O Homem e a besta

 

Quando a aurora aponta o Sol nascente

E aclara a luz o firmamento

A besta que dormiu serenamente

Sai à luz em busca do sustento

E a que caçou após o Sol poente

Busca num buraco alojamento

 

Uma espera áureo arrebol

Outra lhe traga a noite incauta presa

Sem nenhuma inventar mitos em prol

De inversão da Natureza

Ambas se orientam pelo Sol

Ao preservar a vida e a defesa

 

E todas as bestas e geral
Seguem este rumo da Natureza - mãe

A que devora outro irracional

E a que é devorada dele também

Porque este caminho natural

É a única lei que a besta tem

 

Nenhum dos animais irracionais

Fez da lei da morte a profissão

Para poder tirar dos seus iguais

O lucro que em vida não lhe dão

Isso coube e cabe aos racionais

Que a besta não tem essa razão

 

E jamais a besta urdiu quimeras

Padres, religiões, hipocrisias

Não inventou mitos noutras eras

Nem os que temos hoje em nossos dias

O brilho e o rumo das esferas

São tudo o que a besta tem por guias

 

Alheia ao dinheiro e ao Valor

A besta subordina o seu viver

À Natureza - mãe que é superior

Sem nunca se comprar nem se vender

Se o Homem lança a treva ao seu redor

A besta busca a luz até morrer  

O Valor, o fetiche, o mito, o nada

Eis do nosso "saber" o supra-sumo

Onde a treva densa disfarçada

Do dito saber, perdeu o rumo

Tem a besta a luz por que é guiada

Temos nós a bruma, a morte, o fumo

 

Perdidos no seio da Natureza

Por escusar as regras naturais

Enquanto tem a besta a luz acesa

Nós olhamos as trevas abissais

Com grandes bombas p'ra  defesa

E o que é a defesa? É matar mais!

 

Se a Mãe - Natureza nos dotou

De capacidade tão subida

Porque é que o Homem transformou

Em treva densa a luz da Vida

Porque o torvo Valor que não cegou

A rota da besta em sua lida

Cegou a espécie humana que o tomou

Por modelo seu e por medida

 

E então ergueu os pilares da Guerra

Criou milhares de mitos e criou

Todas as sombras que enchem a Terra

Propícias ao Valor que o condenou

Pois quem da luz se afasta os olhos cerra

E somente a besta os não cerrou.

 

Lisboa Janeiro de 2009

Leonel Santos