Extracto de uma entrevista publicada no Jornal Escolar "A Melga" em Novembro 2003

Qigong na Júlio Dinis. Qi quê ???

(Encontro de Reiki Santa Maria da Feira - 16/8/2003)

foto de José Varela


Desde o início do ano lectivo que alunos, professores, funcionários e encarregados de educação  têm a oportunidade de participar às terças feiras, das 17h00 às 18h30  em  sessões de iniciação ao Qigong (Chikung). Esta actividade encontra-se enquadrada no Clube “Adeus Stress... Bom Dia Escola!” orientado pelo professor João Carvalhas. O Qigong ainda é relativamente desconhecido entre os portugueses apesar de ser praticado diáriamente por mais de 100 milhões de pessoas e reconhecido pela Organização Mundial de Saúde como uma actividade de enorme  interesse para a humanidade.

Fomos conversar com o professor Carvalhas para nos elucidar sobre esta ainda tão misteriosa prática oriental.

Melga - Professor, afinal de contas o que é o Qigong? Uma ginástica? Uma terapia? Um arte marcial?

Prof  Carv-  Dependendo do ponto de vista com que se pratica, o Qigong poderá ser tudo isso. Mas acrescento ainda um aspecto muito importante; o Qigong é um pretexto! Um desafio. Talvez o maior de todos.  O desafio do autoconhecimento. O Qigong não desenvolve  músculos, nem cultiva a velocidade, e , muito menos, a competição com o outro. O Qigong cultiva a energia interior, a lentidão, a sensação. Desenvolve a consciência. É difícil falar-se do Qigong. Só praticando-o se começa a perceber o que ele é. No Qigong coordena-se continuamente o movimento lento (ou mesmo a ausência de movimento), com a respiração e a concentração em determinados pontos do nosso corpo relacionados com os da acupunctura.

Melga - Como se começou a interessar pelo Qigong e onde aprendeu?

Prof Carv - Tive a sorte de conhecer em 1974,  Mestre Tran-Hu-Haa, considerado um dos responsáveis pela introdução das Artes Marciais no nosso país à cerca de 40 anos atrás. Mestre Tran, de quem fui aluno durante 18 anos, nos estágios que frequentemente fazia na Associação Portuguesa de Artes Marciais em Espinho, por vezes ensinava aos alunos mais graduados exercícios de Qigong apesar de não lhes atribuir esse nome. Comecei a reunir esses exercícios e a praticá-los com amigos e alunos. Mais tarde, fui aluno da psicóloga brasileira, Eleonor de Freitas, com quem pratiquei Qigong durante 3 anos, e aprendi a maior parte dos sistemas que ainda uso hoje, como o  "Qigong Shibashi dos 18 movimentos"; os "Oito Brocados de Seda"; "Os Seis Sons Curativos"; entre outros. Frequentei também alguns estágios de Qigong com  professores de renome mundial.

Melga - Que benefícios poderá a prática do  Qigong trazer para alunos e professores?

Prof Carv- Hoje em dia, alunos e professores, embora por motivos diferentes, são dois grupos submetidos a altos níveis de stress. É um facto. Penso que todos estaremos de acordo com isto. Os alunos preocupados com testes e exames. Com as expectativas dos pais e da sociedade. Com a competição existente para a entrada nas faculdades e nos empregos. Ou mesmo, a falta de perspectivas futuras. Os jovens  já perceberam que a sociedade actual dá mais importância ao "Ter" do que ao "Ser", e, por esse motivo, descuidam o cultivo do interior privilegiando o exterior. Um  desequilíbrio que se paga caro, quer em termos de saúde física quer mental e emocional, se é que se pode dissociar estas três componentes do ser humano. Quanto aos professores, basta escutarmos as suas conversas diárias, para percebermos como o ensino é uma profissão extremamente  desgastante.

Se não podemos evitar as situações que nos causam stress, podemos, pelo menos, encarar essas situações numa outra perspectiva. O Qigong pode ajudar a isso. Mais. Reforça o nosso sistema imunológico e  tranquiliza a mente, proporcionando uma paz de espirito muito grande. O Qigong ajuda-nos a  ver a realidade com outros olhos. A separar o essencial do supérfulo...dá-nos discernimento. E é o discernimento que nos ajuda a não entrar em "pânico" por pequenos probleminhas que possam surgir durante todo o processo ensino/aprendizagem. Esses probleminhas vão desgastando a nossa energia vital, que os chineses chamam de Qi. E o nosso Qi é como o dinheiro:  -Difícil de  obter mas muito fácil de gastar!

Melga – Como surgiu e qual foi a receptividade do Qigong na escola Júlio Dinis?

Prof. Carv Surgiu no seguimento natural do projecto “Alfabetização Emocional” que em 1999, juntamente com os professores Celso Oliveira e Guilhermino Tertuliano, foi levado a cabo na  escola José Macedo Fragateiro. Foi uma proposta inovadora destinado a alunos do 8º ano considerados “difíceis” e “conflituosos”.  Mais tarde, essa prática expandiu-se para um pequeno grupo de professores da escola.  Na Júlio Dinis, o Qigong foi introduzido no ano passado, enquadrado no Clube do Movimento.

Em relação à receptividade aqui na escola a participação das pessoas tem sido razoável tendo em conta algumas condicionantes que sempre existem...

Melga - Como assim?

Prof. Carv -  Dificuldades em se conciliarem os horários entre os participantes e também a já conhecida "falta de tempo" de que todos nos queixamos.  Mas, muitas das vezes, existe é uma má gestão do tempo livre que dispomos. São opções! Todos conhecemos pessoas que nunca tinham tempo para nada, mas que tiveram de reformular a sua vida ( e a gestão do seu tempo) quando foram parar a uma cama do hospital...

Melga - Tem projectos para o futuro em relação à divulgação do  Qigong?

Prof. Carv – Fora da escola continuo a divulgar o Qigong e o Reiki (um sistema japonês de equilibrio energético através da imposição das mãos) quer em cursos intensivos, quer em encontros residenciais de fins de semana que se realizam periódicamente na Tocha, Santa Maria da Feira e no Porto. Gostaria de dinamizar um projecto que envolvesse os mais idosos de todas a freguesias do concelho, criando-se núcleos locais, aproveitando-se estruturas já existentes. A grande vantagem do Qigong é que pode ser praticado em qualquer local, não exigindo equipamentos dispendiosos. O Qigong é uma das actividades mais completas e adequadas para  os  idosos.

Melga - Que conselho final gostaria de deixar ficar aqui para quem pretende praticar Qigong?

Prof. Carv – Os mestres orientais costumam dizer: “Primeiro começar, depois continuar!” Só com perseverança é que se obtêm as coisas verdadeiramente importantes da vida. No Qigong é o mesmo. Não ficar apenas pela superficialidade. A simplicidade do Qigong esconde uma enorme profundidade que só se alcança com persistência!

Melga - Obrigado, Professor!                              (MELGA REPÓRTER)

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