16.11.1969
Quosque tanden abutere, americani, patientia
nostra ?
De terras longínquas, grandes homens
pequenos e pequenos homens
grandes vieram ter à América. Depois de
longa viagem, encontraram um
gigante. Eram numerosos aqueles homens e,
assim, venceram e
apossaram-se das novas terras.
Uns poucos, meteram-se floresta a dentro e
catequizaram
os índios, rezaram missas e mais missas, e
agradeceram a
Deus tão boa dádiva.
E mais homens vieram. Vinham, pegavam o ouro
e partiam.
E outros homens vieram. Pegavam o ouro e
partiam.
Levaram tudo o que o gigante possuía e este,
nada fazia pois
estava adormecido em berço esplêndido.
Passava o tempo e o gigante ia tornando-se
pequeno, pequeno e pobre.
Seu povo era escravizado.
Os anos continuavam passando e o gigante
continuava dormindo.
Apareceu, então, numa vila pequena que,
entretanto, era rica, um homem
que tentou expulsar os homens das terras
longínquas.
Seu grupo era pequeno e ele, com seus poucos
homens não conseguiram
expulsar os homens maus, e foram mortos por
eles. E aquele homem,
traído por outro homem, foi enforcado e seu
corpo esquartejado.
E ninguém seguiu os seus passos.
Um dia, um homem daquelas terras veio
governar o gigante que ainda dormia.
Mas com a chegada do homem bom da terra má,
o gigante acordou
com o brado forte de “independência ou
morte”. Mas tão logo liberto,
independente, o gigante comodista e
preguiçoso, tornou a dormir.
... E dormindo ficou.
Século e meio se passou e um outro povo, do
mesmo continente,
encontrou o gigante. Veio com dinheiro,
muito dinheiro; veio com
promessas, muitas promessas, e, como os
antigos, os homens do
país visitante começaram levar as riquezas
do gigante e a explorar o seu povo.
E até hoje, o povo é oprimido, explorado,
roubado e enganado.
E os homens das promessas tomaram conta de
tudo, tomaram conta de todos.
... E o gigante, continua dormindo em berço
esplêndido.
19.11.1969
Quando recebia das mãos do sargento, sua
farda e equipamento,
o rapaz têve sua primeira idéia de
liberdade.
Quando Fui Para o Quartel
Um dia,
eu me lembro,
despedí-me de casa.
no mesmo dia,
eu me lembro,
quis voltar para casa.
21.11.1969
Afinal eu te encontrei,
Menina dos sonhos meus;
Afinal consegui teus lábios beijar;
Afinal me destes teu amor;
Afinal estás em meus braços.
És minha finalmente!
22.11.1969
Enquanto conservarmos a esperança de que
um dia as coisas
venham a melhorar podemos continuar vivendo.
Sigamos todos confiantes pois nem tudo está
perdido.
Vamos, há tanta coisa bela para contemplar;
Resta-nos muito para conhecer.
Não pensem somente nas guerras,
Não pensem mais na miséria,
Nem na fome, nem na opressão
que exercem sobre nós os homens que nos
governam.
Virem seus rostos e verão que do outro lado,
Em algum lugar qualquer,
Ainda existe amor.
Vamos, todos com olhos enxutos,
Pois a vida sempre será bela
Enquanto houver uma esperança,
Enquanto existir amor.
22.11.1969
De que serve a vida sem amor?
Em minha vida, passei por diversos caminhos;
ri muito, e já chorei também.
Lembro-me, ainda, dos meus tempos de
criança: do jogo de bola, do
esconde-esconde, da menina do grupo, das
brigas com a turma da outra rua.
Eu era pequeno mas ainda me lembro das
ilusões e sonhos que eu tinha.
Queria ser rico, queria ser famoso, só para
não ter que trabalhar.
Um dia, quase que de repente, eu ia ficando
rico, e achava que estava
ficando famoso também, pois tinha muitos
amigos.
Entretanto, eu sentia-me só; não era
totalmente feliz.
Faltava-me alguma coisa que naquele tempo
não sabia o que era.
Nada eu fazia, além de ir à escola; eu era
um inútil que só fazia sonhar.
Passeava muito, ia a muitas festas com os
amigos, viajava sempre e, durante
este tempo, havia muita ao meu redor. Mas,
ainda assim, eu sentia-me só e não era
feliz.
Todos os brinquedos que eu quis em minha
infância, eu tive.
Todos os lugares em que eu tive vontade de
ir, eu fui.
E na minha juventude, novos amigos, novas
idéias eu tinha; mas os amigos que
eu tinha não tinham idéias, não tinham nada;
eram vazios, e a única coisa de que
gostavam era de ficar parados nas esquinas,
às portas de um bar qualquer,
comentando sobre as pessoas que passavam. Ou
então, de contarem prosa,
para fazerem inveja aos outros.
Aquilo já estava me cansando, mas eram meus
amigos e com
eles eu continuava saindo.
E continuei saindo, até o dia em que
descobri que não eram aqueles os
amigos que eu queria, pois eu queria ter um
amigo, que fosse também meu amigo.
Um dia, muito de repente, fiquei pobre.
Tudo meu pai perdera: casa, carros e tudo o
mais.
Todos aqueles sonhos que eu tivera quando
criança, haviam terminado.
Então, comecei a trabalhar.
Dos muitos amigos que eu tinha, apenas
alguns restaram.
As pessoas que sempre iam à minha casa, de
um momento para outro, deixaram dela
freqüentar.
Foi então que eu comecei a viver.
No colégio do Estado, no curso noturno, fiz
novas amizades, as quais conservo
ainda, pois não ligavam o fato de eu não ser
rico; eles também não eram.
No quartel, encontrei gente de todas as
espécies e de diferentes classes sociais.
E lá, fiz também grandes amizades.
Mas até naqueles tempos, em que tive
verdadeiros amigos, eu me sentia só.
Procurei encontrar nas namoradas aquilo que
me faltava; mas de nada adiantava.
Por mais rodeado de pessoas eu estivesse,
continuava sentindo a solidão dentro de mim.
Conheci, então, Márcia Maria. E, de repente,
tudo mudou.
Mas ficou apenas no de repente.
Eu não sabia que amar é entregar-se, é usar
de sinceridade, e quis apenas
tirar tudo o que ela poderia, um dia,
oferecer-me.
Foi curto o namoro, curto como tudo o que eu
passara até então.
Voltei para minha vida solitária, dos
passeios pelas noites, do tirar sem dar.
Um dia, sem que eu quisesse, pensei em
Márcia Maria, e somente então, pude
ver tudo aquilo que eu jogara. Mas eu não
tinha coragem para procurá-la; teria
que ser casualmente. E casualmente
aconteceu.
Os primeiros dias foram de incerteza; foram
de medo que tudo se repetisse.
Entretanto eu já sabia que era preciso eu
entregar-me, e a ela entreguei-me.
E a mim, ela se entregou.
Foi assim que comecei a sentir-me feliz.
De que me importavam os amigos que eu
perdera?
Para que o dinheiro que eu já não tinha?
Tinha uma só pessoa ao meu lado e não me
sentia só.
E mesmo quando dela eu estava distante,
sabia que alguém pensava em mim.
Enfim eu era feliz! Descobrira aquilo que me
faltava quando mais jovem, descobrira o amor
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