Adesivos inteligentes que
fizeram parte da (minha) história
Marcos Ribeiro, de algum ponto do ABCD Paulista
(Rádio Base, 6 de março de 2.003)
Era um adesivo muito engraçado. Era vertical, o fundo preto. No alto em fontes finas e longas a palavra FM em branco. Abaixo, em vermelho, 97. Em letras menores, na parte inferior do adesivo, 97,7 MHz.
Não fora difícil conseguir este adesivo. Afinal era só ovuir a rádio e esperar para o locutor dizer onde conseguir de graça o souvenir. Sempre eram distribuídos em alguma loja revendedora do jeans US TOP. No ABC havia dezenas delas espalhadas pelas principais ruas de comércio da região, uma vez que nem havia shoppings na terra do sindicalismo moderno.
Até quem não tinha carro ia atrás de um e colava na janela do quarto. Quando meu pai comprou um Fusca 73, tratei de transferir o adesivo da janela do meu quarto para o vidro traseiro do carro. Como ficou numa posição meio esquisita, colei-o na lateral. Aí o danado chamou a atenção e rendeu para mim boas e más gozações. "Meu, com tanto adesivo bonito de tanta rádio legal, por que você foi botar justo de uma rádio fundo de quintal de Santo André, que só toca música velha?". Não me importava com este tipo de comentário porque quem dizia isso não entendia nada de música, muito menos de rádio.
Quando surgiu, e até se transferir para São Paulo, a FM 97 era o orgulho da molecada que vivia e morava no ABC Paulista. Era o nosso meio de comunicação favorito. Havia, claro, a Grande ABC FM, mas só tocava música orquestrada. Era a queridinha da "velharada". Chegou até a ganhar aqueles famigerados prêmios da APCA. Três vezes. Havia a USP FM, a mais alternativa de todas. Eu não saía de sua sintonia, mas era rádio da capital. O simples fato de termos uma FM na nossa região nos enchia de um orgulho quase patriótico. Os shows que ela promovia, no Teatro Cacilda Becker, no Elis Regina, no Municipal de Santo André, no Antigo Adrenalina, no Aramaçã, yinha muito mais importância do que qualquer espetáculo em São Paulo.
É claro que a gente ficava com peninha dos roqueiros - pobres diabos - que moravam fora daqui. "Pô, eu moro na Vila Prudente e só consigo ouvir a 97 quando vou pra São Caetano. O sinal é horrível lá em casa". Azar o dele, quem mandou morar na capital? Pensávamos nós, ouvintes, vizinhos e cúmplices da emissora.
Somente 3 anos depois o já desbotado adesivo ganhou a companhia de um colega: um outro adesivo, agora triangular, com o logotipo 89FM em letras fortes, com uma guitarra estilizada ao fundo. Somente isso, mais nada. A emissora acabara de entrar no ar e estava fazendo a seguinte promoção: "Mande uma carta com um envelope selado para nós, que em dez dias mandaremos de volta o nosso adesivo com o logotipo das rádio. Era um bom negócio. Afinal era a rádio do Kid Vinil, da Rita Lee, do Marcelo Moraes, da Selma Boiron, dos elegantes textos de Antônio Bivar, da Sônia Abreu e de muita gente boa.
Os dois souvenires se foram com a venda do fusca, em novembro de 94. Pensei em tirá-los, antes que o novo dono o fizesse, mas achei melhor que eles se fossem porque nem a 97, nem a 89 já não eram mais as rádios que fizeram parte de minha história.