A Família
Prisioneiros do Amor
Amado Bhagwam
A família tem sido a unidade social básica durante milhares de anos, mesmo assim você
questiona sua validade no seu novo mundo. O que você sugere para substituí-la?
O homem transcendeu a família. A utilidade da família terminou, ela viveu por tempo longo demais. Trata-se de uma das instituições mais antigas, por isso apenas pessoas muito perceptivas percebem que já está morta. Levará tempo para que os outros reconheçam o fato de que a família está morta.
Ela cumpriu a sua função. Já não é relevante no contexto atual; já não é relevante para a nova humanidade que está justamente nascendo.
A família teve aspectos bons e aspectos ruins. Foi um auxilio - através dela o homem sobreviveu - e foi muito prejudicial porque corrompeu a mente do homem. Mas não havia outra alternativa no passado, não havia possibilidade de escolher qualquer outra coisa. Era um mal necessário. Isso não precisa ser assim no futuro. O futuro pode ter estilos alternativos.
Minha idéia é que no futuro não haverá um único padrão fixo, mas haverá muitos, muitos estilos alternativos. Se algumas pessoas escolherem ter uma família, deveriam ter liberdade para tal. Será apenas uma pequena percentagem. Existem famílias sobre a terra extremamente raras, não mais do que um por cento - que são realmente lindas, que são realmente benéficas, nas quais há um crescimento; nas quais não há autoridade, não há viagens de poder, não há possessividade; nas quais as crianças não são destruídas, onde a mulher não está tentando destruir o marido e o marido não está tentando destruir a mulher; onde existe amor e liberdade; onde as pessoas se juntaram por pura alegria não por outros motivos; onde não existe política. Sim, esse tipo de família existiu sobre a terra; ainda existe. Para essas pessoas não há necessidade de mudança. Podem continuar vivendo em famílias no futuro.
Mas para a grande maioria, a família é uma coisa horrível. Você pode perguntar aos psicanalistas, eles dirão: "Todos os tipos de psicoses, neuroses, surgem na família. A família cria um ser humano muito, muito doente.
Não há necessidade; estilos alternativos deveriam ser possíveis. Para mim uma solução alternativa é a comuna - e é a melhor.
Uma comuna significa pessoas vivendo em uma família fluida. As crianças pertencem à comuna, pertencem a todos. Não há propriedade pessoal, ego pessoal. Um homem vive com uma mulher porque ambos querem viver juntos, porque têm carinho e prazer nisso. No momento em que sentem que o amor não está mais acontecendo, eles não continuam presos um ao outro. Eles se despedem com toda gratidão, com toda amizade. Começam a se relacionar com outras pessoas. No passado o único problema era o que fazer com as crianças. Na comuna será muito melhor, pois as crianças podem a ela pertencer. Elas terão mais oportunidades para crescer com diferentes tipos de pessoas. Caso contrário, uma criança cresce apenas com a mãe. Durante anos, o pai e a mãe são as únicas imagens de seres humanos que a criança tem. Naturalmente ela começa a imitá-los. As crianças acabam sendo imitadoras dos pais, perpetuando o mesmo tipo de enfermidade no mundo, como os próprios pais fizeram. Tornam-se cópias carbono. Isso é muito destrutivo. E não há qualquer possibilidade de que as crianças façam algo que não seja imitação, elas não possuem qualquer outra fonte de informações.
Se uma centena de pessoas vive junta em uma comuna, haverá muitos membros masculinos, muitos membros femininos; a criança não precisa ficar fixada, obcecada por um único padrão de vida. Ela pode aprender com seu pai, pode aprender com seus tios, pode aprender com todos os homens da comunidade. Ela terá uma alma mais vasta.
As famílias esmagam as pessoas e lhes dão almas muito limitadas. Na comunidade a criança terá uma alma mais vasta, terá mais possibilidades, será muito mais enriquecida em seu ser. Ela verá muitas mulheres; não terá apenas uma concepção de mulher. É muito destrutivo ter apenas uma única concepção de mulher - porque durante toda a sua vida você estará procurando e procurando por sua mãe. Sempre que se apaixonar por uma mulher, observe! Existe toda a possibilidade de que você tenha encontrado alguém que seja parecido com sua mãe, e talvez esta seja justamente a coisa que deveria ter evitado.
Toda criança tem raiva de sua mãe. A mãe tem que proibir muitas coisas, a mãe tem que dizer "não", é inevitável. Mesmo uma boa mãe às vezes tem que dizer "não", tem que restringir e negar. A criança sente raiva, rancor. Odeia a mãe e também a ama, porque ela é a sua sobrevivência, sua fonte de vida e energia. Assim a criança odeia a mãe e ama a mãe, simultaneamente. E isso se toma um padrão de comportamento. Você vai amar a mulher e vai odiar a mesma mulher. E você não tem qualquer outra escolha. Você sempre continuará procurando, inconscientemente, por sua mãe. E isso também acontece com as mulheres, elas estão procurando o próprio pai. A vida inteira delas é uma procura para encontrar papal como marido.
Ora, o seu papai não é a única pessoa do mundo, o mundo é muito mais rico. E na verdade, se você puder encontrar o pai, você não será feliz. Você pode ser feliz com um amado, com um amante, mas não com seu paizinho. Se você puder encontrar sua mãe, não será feliz com ela. Você já a conhece, não há mais nada a explorar. Tudo já lhe é familiar, e a familiaridade provoca o desdém. Você deveria procurar por algo novo, mas você não tem qualquer outra imagem.
Numa comuna a criança terá uma alma mais rica. Ela conhecerá muitas mulheres, conhecerá muitos homens; ela não estará viciada em uma ou duas pessoas.
A família cria uma obsessão em você e a obsessão é contra a humanidade. Se seu pai estiver brigando com alguém e você percebe que ele está errado, isso não importa - você precisa estar com seu pai, do seu lado. Exatamente como as pessoas dizem: "Certo ou errado, meu país é meu país!", assim elas dizem: "Meu pai é meu pai, esteja certo ou erradoMinha mãe é minha mãe, tenho que estar do seu lado." Do contrário será uma traição.
Isso o ensina a ser injusto. Você pode ver que sua mãe está errada e ela está brigando com a vizinha, e a vizinha está com a razão - mas você tem que estar do lado de sua mãe. Esse é o aprendizado de uma vida injusta.
Em uma comuna você não estará demasiadamente apegado a uma família - não haverá família à qual estar apegado. Você será mais livre, menos obcecado. Você será mais justo. E você obterá amor de muitas fontes. Sentirá que a vida é amorosa. A família lhe ensina a estar em um tipo de conflito com a sociedade, com as outras famílias. A família exige monopólio. Ela lhe pede que seja a favor dela e contra todos. Você precisa estar a serviço da família. Deve lutar pelo nome e pelo prestígio da família. A família lhe ensina ambição, conflito, agressão. Em uma comuna você será menos agressivo, estará mais à vontade com o mundo porque conheceu tantas pessoas diferentes.
E isto que vou criar aqui - uma comuna onde todos serão amigos. Até mesmo marido e mulher deveriam ser apenas amigos. Seu casamento deveria ser simplesmente um acordo entre ambos - que decidiram ficar juntos porque são felizes juntos. No momento em que um deles perceba que a infelicidade está se instalando, eles se separam. Não há qualquer necessidade de divórcio. Por não existir casamento, não existe divórcio. Cada um vive espontaneamente.
Quando você vive infeliz, pouco a pouco você se habitua com a infelicidade. Nunca, nem mesmo por um único momento, deveríamos tolerar qualquer infelicidade. Pode ter sido muito bom, gostoso viver com um determinado homem no passado, mas se já não há mais alegria, você deve cair fora desse relacionamento. E não há necessidade de ficar com raiva e ser destrutivo, não há necessidade de carregar qualquer ressentimento - porque nada pode ser feito com o amor. O amor é como uma brisa. Perceba; ele simplesmente vem. Se existe, existe. Depois vai embora. E quando se foi, foi. O amor é um mistério, você não pode manipulá-lo. O amor não deveria ser manipulado, o amor não deveria ser legalizado, o amor não deveria ser forçado - por nenhuma razão, jamais.
Em uma comuna as pessoas estarão vivendo juntas pelo puro prazer de estarem juntas, e essa será a única razão. E quando esse prazer tiver desaparecido, elas se separam. Talvez se sintam tristes, mas devem se separar. Talvez a nostalgia do passado ainda perdure na mente, mas elas devem se separar. Elas devem isso umas às outras, jamais deveriam viver infelizes, do contrário a infelicidade se toma um hábito. Elas se separam com os corações pesados, mas sem qualquer ressentimento. Elas procurarão por outros parceiros.
No futuro não haverá casamento, como ocorria no passado, não haverá divórcio, como ocorria no passado. A vida será mais fluida, mais confiante. Haverá mais confiança nos mistérios da vida do que na clareza da lei, mais confiança na própria vida do que em qualquer outra coisa no tribunal, na polícia, no padre, na igreja. E as crianças deveriam pertencer a todos - não deveriam carregar os emblemas de sua família. Elas pertencerão à comuna; a comuna cuidará delas.
Este será o passo mais revolucionário da história do homem - as pessoas começando a viver em comunas, começando a ser verdadeiras, honestas, confiantes, e abandonando mais e mais a lei.
Em uma família, o amor desaparece mais cedo ou mais tarde. Em primeiro lugar, talvez não tenha existido amor desde o princípio. Pode ter sido um casamento arranjado - por outros motivos, por dinheiro, poder, prestígio. Pode não ter existido amor algum desde o princípio. Os filhos nascem de um casamento que mais parece um beco sem saída - os filhos não nascem do amor. Desde o princípio se tomam desertos. E esse estado de não-amor no lar os torna apáticos, desamorosos. Eles aprendem sua primeira lição de vida com os pais, e os pais são desamorosos e há constantemente ciúme, briga, raiva entre eles. E os filhos vêem continuamente as caras feias dos seus pais.
A própria esperança deles é destruída. Eles não podem mais acreditar que o amor possa acontecer em suas vidas pois não aconteceu na vida dos seus pais. E eles também vêem outros país, outras famílias. As crianças são muito perceptivas; estão continuamente olhando para tudo que as cerca, observando. Quando percebem que não há qualquer possibilidade de amor, começam a sentir que o amor existe somente em poesias, existe somente para os poetas, para os visionários - não tem realidade na vida. E uma vez que você tenha assimilado a idéia de que o amor é mera poesia, então o amor nunca acontecerá porque você se fechou para ele.
Ver o amor acontecendo é a única maneira de permitir que ele venha a acontecer mais tarde em sua própria vida. Se você vê seu pai e sua mãe amando-se profundamente, amando-se intensamente, cuidando um do outro, com compaixão um pelo outro, com respeito um pelo outro então você viu o amor acontecendo. A esperança nasce. Uma semente cai em seu coração e começa a crescer. Você sabe que isso também vai acontecer a você.
Se você não o viu, como pode acreditar que vai acontecer a você? Se não aconteceu a seus pais, como pode acontecer a você? Na verdade, você fará tudo para prevenir que o amor aconteça a você - do contrário parecerá uma traição para com seus pais. Eis o que observei nas pessoas; as mulheres continuam a dizer nas profundezas do seu inconsciente: "Olhe mamãe, estou sofrendo tanto quanto você sofreu". Mais tarde os meninos continuam a dizer a si mesmos: "Papai, não se preocupe, minha vida é tão infeliz quanto a sua. Não fui além de você, não o traí. Permaneço a mesma pessoa infeliz que você foi. Eu carrego as correntes, o peso das tradições, sou o seu representante, meu pai, eu não o traí. Olhe, estou fazendo as mesmas coisas que você costumava fazer com minha mãe - estou fazendo essas coisas com a mãe de meus filhos. E aquilo que você costumava fazer comigo, estou fazendo com meus filhos. Eu os estou educando da mesma maneira que você me educou."
Cada geração vai transmitindo as próprias neuroses para as novas pessoas que vão chegando à Terra. E a sociedade continua com todas suas loucuras, suas misérias.
Não, algo diferente se faz necessário agora. O homem chegou à maturidade e a família é coisa do passado; ela realmente não tem futuro. A comuna será a alternativa que pode substituir a família, e será muito mais benéfica.
Mas em uma comuna, somente pessoas meditativas podem estar juntas. Somente quando você sabe como celebrar a vida, é que pode estar com o outro; somente quando conhece esse espaço que chamo de meditação é que você pode estar com o outro, pode ser amoroso. A velha tolice de monopolizar o amor deve ser abandonada, somente então você pode viver em uma comuna. Se continuar a carregar suas velhas idéias de monopólio - que sua mulher não deveria segurar a mão de outra pessoa e seu marido não deveria rir com qualquer outra pessoa - se você conservar essas idéias absurdas em sua mente, então você não pode se tomar parte de uma comuna.
Se seu marido estiver rindo com outra pessoa, isso é bom. Seu marido está rindo - o riso é sempre bom, não importa com quem ele esteja rindo. O riso é bom, o riso tem um valor próprio. Se sua mulher estiver segurando a mão de outro... ótimo. O calor está fluindo - o fluxo de calor é bom, tem um valor próprio. Com quem isso está acontecendo é irrelevante. E se estiver acontecendo à sua mulher com muitas pessoas, vai acontecer com você também. Se deixar de acontecer com outras pessoas, então vai deixar de acontecer com você também. Toda a velha concepção é tão estúpida!
É como se, no momento em que seu marido saísse, você lhe dissesse: "Não respire em qualquer outro lugar. Quando voltar para casa pode respirar tanto quanto quiser, mas você só pode respirar quando estiver comigo. Lá fora, prenda sua respiração, tome-se um iogi. Não quero que você respire em qualquer outro lugar". Ora, isso parece estúpido. Mas então porque o amor não deveria ser como a respiração? Amor é respiração.
A respiração é a vida do corpo e o amor é a vida da alma. O amor é muito mais importante do que a respiração. Ora, quando seu marido sai, você deixa bem claro que ele não deveria rir com qualquer outra pessoa, pelo menos com nenhuma outra mulher. Ele não deveria ser amoroso com mais ninguém. Assim, por vinte e três horas ele é desamoroso, e por uma hora, quando está na cama com você, ele finge estar amando. Você matou o seu amor. Ele já não está fluindo. Se por vinte e três horas ele tem que permanecer como um iogi, segurando o seu amor, com medo, você acha que ele pode repentinamente relaxar por uma hora? É impossível. Você destrói o homem, você destrói a mulher, e então você acaba ficando farto, entediado. E você começa a sentir: "Ele não me ama!" E foi você que criou toda a situação. E então ele começa a sentir que você não o ama, você já não é tão feliz como costumava ser antes.
Quando duas pessoas se encontram em uma praia, quando se encontram em um jardim, quando têm um encontro, nada está definido e tudo é fluido; ambos estão muito felizes. Por quê? Porque são livres. Um pássaro solto, voando, é uma coisa, e o mesmo pássaro em uma gaiola, é outra coisa. Eles estão felizes porque eles são livres.
O homem não pode ser feliz sem liberdade, e sua velha estrutura familiar destruiu a liberdade. E por ter destruído a liberdade, ela destruiu a felicidade, o amor. A família foi uma certa medida de sobrevivência. Sim, de alguma forma ela protegeu o corpo, mas destruiu a alma. Agora ela já não é necessária. Temos também que proteger a alma. Esta é muito mais essencial e muito mais importante.
Não há futuro para a família, não na forma que a temos entendido até agora. Há um futuro para o amor e as relações amorosas. "Marido" e "esposa" vão se tornar palavras feias e sujas.
E sempre que você monopoliza a mulher ou o homem, naturalmente você monopoliza também os filhos. Concordo totalmente com Thomas Gordon. Ele diz: "Penso que todos os pais são, potencialmente, corruptores de crianças, porque a maneira básica de criar os filhos é através do poder e da autoridade. Creio que é destrutivo quando muitos pais têm a idéia: 'Trata-se de minha criança, posso fazer o que bem entender com ela"'. Uma criança não é uma coisa, não é uma cadeira, não é um carro. Você não pode fazer com ela o que bem entender. Ela vem através de você, mas não pertence a você. Ela pertence a Deus, à existência. No máximo você zela por ela; não se tome possessivo.
Mas toda a concepção de família é de posse - possuir propriedade, possuir a mulher, possuir o homem, possuir os filhos - e possessividade é veneno. Portanto, sou contra a família. Mas não estou dizendo que aqueles que estão realmente felizes em suas famílias - fluindo, vivos, amorosos - devem destruí-la. Não, não há necessidade. A família deles já é uma comuna, uma pequena comuna.
E é claro, uma comuna maior será muito
melhor, terá mais possibilidades, mais pessoas. Pessoas diferentes trazem canções
diferentes, pessoas diferentes trazem estilos de vida diferentes, pessoas diferentes
trazem respirações diferentes, brisas diferentes, pessoas diferentes trazem raios de luz
diferentes - e as crianças deveriam ser banhadas com tantos estilos de vida diferentes
quanto seja possível, assim elas podem escolher, assim elas podem ter a liberdade de
escolher. E elas ficariam enriquecidas por conhecerem tantas mulheres diferentes, pois
assim não ficam obcecadas pela cara da mãe, ou pelo estilo da mãe. Então serão
capazes de amar muito mais mulheres, muito mais homens. A vida terá mais aventura.
Ouvi dizer...
Uma mãe, visitando um shopping center, levou o filho para a seção de brinquedos. O menino, descobrindo um gigantesco cavalo de balanço, montou nele e ficou balançando, para frente e para trás, por quase uma hora.
"Vamos filho", implorou a mãe, "tenho que ir para casa preparar o jantar do papai". O pequeno garoto recusou mover-se, e todos os esforços dela foram infrutíferos. O gerente da seção também tentou persuadir o pequeno, mas sem qualquer sucesso. Finalmente, em desespero, chamaram o psiquiatra do shopping.
Delicadamente ele se aproximou e sussurou algumas palavras no ouvido do menino, e este imediatamente desceu do cavalo e correu para o lado da mãe.
"Como você fez isso?" perguntou a mãe, incrédula. "O que lhe disse?" O psiquiatra hesitou por um momento e então falou: "Tudo que eu lhe disse foi: 'Se você não descer imediatamente deste cavalo, filho, vou quebrar sua cara! "'
Mais cedo ou mais tarde, as pessoas aprendem que o medo funciona, que a autoridade funciona, que o poder funciona. E as crianças são tão indefesas, são tão dependentes dos pais que você pode amedrontá-las. Essa passa a ser a sua técnica para explorá-las e oprimi-las, e elas não têm para onde ir.
Numa comuna elas têm muitos lugares onde podem ir. Elas terão muitos tios, muitas tias e muitas pessoas - elas não serão tão indefesas. Elas não estarão à sua mercê tanto quanto estão agora. Elas terão mais independência, estarão menos desamparadas. Você não poderá coagi-las tão facilmente.
E no lar elas vêem pura infelicidade. Algumas vezes, eu sei, algumas vezes o marido e a esposa estão amorosos, mas sempre que estão se amando, o fazem na privacidade. Os filhos nada sabem sobre isso. Os filhos vêem apenas as caras amarradas, o lado mais feio. Quando o pai e a mãe estão se amando, estão se amando atrás de portas fechadas. Eles ficam quietos, eles jamais permitem que os filhos vejam o que é o amor. Os filhos vêem apenas seus conflitos - quando estão censurando, brigando, ferindo um ao outro de formas grosseiras e sutis, insultando um ao outro, humilhando um ao outro. As crianças vêem continuamente o que está acontecendo.
Um homem está sentado em sua sala de
estar lendo o jornal, quando sua mulher entra e lhe dá um tapa na cara.
"Por que isso?" pergunta o marido indignado.
"Isso é por você ser um péssimo amante!"
Um pouco mais tarde o marido se aproxima
da esposa, que está assistindo televisão, e lhe dá uma sonora bofetada.
"Por que isso?!" pergunta ela gritando.
E ele responde: "Por saber a diferença".
Isso se repete continuamente, e os filhos sempre assistem tudo o que está acontecendo. Isso é vida? É para isso que estamos vivos? Isso é tudo que existe? Eles começam a perder as esperanças. Antes de entrarem na vida, eles já estão fracassados, já aceitaram o fracasso. Se seus pais, que são tão sábios e poderosos, não conseguem ter sucesso, que esperança há para eles? E impossível.
E eles aprenderam os truques - o truque de ser infeliz, o truque de ser agressivo. As crianças nunca vêem o amor acontecendo. Em uma comuna haverá mais possibilidades. O amor deveria ser um pouco mais aberto, menos escondido. As pessoas deveriam saber que o amor acontece. Crianças pequenas deveriam saber o que é o amor. Elas deveriam ver as pessoas cuidando umas das outras.
A idéia é que você pode brigar em público, mas você não pode ser amoroso em público. Brigar está O.K. Você pode assassinar, isso é permitido. Na verdade, quando duas pessoas estão brigando, uma multidão se aglomera para ver o que está acontecendo. E todos se divertem. É por isso que as pessoas ficam lendo e divertindo-se com estórias de assassinato, estórias de suspense, estórias de detetive. O assassinato é permitido, o amor não é permitido. Se você é amoroso em público isso é considerado obsceno. Ora, isso é absurdo. O amor é obsceno e o assassinato não é obsceno? Os amantes não podem ser amorosos em público e generais podem caminhar em público, exibindo todas as suas medalhas - esses são os assassinos e essas medalhas foram-lhes dadas por terem assassinado! Essas medalhas mostram o quanto eles assassinaram, quantas pessoas mataram. Isso não é obsceno.
Isso é que deveria ser obsceno. Ninguém deveria ter permissão para brigar em público. É obsceno; a violência é obscena. Como pode o amor ser obsceno? Mas o amor é considerado obsceno. Você deve escondê-lo na escuridão. Você deve fazer amor sem que ninguém saiba. Você tem que fazê-lo tão silenciosamente, tão furtivamente... naturalmente você acaba não podendo ter muito prazer. E as pessoas não conhecem o que é o amor. As crianças, particularmente, não têm como saber o que é o amor.
Em um mundo melhor, onde haja mais compreensão, o amor existirá por toda parte. As crianças verão o que é ter carinho. As crianças verão a imensa alegria que acontece quando você tem carinho por alguém. Você pode ver isso acontecendo aqui. Você pode ver o pequeno Siddhartha segurando a mão de uma menina com imenso carinho, com imenso amor. Se elas puderem ver, elas aprenderão. Se elas souberem que o amor acontece, suas portas se abrem.
O amor deveria ser mais aceito, a violência deveria ser mais rejeitada. O amor deveria estar mais disponível. Duas pessoas fazendo amor não deveriam se preocupar que alguém soubesse. Elas deveriam rir, deveriam cantar, deveriam gritar de alegria para que toda a vizinhança fique sabendo que alguém está sendo amoroso com alguém - que alguém está fazendo amor.
O amor deveria ser uma imensa dádiva. O amor deveria ser divino. Ele é sagrado.
Você pode publicar um livro sobre um homem sendo assassinado, tudo bem, isso não é pornografia. Para mim, isso é pornografia. Você não pode publicar um livro com um homem amorosamente envolvendo uma mulher em um profundo abraço. ambos nus - isso é pornografia. Este mundo tem existido, até agora, contra o amor. Sua família é contra o amor, sua sociedade é contra o amor, seu estado é contra o amor. É um milagre que ainda reste um pouco de amor, é inacreditável que o amor ainda continue existindo - não como deveria ser; ele é apenas uma pequena gota e não um oceano - mas é um milagre que ele tenha sobrevivido a tantos inimigos. Ele não foi completamente destruído isso é um milagre.
Na minha visão de comuna, pessoas amorosas estarão vivendo juntas, sem qualquer antagonismo entre elas, sem qualquer competição entre elas, com um amor que é fluido, disponível, sem qualquer ciúme ou possessividade. E as crianças pertencerão a todos porque elas pertencem à Deus - todos cuidarão delas. E as crianças são pessoas tão lindas, quem não irá tomar conta delas? E elas terão tantas possibilidades de ver tantas pessoas amando, e cada pessoa ama à sua maneira, cada mulher ama à sua maneira - deixe que as crianças vejam, brinquem, desfrutem. Enquanto os pais estiverem fazendo amor, deixe que estejam presentes, deixe que façam parte disso. Deixe que vejam o que acontece com a mãe quando ela faz amor - o quão extático fica seu rosto, que brilho surge em seu rosto, corno seus olhos se fecham quando ela penetra fundo em si mesma; como o pai se toma orgásmico, como ele grita de prazer. Deixe que as crianças saibam!
Deixe que as crianças conheçam muitas pessoas se amando. Elas se tomarão mais ricas. E eu lhes digo que se estas crianças chegarem a existir no mundo, nenhuma delas irá ler "Playboy". Não haverá necessidade. Fotografias de nudez desaparecerão. Elas simplesmente mostram o sexo faminto, o amor faminto.
O mundo se tomará praticamente não-sexual, ele será muito amoroso. Seus sacerdotes e seus policiais criaram todo tipo de obscenidade no mundo. Eles são a origem de tudo que é vil. E a família teve um grande papel nisso. A família tem que desaparecer. Ela tem que desaparecer em uma visão maior, a visão de uma comuna, de uma vida não baseada em pequenas identidades, uma vida mais livre.
Se as famílias desaparecerem, as igrejas automaticamente desaparecerão, porque as famílias pertencem às igrejas. Em uma comuna haverá todos os tipos de pessoas, todos os tipos de religiões, todos os tipos de filosofias, circulando, interagindo, e a criança terá a oportunidade de aprender. Um dia ela vai com um tio à igreja, um outro dia vai com outro tio ao templo; ela aprende sobre tudo o que existe, e assim pode fazer uma escolha. Ela pode escolher e decidir a qual religião gostaria de pertencer. Nada é imposto.
A vida pode tomar-se um paraíso, aqui e agora. Os obstáculos precisam ser removidos. E a família é um dos maiores obstáculos.
Sufis: O Povo do Caminho, Vol 2 - sessão 12
7 de setembro de 1977
Do original: "The New Child"
- Editora Boschini
Edição em português: "A Nova Criança" - Editora Gente.
Os direitos autorais são de propriedade de: Osho International Foundation
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