O meu Papai Noel
Ivan Jubert Guimarães
1992
Hoje ‚ uma
quinta-feira, dia 10 de dezembro. Estamos muito
perto do Natal. Para mim, em toda a minha vida
até os dias de hoje, sempre esperei com muita
ansiedade a chegada de dezembro. Sempre me
pareceu que tudo mudava quando chegava o mês de
Natal. Nas ruas as pessoas mostravam-se alegres
nesta época do ano. Parecia que a tristeza
também saía de férias embora os menos
afortunados não tivessem um Natal como, graças a
Deus, eu sempre pude ter.
Nesta época eu sempre repensei meus valores
todas as vezes que eu via alguém pedindo esmolas
em pleno Natal. Por mais abundante que fosse ser
o meu Natal, uma tristeza muito grande sempre
invadia meu coração e me fazia pensar naquelas
pessoas que não teriam uma ceia nem presentes e
nem mesmo a companhia de amigos ou parentes.
Eu também já tive Natais muito simples, mas uma
coisa sempre me dominava: o espírito de Natal.
Lembro que numa noite de Natal eu fiz as pazes
com um primo com quem havia brigado muito tempo
antes.
Lembro também que numa noite de Natal meu pai,
com os olhos cheios de lágrimas, me abraçou e me
beijou. Eu havia brigado com ele e evitava
conversar com ele tal era o ódio que eu sentia
até aquele momento.
Então uma doce sensação me fez chorar, só por
dentro, pois meu orgulho era muito mais forte.
Mas eu nunca esqueci daquele beijo e neste
momento meus olhos estão cheios de água. Eu
brigava muito com ele, pois nunca procurei
entender o que se passava com ele. Nunca quis me
aproximar embora sentisse muita falta de uma
conversa como via meus amigos terem com seus
pais.
No jantar ou no almoço ele ficava em pé na
cozinha e me olhava, me encarava. Seus olhos
queriam me dizer alguma coisa. Eu desviava o
olhar, pois me sentia incomodado. E discutia com
ele. Ele baixava seus olhos e saía. Quando ele
adoecia e eu tinha que levá-lo a um Pronto
Socorro era um transtorno. Eu me irritava com
aquela rotina e praguejava. Só que lá no fundo do
meu coração eu torcia e pedia a Deus que não o
levasse, que ele se curasse.
Lembro do último conselho que recebi dele logo
depois que me casei. Eu queria sair do emprego e
ele me aconselhou que não o fizesse, pois algum
dia poderia receber uma gerência. Pouco tempo
depois eu recebi aquela gerência. Nunca consegui
dizer-lhe obrigado. Lembro que uma vez eu sentia
fortes dores e ele curou essas dores com suas
mãos. Nunca lhe agradeci.
Certa vez eu tirei dele um carro com o qual ele
trabalhava e depois vendi. Nunca vou esquecer o
momento em que ele me entregou as chaves. Sabe lá
Deus a humilhação e a vergonha que ele sentia
naquele momento. Eu nunca fui seu amigo. Fazia
as coisas apenas por que era minha obrigação de
filho, cuidar de alguém que tinha cuidado de
mim. No entanto nunca achei alguém que falasse
mal dele. Onde quer que fosse as pessoas
adoravam-no. Todos os meus primos viam nele o
tio preferido. Aqui mesmo no bairro todos nossos
vizinhos sempre brincavam com ele e gostavam
dele. Pessoas que eu mal conhecia me diziam que
ele os havia ajudado muito um dia. Eu apenas
sentia ciúmes.
Das tantas vezes que eu o levei a hospitais, a
última foi quando ele não parecia estar se
sentindo tão mal como de outras vezes a não ser
pelas dores. Ficou horas e horas esperando por
uma vaga em um hospital. Quando o deixei ele
ainda parecia bem. Ele disse: "Será que eu escapo
desta?". Procurei tranqüilizá-lo e lembro-me
agora ter sido este o último beijo que ele me
deu. No dia seguinte ele não estava mais comigo
e quando vi seu corpo eu chorei convulsivamente.
Aí eu lhe beijei, mas ele já não podia sentir.
O Natal está chegando e eu estou lembrando do
meu Papai Noel e nunca senti tanta saudade em
minha vida. “Que vontade de querer dizer:” Pai
me perdoa por nunca ter-lhe dito que o amava. Me
perdoa por todas as vezes em que briguei com
você"
Hoje eu sei que um dia vou encontrá-lo de novo e
aí quem sabe vou poder me redimir e conseguir o
seu perdão. Vou poder abraçá-lo e dizer: "Que
bom estar junto de você outra vez".
Não quero repetir o mesmo erro outra vez, desta
vez com minha mulher e meus filhos e minha mãe.
Por isso deixo-lhes esta mensagem de Natal
antecipada: Eu amo cada um de vocês! E gostaria
de neste Natal ter um lugar a mais na mesa.
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