versiones, versiones y versiones...renovar la aventura de compartir la vida con textos, imágenes y sonidosDirector, editor y operador: Diego Martínez Lora    Número 56 - Junho - Julho 2004


Entrevista a Márcia Gonçalves(*)

(A propósito da publicação pela Editorial 100 do seu livro Palavras ao vento)


1) Poesia para quê?

 A poesia é a forma mais simples e inevitável de não me descentrar de mim, é uma procura incessante da minha essência e da essência das coisas e dos outros.

 Poesia para quê?... para, além de palavras, poder oferecer música, imagens, silêncios…

 A poesia é o que quisermos fazer dela! É ritmo, imagem, metáfora. É frustração e encontro. É uma ideia, uma visão, uma sugestão. É uma lágrima, um sorriso… é toda ela encantamento e leveza.

2) Desde quando escreves?

 Comecei a escrever quando tinha 13 anos. Nessa altura os meus poemas reflectiam apenas sentimentos e estados de espírito sempre contraditórios, talvez devido à idade… desabafos de uma menina que começava a conhecer a vida. Felizmente, guardei alguns desses poemas que, mais tarde, me mostraram que a grandeza da poesia não termina na linha do horizonte.

3) Autores preferidos? Porquê?

 Sem dúvida, Fernando Pessoa… um poeta “perdido no labirinto de si mesmo”.

 Porquê? Talvez, devido à presença de uma apurada sensibilidade, de uma paixão louca pela procura de si mesmo, dos seus sentimentos. Pessoa consegue, através da sua poesia, levar o leitor a sentir a dor que ele próprio sente.

 São muitas as razões que me levam a escolher este poeta… o ritmo, as vivências, a musicalidade. Fascina-me a sua consciência metafísica num tempo em que essa era substituída pela técnica e pela ciência.

4) Amor sem poesia não é amor, poesia sem amor não é poesia para ti?

 A poesia e o amor formam a mais perfeita e bela união. Claro que a poesia não deixa de o ser na ausência do amor e o amor não perde o seu valor na ausência da poesia… são coisas distintas, mas que, na minha opinião, funcionam muito bem quando se visitam. O amor dá luz, cor e alma à poesia.

… um amor pode nascer de um poema. Um poema pode nascer de um amor.

5) Os sentimentos diluem-se e se misturam na tua poesia para se
intensificar, morte e amor, solidão e paixão. Que opinas?

A poesia é, sobretudo, sentimento. Cada um desses temas já é por si verdadeiramente intenso… mas a poesia vive da ligação de ideias, de sentidos, de vontades, e é essa ligação que simboliza a união da realidade com a utopia.

Os poetas gostam de misturar, de diluir… de se envolverem a si mesmos nas suas palavras, nas suas dúvidas, nas suas contradições.

 A poesia é assim… um processo de mistura, de diluição… das palavras, dos pensamentos, dos poetas, dos leitores, das almas, da dor, dos sorrisos, dos caminhos… só vagueando sem rumo, misturando sentimentos, poderei continuar a intensificar os meus versos.

 
6) A contradição, o desconhecido, o indescritível,  a dúvida: o único certo
é o amor?
 
Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;
 
É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder;
 
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.
 
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
 
                           Luís de Camões
 
Como poderia ser certo…?
A própria vida não é, nem nunca será certa… a surpresa e a mudança estão presentes em cada passo, o que não deixa de ser, extremamente, positivo.
 
7) A poesia para compensar o que não se tem, a água para acalmar o fogo ou o
fogo para incendiar a realidade e viver mais plenamente?
 
 A poesia nunca, de forma alguma, para compensar a falta de alguma coisa. A poesia é água e fogo, acalma e incendeia, simultaneamente.
 Para mim, nesta fase tão cheia de cores vivas, a poesia torna-se necessária para incendiar a minha vida, para manter a chama dos sorrisos sempre acesa, para me ajudar a acordar com eles todas as manhãs.

(*)Márcia Gonçalves, Vale de Cambra, 1986. Actualmente mora em Lisboa. Publicou Palavras ao vento, Editorial 100, 2004)


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