Silva, quando
jovem, até que era um sujeito apessoado. Vestia-se bem e
estava sempre disposto ao trabalho.
Silva era vendedor de uma loja de roupas masculinas e tinha
orgulho de trabalhar lá. Quando algum cliente descontente com
alguma coisa queria reclamar de algo e pedia para falar com o
Sr. José Silva, lá ia ele enfrentar a parada. Afinal de contas
ele não era um Zé qualquer, era um José Silva e ele nem levava
em consideração que era apenas um xará do fundador da loja. Um
belo dia a loja fechou suas portas definitivamente e Silva foi
o que mais sentiu. Ele não perdeu só o emprego, ele perdeu a
pose também. Sentia-se um derrotado, pois só sabia fazer
aquilo. Ninguém lhe dava emprego tal era a sua cara de
desânimo e ele se perguntava quem daria emprego a um falido.
O desânimo tomou conta dele e as pessoas mais próximas
começaram a se afastar dele. Sentindo-se cada vez mais
sozinho, Silva começou a descuidar de sua própria aparência.
Deixou de se barbear todos os dias como era seu costume, as
roupas já não lhe caiam tão bem como antes e aonde quer que
ele fosse, a primeira coisa que fazia era procurar um lugar
para se sentar. E lá ele ficava pensando lá sabe Deus o quê.
Os poucos amigos que lhe restavam procuravam animá-lo, mas
Silva dizia estar cansado. Recusava passeios, visitas e foi-se
isolando cada vez mais do círculo social. Começou a definhar,
perdeu a postura e pareceu que seus ombros caíram. Andava meio
curvado já, num desânimo! Era tão grande seu desânimo que
chegava a ser contagiante.
A família insistia para que ele procurasse outro emprego, mas
sabe como é, vendedor de loja quase nunca tem curso superior e
Silva era um deles. Insistiram para trabalhar como alfaiate,
mas tudo o que ele sabia fazer era pregar alfinetes. Um dia
ele soube que os Correios estavam realizando um concurso para
admitir novos carteiros e ele, por imposição da família, foi
prestar concurso.
Sentiu que tinha ido bem no teste e seu ânimo melhorou um
pouco. Quando o resultado saiu, ele estava entre os aprovados.
Fez exames médicos e novamente foi aprovado. Admitido na
empresa foi encaminhado para o setor de treinamento. Ele quase
não conhecia nenhuma rua da cidade, mas isso não seria um
problema tão grave. O maior problema eram seus ombros caídos o
que fazia com que a sacola de correspondência caísse no chão a
toda hora.
Foi dispensado ainda no período de experiência. Todos os
parabéns que recebera quando aprovado transformaram-se em
críticas e Silva foi-se encolhendo cada vez mais.
Além de fazer a barba apenas uma vez por semana, resolveu que
banho também deveria ser apenas uma vez por semana. Passou a
ficar dentro de casa e não saia à rua por nada nesse mundo.
Quando acontecia algum acidente, ou uma briga qualquer, ele
pedia para alguém lhe contar o que tinha acontecido.
Pobre Silva. Perdeu todo seu objetivo de vida. Na verdade ele
nunca tivera um, a não ser tornar-se um vendedor das Casas
José Silva.
Chegou a um ponto em que além de não sair mais de casa, ele
passou a não sair mais do quarto, a não ser para ir ao
banheiro. Mas isso durou pouco, pois em pouco tempo ele deixou
de sair do quarto para ir ao banheiro. A preguiça dele era
tanta que ninguém mais ligava. A comida era levada ao quarto e
uma faxineira fazia a limpeza. Como o fedor era tão grande,
passaram ele para o quarto de empregada, nos fundos da casa, e
ele nem percebeu a mudança. No quarto dos fundos ele foi
ficando cada vez mais esquecido, tão esquecido que às vezes
esqueciam de lhe levar a comida e o pior de tudo é que ele nem
reclamava.
Coitado do Silva! Ele já não fazia falta à sua família.
Outrora tão falante, tão garboso, ele agora era um trapo de
gente. Fedia e mesmo as pessoas mais queridas evitam contato
com ele.
O tempo foi passando e ele só comia quando alguém lembrava de
lhe levar um prato de comida e água para beber.
Teve um final de semana que uma sobrinha dele ia se casar no
interior do Estado e toda a família foi viajar, menos ele que
preferiu ficar em casa. O casamento era num sábado e logo pela
manhã todos viajaram e deixaram comida pronta na cozinha para
ele esquentar quando tivesse fome.
Na noite de domingo a família toda estava de volta, tomaram
banho e foram preparar algo para comer quando perceberam que a
comida que fora deixada para o Souza estava intacta. Correram,
então, para o quartinho dos fundos e constataram que Souza
estava deitado na cama, mortinho. Souza morrera de fome, por
preguiça de comer, pela preguiça de viver.
26/09/2007
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