Zé ficou triste com a morte da mãe, uma velha
senhora, matriarca, que criara todos os seus filhos sob suas
asas. Nunca houve nada que mãe do Zé deixasse de fazer pelos
filhos. A última palavra era sempre a dela para resolver
qualquer pendência ou pequenos desacertos familiares.
Todos acatavam sua decisão embora genros e noras não
gostassem muito daquela interferência.
Mas agora, lá estava ela, mortinha devido a um ataque
fulminante do coração que não lhe deu tempo de escolher como
gostaria de ser sepultada.
Zé e os irmãos e irmãs, discutiam o que deveriam fazer, mas
não chegavam a um acordo. Não possuíam um jazigo e isso já
era motivo de discussão na família, com cada um empurrando
acusações para o outro.
Tudo deveria seguir seu curso normal com o sepultamento da
mãe de Zé. Mas aí alguém falou: “por que não cremar o
corpo?” E a discussão saiu dessa pergunta: “É, por que não?”
Uma das noras chegou até a comentar que a cremação sairia
mais barato do que manter um túmulo com flores, velas,
limpeza, além do que se veriam obrigados a sempre fazer uma
visita no dia de Finados. Após essa argumentação quase toda
a família já estava a favor da cremação. Menos o Zé. Zé era
o mais velho dos irmãos e fora criado para ser o sucessor da
mãe nas decisões importantes da vida, mas agora era uma
decisão sobre morte e Zé não sabia bem o que fazer, nem o
que queria.
Uma cunhada arriscou: “você poderia jogar as cinzas no mar”.
Sua mãe iria adorar.
- Mamãe odiava o mar! – respondeu o Zé.
- Jogue as cinzas nos jardins, entre as flores, então.
- E deixar que o vento espalhe mamãe por aí? Não! Vamos
sepultá-la.
Essa discussão toda se dava enquanto alguém arrumava o corpo
da mãe dentro do caixão e uma vez arrumado, Zé parecia ver a
mãe se mexendo como se quisesse dar a palavra final. Zé
olhou para o caixão e decidiu: “Está bem! Vamos cremar
mamãe!”
Foi um alívio geral e quando chegou o momento da cerimônia e
aquela música suave ia tocando e o caixão descendo, ouviu-se
uma voz perguntar quem iria retirar a urna com as cinzas da
matrona e outra voz respondeu que seria o Zé, é claro, pois
havia sido dele a palavra final.
De fato sobrou para o Zé, ninguém queria a tal caixinha com
os restos mortais de sua mãe. Zé não sabia o que fazer com
aquilo. Ficou sabendo que naquela caixinha, não havia
somente as cinzas de sua mãe, pois o caixão fora queimado
junto, as roupas da mãe também, incluindo os sapatos e
aquele colarzinho que ela tanto gostava de bolinhas de
madeira. Chegou à conclusão que deveria ter mais cinzas de
objetos do que do corpo da mãe. E não tinha jeito de separar
uma cinza da outra. Então, Zé sacudiu bem a urna, para que
as cinzas se misturassem de vez. Foi para seu carro, a
mulher carrancuda do lado odiando viajar com as cinzas da
ex-sogra. Zé apoiou a caixinha na capota do carro do lado,
para abrir sua porta, entrou no carro, deu a partida e saiu,
não antes sem dizer: “Adeus mamãe!”
20/05/2008
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