versiones, versiones y versiones...Director, editor y operador: Diego Martínez Lora
Ângela Marques(*)
"é quando me sinto" e mais 2 de
"Confissões dispersas"
XI
é quando me sinto
longe do mundo
abafada na música
do silêncio
rodeada do verde amarelo
deste granito nortenho
olhos pousados nas águas
quase quietas do rio
minha vida
é quando sou
sem ninguém
que sou
XL
tenho sempre uma lágrima
e uma orquídea
no fundo do coração
para te oferecer
numa manhã de sol
quando as aves todas parecem
encobrir o céu
e nem vejo o navio para lá da muralha
Porque me ensinaste
o caminho do ritual
da verdade minha
da nitidez
do gesto:
meu poema inefável
XLV
havia estrelas inconfundíveis
que encontrava nas esquinas da cidade
sorrisos quentes nas vitrinas
afagavam-me os cabelos
e eu corria por entre a gente
intocável
serena
de olhos como azuis, gaivotas
atravessando o horizonte
esticava os braços e
encontrava mármore ou granito
percorria os dedos
nos interstícios da água
e caminhava ao rés-da-areia
deixava velas acesas de caminho
que apontavam os barcos
e eu partia sempre
com um marinheiro-poeta
(*)Ângela Marques, escritora e crítica portuguesa. Mora no Porto.