIA DAS PESQUISAS EM OTOTOXICIDADE As pesquisas
neste campo da ototoxicidade têm contribuído para eliminação de várias
drogas ototóxicas do arsenal terapêutico, evitando assim surdez iatrogênica. Tem
permitido selecionar drogas menos ototóxicas e eficazes para o tratamento de
infecções graves causadas por microorganismos Gram-negativos. Tem contribuído
para maior eficácia na monitorização auditiva e vestibular. Tem possibilitado a
administração de tratamento controlado e mais seguro com doses adequadas e menos
risco de surdez. Grandes contribuições nas áreas básicas de anatomia,
histologia, eletrofisiologia, bioquímica e farmacologia do ouvido interno foram
feitas pelas pesquisas em ototoxicidade (Oliveira,1990).
Convém
chamar a atenção para alguns estudos de ototoxicidade que devem ser estimulados,
tais como os possíveis efeitos da aplicação de ototóxicos locais no ouvido
médio, cujos relatos tem sido controvertidos. Também seria importante
estabelecer a possibilidade de seu uso seguro no ser humano. Da mesma forma
devem prosseguir os estudos de proteção do órgão de Corti contra drogas
ototóxicas os de uso de drogas menos ototóxicas, os de labirintectomia química
com essas drogas ototóxicas, os de degeneração e regeneração das células
ciliadas e fibras nervosas após as alterações pelos ototóxicos, os dos efeitos
dos ototóxicos in vitro aplicados em cultura de células ciliadas do órgão de
Corti, os dos efeitos da privação sensorial após lesão do órgão de Corti por
ototóxicos e sua importância na indicação dos implantes cocleares , os de outros
tipos de epitélio ciliado para a utilização de um modelo experimental que
possibilite avaliar a ação dos ototóxicos in vitro (Oliveira,1989 e 1990). 12.
AMINOGLICOSÍDEOS 12.1-
História e origem. A ineficácia
da penicilina G no tratamento de processos infecciosos provocados por
microorganismos Gram-negativos foi o primeiro estímulo para a procura de agentes
antimicrobianos eficientes contra estas bactérias. O desenvolvimento da
estreptomicina foi produto de uma pesquisa científica bem planejada de.
substâncias antibacterianas. Waksman e colaboradores examinaram uma série de
actinomicetos presentes no solo, no período de 1939 a 1943, e demonstraram a
elaboração por estes fungos de numerosos antibióticos; contudo, nenhum destes
antibióticos era útil do ponto de vista clínico, por serem muito tóxicos ou sem
atividade suficiente. Em 1943, uma variedade de Streptomyces griseus foi isolada
e elaborava uma potente substância antimicrobiana. O primeiro relato público da
descoberta deste novo antibiótico - estreptomicina - Foi feito por Schatz. Bugie
e Waksman no princípio de 1944, e se constatou ser capaz de inibir o crescimento
dos bacilos da tuberculose e numerosos microorganismos Gram-positivos e
Gram-negativos in vitro e in vivo, hoje em dia, está praticamente restrito ao
tratamento da tuberculose. Houve relatos de surdez irreversível e distúrbios do
equilíbrio. As primeiras queixas eram distúrbios visuais durante movimentos,
deixando dúvidas se o fenômeno era central ou periférico. Em 1948, Causse
demonstrou a ação da Streptomicina agindo diretamente nas estruturas
labirínticas. O desenvolvimento da Dehidroestreptomicina teve a finalidade de
diminuir a toxidade vestibular, porém demonstrou-se alta toxicidade coclear,
sendo seu uso clínico abandonado. A Neomicina foi isolada por Waksman e
Lechevalier a partir do Streptomyces fradies, sendo seu uso restrito à via
tópica pois apresenta grande oto e nefrotoxidade à via parenteral. Umezawa e
cols. desenvolveram a kanamicina, bastante efetiva contra bactérias entéricas
(menos Pseudomonas). Em 1960 foi isolada a Gentamicina, que é o mais utilizado
dos Aminoglicosídeos, e tal como a Netilmicina é produzido por espécies de
Actinomyces micronospora. Outros Aminoglicosídeos como a tobramicina(1967),
Amicacina(1972, primeiro aminoglicosídeo semi-sintético), e Netilmicina, foram
desenvolvidos para. suplantar a resistência da Pseudomonas. A ação dos
aminoglicosídeo é primariamente contra bactérias G-, e o desenvolvimento de
resistência é resultado da aquisição de plasmídios que contém genes que
codificam enzimas que os metabolizam. Seu uso em ORL se torna importante se
lembrarmos que a Pseudomonas aeruginosa é agente da otite externa maligna, além
de estar associada à afeções do ouvido médio e colesteatoma. Além disto, a E.
coli, K.pneumonie, P.mirabilis e espécies de enterobactérias também são
freqüentemente encontradas nas afeções de O.M. Devemos lembrar que iodo
aminoglicosídeo é ototóxico alguns primeiramente cocleotóxico outros
primeiramente vestibulotóxico, sendo o que os difere em sua toxidade é o número
de aminas ou netilaminas livres ligados à porção glicosídea da molécula. 12.2-
Administração é eliminação: Sua
administração pode ser: -Parenteral
(IM ou EV): principalmente para injeções profundas, pois somente 3% da droga é
absorvida por via oral. -Tópico.
-Intratimpânica: usado no tratamento da doença de Ménière.
-Intratecal:
aumenta a probabilidade de haver ototoxicidade. Há também casos de absorção em
irrigação de articulações. A penetração na BHE é encontrada só em neonatos.
Também há possibilidade de ocorrer ototoxicidade na esterilização intestinal com
neomicina em pacientes com colite ulcerativa, no uso de aminoglicosídeo em
diálise peritoneal e na absorção pela mucosa desnuda com aplicação de
antibióticos em queimaduras de terceiro grau. Os aminoglicosídeo são
metabolizados e excretados quase exclusivamente por filtração glomerular, sendo
sua concentração urinária cerca de 10 vezes maior que a sangüínea, e atecidual
1/3 desta. Portanto, se houver diminuição da função renal, deve se ajustar as
doses ( ¯ excreção e
consequentemente concentração sangüínea
), aumentando as chances de oto e nefrotoxidade. 12.3-
Toxicologia dos Aminoglicosídeos: É difícil
avaliar qual aminoglicosídeo tem o menor índice de ototoxidade ( vestibular ou
coclear) e/ou nefrotoxicidade. Evans, em sua revisão de 45 trabalhos sobre os
vários tipos de aminoglicosídeo ( amica, genta, netit, siso e tobra ) não chegou
a conclusão sobre qual o mais ototóxico ou nefrotóxico. Kahlmeter e Dahlager, em
revisão de estudos de 1975 a 1982 acreditam que a netilmicina tem ototoxidade
ligeiramente menor. Nestes estudos a perda é geralmente em altas freqüências,
sendo alguns casos unilaterais e ocasionalmente reversíveis. Por outro
lado, alguns estudos feitos em animais de laboratório mostram diferenças
quantitativas da toxidade dos aminoglicosídeos, demonstrando que:
-genta e
sisomicina são as mais ototóxicas -tobramicina
em posição intermediária -netilmicina
é a menos tóxica, A amicacina
estaria em posição intermediária semelhante a tobramicina, porém sua dose
terapêutica é 3 a 5 vezes maior que a mesma, levando a uma ototoxidade
semelhante a gentamicina . Pelos
estudos de Benduch em 1982, em relação a cocleo/vestibulotoxidade temos: ATB
VESTIB
COCLEAR streptomicina
+++
+ tobramicina
+
+ gentamicina
++
+ netilmicina
+
+ kanamicina
+
+++ amicacina
+
+++ neomicina
+
++++ A base
bioquímica e molecular dos aminoglicosídeo foi elucidada por Willians, Zenner e
Schacht, que evidenciam o mecanismo de várias partes da ototoxidade.
Inicialmente, há passagem do aminoglicosídeo através dos vasos, o que é
reversível e antagonizado por cátions bivalentes de cálcio e magnésio. Hermes
sugere a ação do cálcio como inibido competitiva da Genta, sugerindo o uso via
oral para minimizar a ototoxidade. O próximo passo é a entrada na célula, que
depende de energia, interferindo em vários processos intracelulares. Devemos
lembrar que os aminoglicosídeo têm efeito pior com a função renal alterada. O
dano agudo se manifesta geralmente com tinítus, porém este sintoma pode estar
ausente. A queda da audição se dá primeiramente nas altas freqüências,
progredindo depois para freqüências baixas. O ouvido humano pode ouvir além de
16000 hz, mas os exames só detectam abaixo de 8000hz. 0 paciente vem com queixa
quando a perda já é em torno de 30 dB, e que inclui freqüências mais baixas
(3000- 4000 hz). Portanto, a detecção precoce é difícil. Os pacientes
debilitados podem não relatar inicialmente o zumbido, queixando-se apenas após a
suspensão do medicamento. Os efeitos
ototóxicos presentes após duas ou três semanas do término ou da mudança da
terapia são praticamente definitivos. 0 modelo de toxidade coclear é feito em
animais. O mais notável é a perda de células ciliadas, que ocorre primeiramente
na espira basal, progredindo para o ápice. Atinge primeiro a 1 fila, depois a
intermediária e, após, a mais externa. Podemos confirmar este fato pelo tinitus,
que é o primeiro sintoma, de tons altos e contínuo que sugere lesão na base da
cóclea. Apenas após as células ciliadas externas serem lesadas é que teremos
alterações nas células ciliadas internas, seguidas das células de suporte do
Órgão de Corti. O dano nas células ciliadas internas é mais severo no ápice e
progride para a base. Não há recuperação da função quando as células são
lesadas. A manifestação mais comum da vestibulotoxidade é o desequilíbrio,
demonstrado pelo andar atáxico, tropeços freqüentes e perda do equilíbrio a
movimentos bruscos. Geralmente os pacientes necessitam de apoio e ajuda da mão
ao andar, podendo ter vertigem posicional passageira. Com o uso de alguns
ototóxicos os pacientes podem apresentar osciloscopia, que a sensação que
objetos visíveis "pulam" quando do movimento da cabeça, ao se movimentar ou ao
andar de carro. Este sintoma é resultado da perda do reflexo vestibulo-ocular.
A Streptomicina e a Genta agem
primeiramente na porção vestibular. No caso da Streptomicina a seletividade pode
ser usada no tratamento da doença de Ménière. Em alguns casos a ototoxidade
vestibular é reversível sendo que o dano Permanente geralmente ocorre 2 a 3
meses após administração da droga. A compensação através do Sistema Visual
proprioceptivo é feito por tempo extenso. O dano histológico é semelhante ao da
cóclea. Há perda das células ciliadas que não são regeneradas, perda das células
ciliares na mácula utricular e sacular tal como na crista dos 3 canais
semicirculares . Acredita-se que as células ciliadas tipo I sejam mais
sensitivas a danos do que as células ciliadas tipo II. Os aminoglicosídeo também
causam lesões na membrana otoconial e estruturas otolíticas, comprovado por
estudos em porquinhos da Índia, com uso de Strepto, no qual há diminuição do
número de otolitos na membrana otolítica, no utrículo e no sáculo. Devemos
relembrar que estudos em animais são realizados na tentativa de mimetizar os
efeitos do ototóxico que ocorrem em seres humanos, pois os animais empregados
nestas experiências são saudáveis e as doses aplicadas são diferentes.
Acredita-se que se houver uma diminuição do clearance renal, há um aumento da
meia-vida dos aminoglicosídeo na perilínfa. Estudos em animais demonstram que o
aminoglicosídeo é "clareado" mais lentamente na perilinfa e na endolinfa do que
dos níveis sangüíneos. Também em animais é descrito a ototoxidade dos
aminoglicosídeo potencializados com uso de diuréticos de alça. Acredita-se que
no uso de diuréticos de alça, primeiramente e após o uso de aminoglicosídeo, a
toxidade do aminoglicosídeo manteria-se a mesma, porém, o uso de aminoglicosídeo
e posterior uso de diurético levaria a um efeito sinérgico, pelo fato do
aminoglicosideo interagir com a membrana celular do ouvido interno, que
facilitaria a entrada do diurético gerando maior ototoxidade. Ha também
sinergismo dos aminoglicosídeo com ATB b-Iactamicos (porem sem
alteração da ototoxidade). Várias Serratias são inibidas pela combinação de
netilmicina com carbenicilina, cefalomandone, azlocilina, mez/ocilina,
cefotaxime e moxaiactam. Além da ototoxidade, os aminoglicosídeo podem
apresentar nefrotoxidade, que se manifesta inicialmente por uma proteinúria
passageira, podendo levar, em alguns casos, até a azotenúria. Outras toxidades
também são descritos para os aminoglicosídeo. Eles podem causar bloqueio
neuromuscular e apnéia após infusão EV rápida, lavagem peritoneal ou pleural ou
em pacientes em uso de aminoglicosldeo que são submetidos a anestesia geral.
Estes efeitos são geralmente revertidos com o uso de anticolinesterase. Alguns
agentes ototóxicos podem atravessar a placenta (como o aminoglicosídio ),
levando à danos vestibular e coclear, além de outras mal formações congênitas
(fissuras palatinas, malformações esqueléticas, defeitos oculares, anormalidades
no sistemas cardiovascular, genitourinário e gastrointestinal ) 12.4- Uso em
crianças Estudo em
crianças (genta, kana e streptomicina}, realizado em 1300 recém-nascidos não
constatou diferença entre nefro e ototoxidade. As doses devem ser sempre
apropriadas, sendo baseadas na superfície corpórea e não no peso, não devendo
ser também associada com diurético de alça, indometacina e vancomicina. Se for
necessário administrar altas doses (fibrose cística, p/ex.); monitora- se a
concentração sangüínea. 13.
VANCOMICINA . Os primeiros
casos de ototoxicidade foram descritos em 1958 por Geraci cols. É um antibiótico
usado clinicamente no tratamento de infeções por S. aureus meticilino resistente
e usado oralmente como tratamento de colite pseudomembranosa. A ototoxicidade
ocorre quando medicado por via parenteral, já que seu uso via oral não leva a
sua absorção significativa. Recentemente vem sendo estudado através da
cromatografia e radioimunoensaio a farmacocinética para determinar a curva da
concentração dos seus níveis séricos e assim, realizar um monitoramento como
prevenção da ototoxicidade, principalmente em pacientes do grupo de risco
(idosos e prematuros). Foram documentados perda auditiva em humanos a níveis
superiores a 30-40 mg/l com presença de zumbidos relacionados com o pico sérico
da droga a 40-50 mg/l; o nível sérico terapêutico usual é de 6-10 mg/l. O seu
uso no segundo ou terceiro trimestre da gestação a aparentemente não leva a
perda neurossensorial ou nefrotoxicidade no feto. O aumento da incidência de
ototoxicidade vem sendo observado em animais de experimentação e em humanos que
receberam uma combinação da vancomicina com a aminoglicosídio, principalmente
naqueles com quadro de perda auditiva permanente. A ação ototóxica da
vancomicina em si, parece ser pequena. Análogos da vancomicina como o
Teicoplanin e Daptomycina podem ser considerados similares á vancomicina em
relação a ototoxicidade. 14.
ERITROMICINA Os primeiros
casos foram relatados em 1973 por Mintz e cols. e até o momento pelo menos 32
casos foram documentados de ototoxicidade (perda auditiva, zumbido e
ocasionalmente vertigem) em associação ao seu uso endovenoso ou oral em altas
doses. A maioria destes pacientes eram idosos com insuficiência renal ou
hepática ou pacientes que fizeram tratamento por pneumonia causada pela
Legionella pneumophilia. A perda
auditiva pode ocorrer inicialmente nas freqüências da fala, simultaneamente às
altas freqüências, levando o indivíduo a perceber esta perda precocemente, diferentemente da perda auditiva resultante do uso de
aminoglicosídios que se inicia nas altas freqüências. Ela é geralmente bilateral
e reversível na maioria dos casos após 3 dias da suspensão do medicamento.
Existem, entretanto, casos de perda auditiva irreversíveis. Não se sabe ao certo
o mecanismo da sua ototoxicidade. Existem casos de pacientes com acometimento a
nível do Sistema Nervoso Central manifestada sob a forma de diplopia, confusão,
paranóia e alucinação associado a perda auditiva. Em animais de experimentação
submetidos a injeção de eritromicina, verificou-se alteração ao nível do BERA da
onda IV seguida pela onda III e II, mas sem alterações no microfonismo coclear
ou potencial de ação; sugerindo desta forma a ação da eritromicina a nível das
vias auditivas centrais. A ação da
eritromicina é claramente dose dependente e portanto, altas dosagens e pequena
capacidade para eliminá-la apresentam uma maior probabilidade ototóxica. Segundo
Schweitzer e cols., a prevenção da ototoxícidade induzida pela eritromicina deve
obedecer a alguns parâmetros: 1.A dose
diária não deve exceder 1,5 g se concentração de creatinina for maior que 180
mols/l. 2. Pacientes
idosos e com insuficiência renal ou hepática devem realizar audiometria pré e
pós tratamento. 3. tomar
precaução ao fornecer eritromicina em pacientes que já estão recebendo drogas
ototóxicas como furosemide, cisplatina ou aminoglicosídio. A
claritromicina e azitromicina são dois novos antibióticos macrolídios. Até o
momento, não foram documentados casos indicando sua ototoxicidade. Hopkins em
1981 mostrou anormalidades do SNC e SNP em 1,3% dos pacientes que fizeram uso de
azitromicina. Ainda é muito cedo para se ter alguma conclusão a respeito destes
dois novos antibióticos. Eles apresentam grande vantagem de serem utilizadas em
baixas doses e por poucos dias o que pode levar a um aumento progressivo dos seu
uso em doses maiores em outras formas de apresentação com aumento de penetração
tecidual elevando o risco de ototoxidade. 15.
CISPLATINA É um metal
pesado usado como droga antineoplásica para tratamento de tumores. Seu estudo
farmacocinético mostra uma importante quebrada cisplatina em proteínas séricas
tóxicas. Não se sabe ao certo onde elas são formadas (ouvido interno ou outra
parte do corpo como fígado ou rins), mas o fígado converte estes metabólitos
tóxicos em não tóxicos rapidamente. Existem
várias hipóteses para tentar explicar o mecanismo da sua ototoxicidade, mas
todas inconclusivas. Estudos recentes em animais de experimentação mostraram a
ação ototóxica similar da cisplatina com os aminoglicosídeos, com acometimento
das células ciliadas externas da espira basal da cóclea inicialmente e da espira
apical posteriormente. Sua ação está relacionada à redução da sua motilidade,
bloqueamento dos canais de transdução e eventualmente destruição das células.
Experimentalmente, observou-se lesão da estria vascular apenas com injeção em
altas doses endovenosas de cisplatina levando a redução do potencial
endococlear, o que. não foi observado com múltiplas injeções em baixas
doses. Os sintomas
mais comuns sugestivos de ototoxicidade são: 1. Otalgia.
2. Zumbido:
ocorre em 2% a 36% dos pacientes. Geralmente é transitório , desaparecendo após algumas horas ou semanas do fim do tratamento.
3. Sintomas
vestibulares: pode ocorrer ocasionalmente em pacientes com função vestíbular
anormal pré existente. 4. Perda
audítiva ocorre em 9% a 91% dos pacientes. Geralmente é bilateral e inicialmente
nas altas freqüências (6000-8000 Hz), que podem estender a freqüências menores
com o tratamento prolongado. O paciente pode apresentar certo grau de
reversibilidade, mas se a perda for profunda; geralmente é permanente. A perda
pode ser progressiva e cumulativa ou pode ser súbita. Os fatores
de risco são dependentes de: 1. Idade.
2.
Sucetibilídade individual. 3. Função
renal. 4.
Intervenção com outras drogas ototóxicas. 5. Local do
tumor: priricipalmente em tumores no crânio. 6. Modo de
administração da droga: ototoxicidade é maior após injeções em bolo, e
portanto ela deve ser fornecida em baixas doses, divididas em vários meses. 7. Dose
acumulativa: estudos prospectivos sobre a ototoxicidade da cisplatina latina
mostram que: - dose de 20
mg/m2. . . . . . . . . . . . . . . . .9% desenvolvem perda auditiva.
- dose
de 50 mg/m2. . . . . . . . . . . . . . . . . 46% desenvolvem perda auditiva.
- dose
de 100-120 mg/m2. . . . . . . . . . . . 81 %
desenvolvem perda auditiva. O efeito da
ototoxicidade é determinado mais pela quantidade fornecida em cada dose do que
pela dose cumulativa. Devido a
importância da cisplatina como quimioterápico, é essencial a investigação de
métodos para alterar a dose limite de toxicidade, sem causar redução em sua
atividade antineoplásica. Outros antineoplásicos ototóxicos são a vincristina a
mostarda nitrogenada. 6-amino nicotinamida misonidazole DL-difluorometil
ornitina 16.
DIURÉTICOS DE ALÇA São
compostos que exercem potente efeito natriurético através da inibição na
reabsorção de íons nas células epiteliais da alça de Henle. Os diuréticos mais
comumente conhecidos são o ácido etacrinico e furosemide. O furosemide
é excretado pela urina. Sua eliminação diminui de maneira importante em
pacientes com insuficiência renal podendo prolongar a meia vida , de
eliminação de 30 minutos para 10 a 20 horas, levando a um aumento dos seu nível
plasmático e assim a um maior risco de ototoxicidade geralmente associada a
níveis maiores que 50 mg/l. O mecanismo
da sua ototoxicidade não é bem conhecido. Parece que age sobre a bomba de íons
no ducto coclear assim como nos rins com bloqueio no sistema de transporte de
KCI para fora das células marginais na estria vascular. Experimentos em animais
mostram que a utilização de ácidos orgânicos como probenecide ou penicilina G
previamente a administração de furosemide, apresenta efeito protetor por
mecanismo de competição nos tecidos do ouvido interno. Esta proteção com ácidos
orgânicos para furosemide não é encontrada para o ácido etacrínico, sugerindo
que o mecanismo de ototoxicidade entre elas seja diferente. A incidência
de ototoxicidade a furosemide é de 6,4%. Geralmente a perda auditiva é
temporária e totalmente reversível, existindo porém, casos de perda permante. A
maioria dos casos não estão bem documentados, já que a maioria dos diuréticos de
alça estão associados a uso concomitante de aminoglicosídio. Existem estudos
referindo que a ototoxicidade do furosemide possa ser minimizado com uso de
infusão continua em baixas doses para evitar um pico sérico, que estaria
associado a um maior risco. Tem-se comunicado também ototoxicidade com
piretamida, bumetanida e indapamida a nível principalmente coclear. 17.
SALICILATOS Os
salicilatos são uma das drogas mais comumente utilizadas na clinica. São
absorvidas rapidamente no trato gastrointestinal, atingindo a circulação
sistêmica, sendo encontrada após 1 hora nas células ciliadas externas e gânglio
espiral, difundindo-se rapidamente para toda parte do ducto coclear, sem
evidências de acumulação em estruturas específicas da cóclea. Vários
estudos foram realizados para tentar determinar o mecanismo da ototoxicidade.
Estudos mais recentes atribuem a ototoxicidade a alteração bioquímica e
fisiológicas como decréscimo do fluxo sangüíneo e permeabilidade anormal da
membrana das células ciliadas externas mediadas por catecolaminas (aumento de
norepinefrina) ou metabólitos do ácido aracdônico (decréscimo de
prostaglandinas). Este fenômeno seria temporário e não levaria a alteração
morfológica mais severa a ponto de levar a morte das células sensoriais. Outros
estudos propõem a formação de um hidrops baseando-se nas modificações
audiometrias com o teste de glicerol. As manifestacões clínicas quando altas
doses de salicilatos (salicismo) são utilizadas incluem náuseas, vômitos,
confusão, cefaléia, taquicardia, taquipnéia, zumbido e perda auditiva. O zumbido
geralmente é tonal e de alta freqüência, podendo ser um dos primeiros sinais de
ototoxicidade. A perda auditiva é geralmente discreta a moderada, bilateral,
simétrica e reversível (recuperação ocorre 24 a 72 horas após suspensão da
droga). Estudos em humanos foram realizados para tentar determinar uma
correlação entre seus níveis séricos com seu efeito ototóxico, verificando que
podem ocorrer perdas auditivas a concentração plasmáticas menores que 20mg/dl.
O quinino
embora esteja sendo substituído por derivados semisintéticos com menor
ototoxicidade é estudado junto com os salicilatos devido as suas manifestações
similares; é utilizado como antimalárico, sendo encontrado na água tônica,
cinzano e martini. 18.
PREPARAÇÕES TÓPICAS Alguns
antibióticos aminoglicosideos e outras drogas são usados no tratamento de otites
médias crônicas supurativas para eliminar otorréia e permitir a realização das
timpanoplastias. Estas preparações aplicadas topicamente, atingem o ouvido médio
através da perfuração da membrana timpânica alcançando o nicho da janela redonda
e podendo ter acesso ao labirinto membranoso. Sabe-se que a membrana da janela
redonda é permeável, existindo transporte por difusão e por meio de vesículas
pinocitóticas.(Goycoolea 1980). Em 19T8, Smith e Myers demostraram a passagem de
gentamicina e neomicina através da janela oval e argumentaram a questão da
ototoxicidade das gotas tópicas. Foi difícil avaliar o papel das gotas tópicas
como causa de perda auditiva neuro sensorial assim como foi fácil culpar a otite
media crônica como causa desta: Posteriormente, em 1980 Goycoolea e Paparella
afirmaram que tanto a doença (pela absorção de toxinas da secreção purulenta)
como o tratamento tópico seriam a causa da perda auditiva neuro sensorial
encontrada na otite media crônica. A maioria das preparações tópicas contém
ingredientes ototóxicos bem documentados em modelos animais, Existem alguns
casos na literatura associando perda auditiva com agentes tópicos sem OMC
simples. As preparações tópicas contém uma combinação de ácidos , solventes,
anti-sépticos, antifúngicos, esteróides, anestésicos e antibióticos (polimixina
B, polimixina E, cloranfenicol e neomicina). O solvente
geralmente utilizado é o propilenoglicol. Existem estudos sobre seu efeito em
animais de experimentação, todos concordando que as preparações não devem ter
altas concentrações do solvente. O anti-séptico usualmente é o álcool. Estudos
em animais comprovam que o etanol a 50% colocado diretamente na janela redonda
por 10 minutos e etanol a 10% no ouvido médio por 24 horas apresentam efeito
tóxico. O esteróide
usado nas preparações inclui a hidrocortizona cujo efeito ototóxico é
discutível. Os
anestésicos como procaína, tetracaína e lidocaína podem provocar náuseas e
vômitos por ação anestésica dos receptores vestibulares. Antifúngicos
como a nistatina e anfotericina B parecem não ter efeito ototóxico, já o uso de
ácido acético 2%, ácido bórico 3% e mertiolate aquoso apresentam ação ototóxica
discutível. As
preparações geralmente contém um ou mais antibióticos. Muitos antibióticos
comprovadamente atravessam a membrana da janela redonda como cloranfenicol,
estreptomicina, gentamicina, polimixina B e neomicina. Estas drogas passam do
ouvido médio para o ouvido interno por via linfática, via membranosa da janela
redonda ou via sangüínea, podendo desse modo provocar perdas auditivas
neurossensoriais. Em relação ao uso de Ciprofloxacin tópico, Esposito e cols.
fizeram estudos com seu uso tópico (3 gotas de 250 mg/ml de solução oftálmica 2
vezes ao dia) em pacientes portadores de OMC não encontrando alterações
audiometrias ou vestibulares após o tratamento. Anti-sépticos usados há
preparação pré operatória como Povidone-iodine tem segundo Aursnes 1982 efeitos
ototóxicos; Morizono e Sikora em 1983 demostraram este efeito em modelos
animais. Outra substância que resultou ser ototóxica segundo estudos de Bicknell
em 1971 é o Chorhexidine. Apesar de
vários experimentos provocando alterações cocleares em animais de
experimentação, nota-se poucos casos de ototoxicidade local em humanos. Uma das
possíveis explicações seria a maior suscetibilidade desses animais pelo fato da
membrana da janela redonda ser delgada e exposta diretamente sem o seu nicho no
ouvido médio. Além disso, o seu uso em humanos ocorre geralmente sobre uma
membrana espessada com secreção e tecido de granulação no nicho por processo
infeccioso, o que tornaria a membrana menos permeável. Deve se
tomar alguns cuidados para impedir a ototoxicidade local:
1. Aplicação
com dose segura e por tempo curto. 2. Suspensão
do seu uso com a melhora da otite e conseqüente melhora da permeabilidade da
membrana. 3. Evitar
aplicação de gotas ototóxica na otite média secretora com tubo de ventilação.
4. Evitar
aplicação de gotas nas perfura traumáticas. 5. Solicitar
audiometria tonal como monitorização em pacientes com fatores de risco
presente. 19. OUTRAS
SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS OTOTOXICAS Chumbo - é
encontrado na fabricação de altes, verniz, tintas, pilhas, baterias elétricas,
compostos de chumbo e outros. Trabalhadores expostos a fumos ou poeira de chumbo
que demonstraram sintomas de intoxicação, não eram deficientes nos tons baixos
de audição (abaixo de 51 Hz), levemente deficitários nos tons 500 a 2000 Hz e
grandes deficitários acima de 2kHz Além disso, foram verificados danos de origem
coclear que mostram apenas perdas stáma de 2kHz; boa percepção sonora em
freqüência médias, mas com deficiência nas faixas de baixa e alta freqüência;
patologia retrococlear. Mercúrio -
encontrado em fabricantes de amálgamas dentais, cerâmica , desinfetantes,
drogas, fotografia, instrumentos de calibração, em dentistas e outros.
Verifica-se dor de cabeça, dificuldades auditivas, restrição do campo visual e
descoloração do cristalino. Geralmente os sintomas desaparecem, porém demoram
anos, mesmo depois da afastamento da fonte de exposição.
Arsênico -
encontrado em descoloração de vidros, pintura as pistolas com pigmentos de
composto de arsênico, etc. Quando a absorção é prolongada pode ocasionar perda
auditiva neurossensorial severa nas freqüências aItas, indicando problemas do
ouvido interno, mudanças patológicas dos olhos, e normalidade a nível
eletroencefalográfico, entre outros. Tri-cloro-etileno - encontrado em limpeza a seco, refrigeração, curtume,
esmalte, borracha gráfica, têxtil. Provoca degeneração dos nervos cranianos
(trigêmeo, olfatório e facial), vertigem, dor de cabeça, problemas emocionais,
perda auditiva NS bilateral, simétrica, em altas freqüências com queda começando
em 2kHz ou 3kHz, câncer, distúrbio do labirinto com diminuição da reação de
excitabilidade do órgão vestibular nas provas calóricas e rotatórias, achados
patológicos periféricos vestibulares centrais. Dissulfeto
de Carbono - encontrado em indústria de fibra de rayon pelo processo de viscose.
Provoca deficiência auditiva NS retrococlear, distúrbios vestibulares,
respiratórios, renais, irritação. ARTIGO:
Ototoxicidade das gotas tópicas em pacientes com otite media crônica. L.
Podoshin, M.Fradis, & J. Ben pavis. (Haifa, Israel) The journal of
Laryngology and Otology Jan.1989 Foram
estudados 150 pacientes com otite media crônica durante um período de 10 anos;
124 receberam tratamento tópico com uma mistura de neomicina P , olimixina B e
dexametasona; o grupo controle de 26 pacientes recebeu tratamento só com
dexametasona. Todas os pacientes foram acompanhados por um período de 1 a 2
anos. Excluíram-se aqueles pacientes com cirurgia otológica previa, historia
familiar , exposição a barulho, pacientes previamente tratados com ototóxicos
conhecidos (gentamicina), pacientes com doença sistêmica crônica e menores de 6
Anos maiores de 65 anos. A diferencia
da média dos limiares da primeira audiometria menos a última em todas as
freqüências foi de 6.0 dB para o grupo tratado com a mistura e -0.9 dB para o
grupo tratado só com dexametasona. 0 tempo de tratamento foi também considerado,
encontrando-se que em pacientes que receberam tratamento contínuo (22 pacientes)
a média da perda sensorioneural foi de 10,9dB ; em pacientes tratados com
intervalos curtos (não mais de 3 meses-69 pacientes) a queda foi de 3.6 dB e em
pacientes tratados com intervalos longos ( de 3 a 6 meses-33 pacientes) foi de
1.8 dB. Encontrou-se que 14 pacientes dentro do grupo tratado apresentavam
O.M.C. unilateral e não referiam tratamento prévio; comparou-se a média do
limiar sensorioneural em todas as freqüências no ouvido doente com este dado no
ouvido não doente dando 11.2 dB; este fato fala a favor de que a doença por si
só causa perda sensorioneural. Observou-se
que tempo de instalação da doença também influencia no grau de perda.
Concluiu-se
que existe relação entre a duração do tratamento com gotas tópicas e a perda
sensório neural e que o tratamento tópico com neomicina, polimixinaB, tem papel
importante na perda sensorioneural! da O.M.C. Os autores
consideram que o número estudado foi pequeno, e sugerem a realização de estudos
adicionais, assim como aconselham não ignorar que o uso de gotas no ouvido pode
causar déficit auditivo sensorioneural. BIBLIOGRAFIA
-Bailley cap
136 -Princípios
e Prática em Otorrinolaringologia Fonte: www.jonas.com.br
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