Argumentos Falaciosos:
O Dr. Carl Sagan, em seu
livro "O Mundo Assombrado pelos Demônios" (que
considero o melhor) fala do "kit" de detecção
de mentiras, que um bom cientista tem que ter sempre à
mão e usar. "O que tem no kit?" ele pergunta e
na mesma linha responde:
"Ferramentas para o pensamento
cético."
O pensamento cético se resume no meio de construir e
compreender um argumento racional e reconhecer um
argumento falacioso, isto é, uma mentira. O importante
não é o que se gostamos ou não da conclusão, mas se
ela realmente deriva da premissa apresentada e se essa
premissa é valida.
As falácias mais comuns são:
- Argumentos "ad
hominem" expressão
latina que significa "ao homem".
Acontece quando atacamos a pessoa que fala e não
o argumento. Exemplo: "Você não
vai acreditar na palavra de um negro, não
é?!" ou "Fernando Henrique é um
péssimo presidente. Também, o que você queria
de um sociólogo?!"
- Argumentos de Autoridade tipo de argumento que se baseia na
autoridade de quem fala e não na lógica.
Exemplo: "Quem me disse que beber água faz
mal foi o Sr.Luís, deputado federal, então só
pode ser verdade." ou "Se o pajé
mandou não dar remédios às crianças e esperar
os espíritos curarem elas, então é certo. O
pajé não erra."
- Argumento das
Conseqüências Adversas tipo de argumento que tenta validar uma
afirmação dizendo que seria impossível se ela
não existisse.Exemplo: "Se não
existisse um Deus tomando conta de tuso, isso
aqui viraria uma bagunça!" ou "Se não
matarmos esse bandido, os outros terão certeza
da impunidade e a criminalidade vai aumentar
muito!"
- Apelo à ignorância a afirmação de que qualquer coisa que
não se provou ser falsa, é verdadeira, e
vice-versa. Exemplo: "Ele não
provou que é homem, então ele é
homossexual." ou "Ninguém conseguiu
provar que não existe imortalidade, então, na
verdade, somos todos imortais."
- Alegação Especial Afirmação que recorre a conceitos que
seriam inatingíveis para as pessoas comuns
(freqüentemente usado para salvar um argumento
em profundas dificuldades teóricas). Exemplo:
"- Não consigo entender a reencarnação,
porque há muito mais gente viva hoje, do que há
10.000 anos. / - Isso é porque você não
entende a doutrina dos espíritos." ou
"Você não compreende a magia porque não
é um iluminado."
- Petição de Princípio (também chamada de Supor a Resposta) é quando se faz uma pergunta
direcionada para obter determinada resposta
específica. Exemplo: "Você não
acha que essa estória é falsa?" ou
"No meu lugar você não faria a mesma
coisa?"
- Seleção das
Observações (também
chamada de Enumeração
das Circunstâncias Favoráveis) Francis Bacon definiu essa falácia
como "Contar os acertos e esquecer os
fracassos." Exemplo: "O
brasileiro é bom de plano econômico, veja
quanto tempo o Real deu certo." (Esqueceu de
mencionar os casos em que não durou nem uma
semana, como cruzado, cruzado II, cruzeiro real
etc.)
- Estatística dos Números
Pequenos falácia
parecida com a anterior, mas só que usa números
estatísticos de forma errônea. Exemplo:
"Dizem que no planeta Terra, em cada cinco
habitantes, um é chinês. Que estupidez!
Conheço mais de cem pessoas e nenhuma delas é
chinesa!"
- Compreensão Errônea da
Natureza Estatística é quando se pega uma estatística e se
interpreta livremente, sem compromisso com a
realidade.
- Incoerência tomar certa atitude para certos casos, e
outra para outros.
- "Non
Sequitur"
expressão latina que significa "não se
segue". Dizer uma coisa que não tem nada a
ver com outra. Exemplo: "O América
vai ganhar esse jogo por que Deus é
grande!" ou "Nosso país é muito rico,
por isso temos inflação."
- "Post Hoc, Ergo
Propter Hoc" expressão latina que significa "se
aconteceu depois de um fato, foi causado por
ele". Exemplo: "Você notou que
o El Niño só
fez aquele estrago todo depois que o Fernando
Henrique se elegeu. Esse cara causa todos os
males." ou "Depois que você disse que
estava tudo errado, tudo começou a dar errado na
minha vida."
- Pergunta sem sentido pergunta que traz em si uma
incoerência. Exemplo: "O que
aconteceria se uma força
irresistível atuasse sobre
um corpo imóvel?" (Se uma força é
irresistível, nenhum corpo está imóvel) ou
"Você entende que Deus criou o demônio
para exercer mais controle sobre os
humanos?"
- Exclusão do Meio-Termo ou
Dicotomia Falsa
argumento que só considera os dois extremos
entre várias possibilidades.
Exemplo:"Se você não está do meu lado,
está contra mim!" ou "Ou você
acredita em Deus, Jesus Cristo, em todos os
santos, na infalibilidade do Papa ou você é um
ateu!"
- Curto Prazo versus
Longo Prazo
subconjunto da falácia anterior, mas muito
comum. Exemplo:"Não podemos
investir mais em educação porque o problema da
violência precisa de solução mais
imediata."
- Declive Escorregadio caso em que se aceitamos um meio termo,
ele necessariamente conduzirá a algum extremo. Exemplo:
"Se você deixar o aluno ir fazer xixi uma
vez, ele vai acabar querendo ir toda hora e aí
vai virar bagunça." ou "Na hora em que
começarem a permitir o uso de armas pequenas,
logo logo todos terão armas enormes."
- Confusão de Correlação
e Causa argumento
em que uma coincidência estatística é
entendida como causa. Exemplo: "Mais
de 50% dos homossexuais têm curso superior,
conclui-se que estudar transforma a pessoa em
homossexual."
- Espantalho argumento que ridiculariza uma
posição intelectual para facilitar o ataque. Exemplo:
"Não posso apoiar alguém que se diz filho
de macacos!" (para ridicularizar o
Darwinismo)
- Evidência Suprimida ou
Meia Verdade
apresentar uma evidência escondendo alguns
detalhes que a invalidariam. Exemplo:
"Este bairro está muito violento, só ontem
morreram duas pessoas." (ele só não disse
que as duas morreram de causas naturais).
- Palavras Equívocas utilizar eufemismos, ou seja, outras
palavras "enfeitadas" para designar
conceitos desagradáveis cujas verdadeiras
palavras tenham conotação negativa. Exemplo:
"A ONU mandou uma força
de paz para aquele
lugar" (sabemos o que é uma força
de paz, é um pequeno
exército armado até os dentes) ou quando o
comandante fala para o soldado: "Precisamos manter
a ordem, pode cuidar
dos sem-terra."
(1) "O Mundo Assombrado pelos
Demônios", página 207, parágrafo 4.
Editora Companhia
das Letras
|