POR MARJORIE
BOWENS-WHEATLEY, MINISTRA, IGREJA UNITÁRIO
UNIVERSALISTA DE TAMPA, FLÓRIDA.
Ao ser admitida no hospital
alguns anos atrás, uma mulher foi perguntada sobre sua afiliação religiosa.
Quando ela respondeu “Unitário Universalista,” a atendente olhou para cima,
sorriu, e quieta digitou “nenhuma” no formulário.
Não é fácil ser um UU. Nós somos largamente
mal-entendidos em relação à cultura dominante, especialmente no mundo
contemporâneo de religião conservadora e fundamentalismo.
Você pode ter visto essas palavras num
adesivo de pára-choque: “Deus disse. Eu acredito. Isso resolve as coisas.”
Pensamentos unidimensionais como esse podem levar ao desejo de nunca mais discutir religião
novamente. Esse é precisamente o tipo de pensamento que levou ao nascimento da
religião liberal, à uma fé sem credo que não impõe uma
doutrina e não nos obriga a abraçar uma verdade única.
Eu estou entre aqueles que estão em uma recuperação perpétua da
intolerância – abuso na verdade – de uma experiência religiosa anterior.
Em um nível, alguém poderia dizer que os
princípios teológicos que minha família tentou transmitir para mim simplesmente
“não pegaram.” Minha mente racional simplesmente não pôde reconciliar conceitos
como pecado original, concepção imaculada, e a ressurreição. Então eu perdi a
fé completamente, professando ateísmo por quase uma década. Mas finalmente,
depois de uma crise em minha vida, eu tive que achar algo em que me segurar.
Então eu fiz um inventário de todas as religiões que eu havia explorado através
dos anos e escolhi um caminho. O caminho que conhecia melhor, aquele no qual eu
me sentia mais enraizada – apesar de ter sido machucada (magoada) por ele – era
o Cristianismo.
Depois de passar por um bem doloroso processo
de cura para “superar” minhas feridas deixadas pela religião de minha infância
e adolescência, eu descobri que o que eu acreditava e tentava seguir era a
mensagem de Jesus. Nem sempre foi uma
viagem suave. Eu lutei fortemente comigo e com companheiros UUs. Eu tinha que separar Cristianismo da mensagem de Jesus antes de poder
começar a entender que há tantas formas (ou talvez nuances) de Cristianismo
quanto há de Unitário Universalismo.
Quando me tornei uma
Unitário Universalista mais de vinte anos atrás, eu proclamava ateísmo e
estava deliciada de saber que havia uma comunidade espiritual para pessoas como
eu. Mas quando eu fiz o curso “Construindo Sua Própria Teologia” e outros
cursos de educação religiosa para adultos com meu ministro, o falecido David Eaton, eu comecei a perceber que havia desnecessariamente
caído em uma mentalidade de “tudo ou nada” – “jogado o bebê junto com a água do
banho.” Eu havia dispensado o Cristianismo como irrelevante por
quê eu o experienciara como dogmático e
opressivo. Realmente, a forma particular de Cristianismo com o qual eu cresci
era opressivo! Questionar era simplesmente não permitido em um ambiente onde o literalismo bíblico prevalecia. Mas em minha falta de
entendimento sobre
a diversidade do Cristianismo, eu havia me permitido a estereotipia, eu assumi
que se conhecesse um Cristão, conhecia todos.
Eu tinha que separar a história da Igreja
Cristã de seus princípios teológicos (muitos dos quais emergiram não durante a
vida de Jesus mas séculos mais tarde). Eu também tinha
que separar história e teologia das regras que governavam a igreja e a
disseminada corrupção que testemunhara na igreja onde cresci.
Hoje, Jesus permanece uma figura central de
minha identidade religiosa. Ainda assim eu frequentemente não me chamo Cristã
por que não há um acordo sobre o que o termo Cristão significa, dentro do UUismo ou fora. Mesmo dentro do
Catolicismo Romano e do Protestantismo, há muitas interpretações sobre o que
significa ser um Cristão.
Há entendimentos conservadores e liberais
sobre a história de Jesus e testemunho cristão, e nenhuma delas têm qualquer exclusividade
sobre Jesus ou aqueles que tentam segui-lo.
Em meu testemunho Cristão, nenhuma alma (ou
salvação espiritual) é dependente de um ritual, obrigação, ou afirmação de
crença em particular. Não há nenhum policial gigante no céu ditando quem vai
subir e quem vai descer. Ainda assim eu fui levada às lágrimas por expressões
litúrgicas da história de Jesus e seu trabalho como professor místico.
Então reconciliar as interpretações de meu
passado Cristão com o progressivo Unitário Universalismo não foi só um desafio
para mim; exigiu um sério comprometimento e mais de uma década para trabalhar
minhas questões e abraçar Jesus novamente.
Eu sou profundamente movida pela mensagem de
Jesus como eu a entendo: liberação e liberdade da opressão, amor e compaixão,
serviço ao próximo, e inclusão radical. Sua vida e ministério continuam a me
inspirar. Aqui estava um homem que desafiou as leis, costumes e expectativas
sociais de seu tempo. Ele afirmou o valor e dignidade inerente a cada pessoa,
mesmo a mais marginalizada em seus dias: mulheres, prostitutas, os doentes e
aqueles que eram desprezados por que não eram parte da
comunidade religiosa dominante. E ele afirmou a paz – não a paz passiva, mas
uma paz na qual trabalhássemos pro ativamente para trazer a justiça.
Seus valores eram tão ameaçadores aos poderes
de então que o executaram. O ponto focal da pregação e ministério de Jesus era
o que ele chamava “o Reino de Deus,” o que eu acredito ele queria dizer um
estado de ser no aqui e agora. Eu prefiro o termo cunhado pela feminista Cristã
Ada Maria Isasi-Diaz, uma teóloga Cubana. Ele sugere que consideremos a
referência de Jesus ao “reino” de Deus, como uma expressão e reconhecimento de
que estamos todos ligados, que somos parentes uns dos outros, chamados a criar
um novo mundo através da bondade amorosa, um mundo feito novo pelo jeito como
tratamos uns aos outros.
Esses valores universais foram também
levantados por pessoas como Mahatma Gandhi, Martin Luther King Jr., e Nelson
Mandela; e nós UUs os alegamos da mesma forma, como
expressos em nossos sete princípios. Então eu acho interessante quando as
pessoas perguntam: Como você pode ser um UU e uma Cristã ao mesmo tempo? Para
mim, não há contradição.
É mais correto dizer que eu sou uma Cristã
nominal que também encontrou verdade e sabedoria em religiões pré-Cristãs e místicas, espiritualidades centradas na Terra,
Humanismo religioso, mulherismo, e outras teologias de libertação. Em adição,
eu abracei a prática espiritual do Tai-Chi e a sabedoria da filosofia Budista.
Eu sou um UU por que eu não excluo qualquer teologia em particular. Como o
espiritual diz, há “espaço suficiente” na mesa do banquete.
A maioria dos UUs
são questionadores, quer sejam Cristãos, humanistas, Budistas, ou pagãos. Muitos
de nós escolhemos essa fé por que ela nos permite a liberdade de sermos nós
mesmos, de sermos autênticos. Ela provê liberdade do da hierarquia e credos
autoritários, e a possibilidade de verdadeiramente conservar nossas almas sem a
violação de nossas consciências.
Se eu tenho qualquer conselho para todos
aqueles lutando para descobrir suas próprias verdades, é encontrada na antiga
sabedoria de uma parábola Sufi: Se você quer ir além
de um entendimento superficial de qualquer tradição religiosa, você tem que
cavar um poço – um poço tão fundo quanto si mesmo. Você tem que ir às
profundezas daquela tradição se você quer encontrar a água viva que espera sua
sede. Colocado de um jeito diferente: Encontre um caminho religioso – qualquer
caminho – e vá tão profundamente quanto você pode para entender e abraça-la
completamente.
O caminho que escolhi é o caminho de Jesus,
um caminho que é abraçado por alguns Cristãos. O Unitário Universalismo deu-me
a liberdade de pegar de volta a mensagem de Jesus – não em uma maneira
opressiva mas em uma maneira que é libertadora,
amorosa, cuidadora e compassiva. E Unitário
Universalismo me dá a liberdade para ir além de um caminho, para continuar a explorar
e abraçar diferentes teologias, onde quer que a verdade seja encontrada.
No Evangelho de Lucas, Jesus entrou no
templo, abriu um pergaminho, e leu essas palavras do profeta Isaías:
O
Espírito do Eterno está sobre mim, pois ele me ordenou e me chamou a trazer
boas novas aos pobres. Ele me enviou para proclamar soltura para todos que
estão presos, para recuperar a visão para o cego, para liberar todos os
oprimidos, e para proclamar Jubileu, o ano da liberdade e restauração de Deus.
Essas palavras são,
talvez a melhor articulação registrada nos Evangelhos do foco central do
ministério de Jesus. Eu penso nisso como a afirmação de sua missão: trazer boas
novas para aqueles que mais precisam delas, liberar aqueles que estão presos, e
trazer liberdade e cura ao mundo.
Essa é minha missão também, e
o ministério para o qual sou chamada.